DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

CONJUNTA – AMAZÔNIA / MEIO AMBIENTE
EVENTO: Audiência PúblicaN°: 0706/08DATA: 21/05/2008
INÍCIO: 11h05minTÉRMINO: 12h40minDURAÇÃO: 01h35min
TEMPO DE GRAVAÇÃO: 01h35minPÁGINAS: 27QUARTOS: 19
DEPOENTE/CONVIDADO – QUALIFICAÇÃO
ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República.
SUMÁRIO: Debate sobre a política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia.
OBSERVAÇÕES
Reunião de audiência pública conjunta das Comissões da Amazônia, Integração Nacional e Desenvolvimento Regional e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. Houve intervenções fora do microfone. Inaudíveis e Ininteligíveis.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Declaro aberta a presente reunião de audiência pública conjunta promovida pelas Comissões da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, em atendimento aos Requerimentos nºs 363, de 2008, de autoria da Deputada Vanessa Grazziotin, subscrito pelos Deputados Luciano Castro e Giovanni Queiroz; 371, de 2008, de autoria da Deputada Dalva Figueiredo, subscrito pelo Deputado Sergio Petecão; 372, de 2008, de autoria da Deputada Janete Capiberibe; e 182, de 2008, do Deputado Nilson Pinto, subscrito pelos Deputados André de Paula, Marcelo Almeida, Antonio Carlos Mendes Thame, Ricardo Tripoli, Givaldo Carimbão, Germano Bonow, Luiz Carreira, Moreira Mendes e Wandenkolk Gonçalves, para debatermos a política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia.

Cumprimento inicialmente todos os presentes e, em especial, o Sr. Ministro Roberto Mangabeira Unger, que se encontra presente, e o ex-Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Deputado Nilson Pinto, representando o Presidente Deputado André de Paula.

Passo a palavra, para breves considerações, ao Exmo. Deputado Nilson Pinto, representando a Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

O SR. DEPUTADO NILSON PINTO – Exmo. Sr. Ministro Mangabeira Unger, colegas Deputados, senhoras e senhores, gostaria muito brevemente de cumprimentar o nosso ilustre convidado para a audiência pública de hoje e desejar que esta seja uma audiência pública profícua.

Em nome da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, agradecemos ao Ministro a presença e os esclarecimentos que serão dados em relação ao Plano da Amazônia Sustentável. Sabemos que V.Exa. tem limitação de agenda e nós já acordamos no sentido de que esta audiência pública não ultrapasse o horário de 12h30min por conta de seus compromissos. De modo que vou fazer a pausa necessária para que V.Exa. possa fazer a sua exposição.

A Deputada Janete Capiberibe, que preside esta reunião, tem a palavra.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Muito obrigada, Deputado Nilson Pinto.

Quero dar boas-vindas à Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, à Câmara Federal ao Sr. Ministro Mangabeira Unger. Com certeza, a exposição do Ministro é aguardada ansiosamente pelos 9 Estados que compõem a Região Amazônica — quer dizer, 60% do País, a região geográfica — sobre a implantação do Plano Amazônia Sustentável.

Quero dizer, Sr. Ministro, que é com muita ansiedade que V.Exa. é aguardado. É urgente a compreensão inteira do PAS, vinculado também ao PAC da Amazônia, porque na Comissão da Amazônia é unanimidade e somos 40 Parlamentares na Comissão de Meio Ambiente: desmatamento zero na nossa região diante dos dados estatísticos alarmantes que estamos acompanhando e as mudanças climáticas que vêm ocorrendo no planeta.

Não vou me estender muito, pois, assim como o Presidente da Comissão de Meio Ambiente, hoje nós queremos ouvi-lo.

Antes de passar a palavra ao Sr. Ministro, registro a presença da Deputada Marinha Raupp, de Rondônia, e dos Deputados Giovanni Queiroz, José Genoíno, Mendes Thame, Neudo Campos, autor do requerimento, Gladson Cameli, Nilmar Ruiz e Zequinha Marinho.

Passo imediatamente a palavra ao Sr. Ministro por 20 minutos, o tempo que o senhor achar necessário, dada a importância que tem esta audiência pública para o nosso País, para a região amazônica.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado. Sras. Deputadas, Srs. Deputados, meus concidadãos, espero que esta possa ser a primeira de muitas vindas minhas a esta Comissão e que possamos, a partir de hoje, iniciar uma discussão constante sobre um dos maiores problemas e uma das maiores oportunidades de nosso País.

Eu divido esta apresentação informal em 3 partes. Na primeira, faço algumas considerações preliminares a respeito do espírito com que abordo esta tarefa e esta discussão; na segunda, esboço um arcabouço conceitual para explicar a orientação da qual estou partindo e, na terceira, descrevo sumariamente algumas das iniciativas que começo a discutir com os Governadores dos Estados da Amazônia e que gostaria também de discutir aqui no Congresso Nacional.

Primeiro, portanto, o espírito com que abordo esta tarefa e esta discussão.

A Amazônia é uma fronteira não apenas da geografia, mas também da imaginação. É hoje o espaço privilegiado em que o Brasil se pode repensar e se refazer. A Amazônia não é retaguarda; a Amazônia é vanguarda. É sobretudo na Amazônia que podemos começar a definir alternativas que depois ajudarão a apontar caminho para o País.

Estou mais do que consciente das minhas limitações no cumprimento da tarefa que o Presidente me atribuiu de coordenar o Plano Amazônia Sustentável. Preciso confiar, portanto, no patriotismo e na generosidade dos meus concidadãos.

Entendo esse trabalho como um trabalho de construção coletiva a ser desenvolvido por uma lógica de co-autoria dentro do Governo, dentro da Amazônia e dentro de toda a Nação. Não poderemos fazer esse trabalho se tivermos medo — medo de idéias, medo de discussão franca e aberta de alternativas. Precisamos, com o espírito desarmado, debater um conjunto de alternativas para, juntos, encontrarmos o caminho. A Nação anseia por uma reconciliação profunda e duradoura entre preservação da natureza e desenvolvimento da região.

Tenho dito que a Amazônia, além de ser a maior coleção de árvores do planeta, uma coleção que precisa ser resguardada com o compromisso de desmatamento zero, é também um grupo de pessoas. Se os mais de 25 milhões de brasileiros que moram na Amazônia não tiverem oportunidades econômicas serão impelidos para uma atividade econômica desordenada, o que levará ao desmatamento, e a questão ambiental acabará por ser o que foi a questão social para o Presidente Washington Luís: um caso de polícia. Um ambientalismo desprovido de projeto econômico seria, portanto, um ambientalismo contraproducente.

Ao mesmo tempo, temos a consciência de que a premissa para a solução dos nossos problemas e para o aproveitamento das nossas oportunidades na Amazônia é a reafirmação inequívoca e incondicional de nossa soberania. Quem cuida da Amazônia brasileira é o Brasil. Há, porém, um vínculo entre o problema da defesa e a construção do projeto econômico. Sem projeto econômico não há estruturas sociais e produtivas organizadas. Uma região vasta, sem estruturas produtivas e sociais organizadas, é difícil defender. Há, portanto, um vínculo íntimo entre o problema ambiental, o problema econômico e o problema da defesa.

O ponto de partida para qualquer projeto nacional — e a Amazônia é projeto nacional, não é projeto regional — que atenda a esses anseios é a rejeição de duas idéias erradas. Uma idéia errada é a de que a Amazônia deva e possa ser mantida como um santuário para o deleite e benefício da humanidade, sem atividade produtiva. Essa idéia levará ao seu oposto: em vez de preservá-la, a destruirá. A outra idéia errada é que, para ser desenvolvida, a Amazônia precisa ser entregue às formas predatórias da atividade econômica, e que nós precisamos, segundo essa idéia errada, aceitar o desmatamento como o preço do desenvolvimento. Nem uma coisa nem outra. Hoje, existem no Brasil pessoas que assumem a defesa dessas duas idéias extremadas. A grande maioria do País, porém, rejeita ambas.

O nosso problema não é divisão. Há um consenso emergente a respeito da primazia do desenvolvimento sustentável. O nosso problema é perplexidade. Nós nos propomos a fazer algo que o mundo todo ainda não fez: dar conteúdo prático à idéia do desenvolvimento sustentável.

Agora passo à segunda parte da minha apresentação, onde esboço um conjunto elementar de idéias para descrever a orientação que estou seguindo ao iniciar esta tarefa que me foi atribuída.

A premissa prática para a solução dos problemas do desenvolvimento sustentável na Amazônia é a solução dos problemas fundiários que proliferam em toda a Amazônia Legal.

Sem um grande avanço no esclarecimento da titularidade da terra e nas garantias de segurança jurídica, não poderemos fazer nada mais. Todas as nossas construções estarão em areias movediças. Ao conseguir um avanço rápido e decisivo na solução dos problemas fundiários, pudemos também construir um zoneamento ecológico e econômico abrangente que defina uma estratégia para a Amazônia sem floresta e outra estratégia para a Amazônia com floresta.

Ao falar de Amazônia sem floresta não falo apenas da parte do bioma amazônico que já foi desmatado. Falo também da parte da Amazônia Legal que nunca foi floresta, porque é cerrado ou savana tropical. Precisamos ter estratégias distintas para essas duas grandes partes da Amazônia e para as microrregiões em cada uma delas.

Na Amazônia com floresta, a base de tudo é a construção de um regime regulatório e tributário que faça a floresta em pé valer mais do que a floresta derrubada. Enquanto a floresta derrubada valer mais do que a floresta em pé, ela continuará a ser derrubada.

Assegurado esse pressuposto, há 4 grandes obras que dão conteúdo tangível à idéia do desenvolvimento sustentável na Amazônia florestada. A primeira tarefa é tecnológica: providenciar tecnologia apropriada ao manejo sustentável de uma floresta tropical. Quase toda a tecnologia florestal disponível no mundo evoluiu para manejar florestas temperadas, que são muito mais homogêneas, menos ricas do que as florestas tropicais.

A segunda tarefa é técnica, qual seja organizar em toda a Amazônia florestada os serviços ambientais avançados. Isto é mais fácil dizer do que fazer. Para organizar serviços ambientais avançados na Amazônia com floresta é preciso conseguir que quadros altamente qualificados se disponham a morar e a trabalhar fora das grandes cidades da Amazônia.

Em todo o mundo, as pessoas muito qualificadas querem morar nas grandes cidades, e uma das razões é que só nas grandes cidades é que se prestam serviços de alta qualidade. Ninguém no mundo descobriu, até agora, como prestar serviços de alta qualidade a uma população rarefeita, disposta sobre um vasto território. Este é apenas um dos muitos problemas práticos que teremos de resolver para efetivar o compromisso com o desenvolvimento sustentável na Amazônia com floresta.

A terceira tarefa é jurídica. Há tendência em todas as grandes florestas a mover-se em direção à gestão comunitária como uma das alternativas à concessão de florestas para grandes empresas. O regime de gestão comunitária das florestas não está, porém, ainda juridicamente articulado. Para isso teríamos de dar forma definida a ele para termos alternativas jurídicas, além da alternativa tecnológica e técnica na Amazônia.

A quarta tarefa, e talvez a mais importante, é a econômica. Há que se construir vínculos entre a floresta e a indústria, indústrias nas cidades ou nas periferias urbanas da Amazônia, que transformem produtos — e não madeireiros da floresta — e fabriquem tecnologia apropriada ao manejo de uma floresta tropical.

São 4 obras difíceis, todas elas indispensáveis ao esforço de transformar em realidade a idéia do desenvolvimento sustentável Amazônia com floresta.

Já na Amazônia sem floresta, a Amazônia que sempre foi savana tropical, o cerrado, ou que já foi desmatada, temos uma oportunidade de não repetir os erros de nossa formação histórica e de apontar outro caminho para o País; um modelo econômico que associe os governos aos produtores, sobretudo aos pequenos produtores, e que promova entre os produtores as práticas de concorrência cooperativa, concorrência e cooperação ao mesmo tempo, primeiro, na agricultura e na pecuária, mas, depois, também, na indústria e nos serviços.

Um dos maiores vilões do desmatamento na Amazônia é a pecuária extensiva. No Brasil todo há 1 hectare sob lavoura e 3 hectares entregues à pecuária extensiva. Organizar uma agricultura democratizada de alto valor agregado, combinada com uma pecuária intensiva, não é apenas tarefa para a Amazônia sem floresta, é tarefa para o País inteiro, mas é na Amazônia sem floresta que poderemos enfrentar e cumprir essa tarefa em primeiro lugar. Só podemos fazê-lo organizando o desenho institucional de uma agricultura moderna e democratizada, organizando a comercialização do produto — quando o mercado não o faz, o Estado de tem fazê-lo, como vanguarda de um mercado —, organizando o extensionismo agrícola, destroçado em muitas partes do País nas últimas décadas e que é a correia de transmissão indispensável entre os inventos da EMBRAPA e as atividades do produtor rural, e reorganizando os mercados agrícolas para que produtores fragmentados não estejam desfavorecidos diante de fornecedores e de compradores capitalizados. Tudo isso é para um caminho: superar o contraste nocivo entre a agricultura empresarial e a agricultura familiar. O desenho institucional da agricultura moderna é um só.

Ao resolver esses problemas da atividade agropecuária, teremos de enfrentar muitos outros, que também são problemas não da Amazônia, mas do Brasil. Por exemplo, nosso País é notoriamente vidrado em transporte rodoviário. Na Amazônia podemos e precisamos construir sistemas multimodais de transporte, integrando o rodoviário, o ferroviário e o hidroviário, que inaugurem no Brasil todo um novo paradigma de transporte. Este é o sentido vanguardista e nacional do projeto amazônico.

Passo para a terceira parte da minha apresentação inicial.

Meu princípio nisto e em tudo tem sido tratar do longo prazo a curto prazo. É preciso encontrar um conjunto de ações que se iniciem já e que sinalizem o caminho o qual pretendemos trilhar. Em geral, o que muda o mundo é a combinação de iniciativa com mensagem, iniciativas que abrem um caminho e antecipam um modelo, que servem como que a primeira prestação de outro futuro.

Nesse espírito, começo a discutir com os Governadores dos 9 Estados da Amazônia Legal iniciativas em 4 áreas iniciais. E agora trago essa discussão para o Congresso Nacional. Essa não é evidentemente uma lista fechada, mas exemplificativa.

O primeiro conjunto de iniciativas tem a ver com o problema fundiário, cuja resolução, por sua vez, possibilita um zoneamento ecológico e econômico eficaz. Enquanto houver insegurança jurídica na Amazônia, não conseguiremos avançar. Nossa primeira impressão — eu digo nossa porque é impressão minha, mas também dos meus interlocutores — é a de que, para avançar na solução dos problemas fundiários, precisaremos ter iniciativas convergentes de 2 ordens. A primeira ordem é fortalecer o aparato, os quadros das organizações federais e estaduais responsáveis pela regularização fundiária, a começar pelo INCRA. A segunda tem a ver com a revisão do arcabouço jurídico. Nenhum país continental que enfrentou problemas fundiários dessa dimensão, no curso da história moderna, conseguiu resolvê-los sem simplificar o seu Direito a respeito da propriedade.

A diretriz dessas mudanças pode ser descrita de 2 formas complementares. Uma é organizar uma trajetória acelerada da posse insegura para a propriedade segura. Há certos institutos no Direito Agrário vigente que já fazem isso, como a chamada legitimação de posse e a chamada regularização fundiária com dispensa de licitação. Mas provavelmente precisaremos de muito mais, até de uma simplificação substancial do Direito Civil a respeito de regularização fundiária. A outra é enriquecer as conseqüências jurídicas da própria posse, isto é, permitir a quem goza da posse que passe também a gozar de algumas das prerrogativas da propriedade plena.

E é nesse clima de solução progressiva do problema fundiário que poderemos dar conteúdo prático ao zoneamento ecológico e econômico. No Brasil, fala-se muito, e há muito tempo, em zoneamento ecológico e econômico, mas se faz muito menos. A explicação desse descompasso é que zoneamento ecológico e econômico não é exercício de cartografia, é expressão de uma visão econômica que, por sua vez, depende para sua efetivação de segurança jurídica. Faltaram a nós tanto a visão econômica quanto a segurança jurídica.

O segundo conjunto de iniciativas práticas que começo a discutir com os Governadores dos Estados da Amazônia Legal tem um foco específico. Diz respeito à situação das populações de pequenos agricultores agrícolas ou extrativistas que se encontram nas zonas de transição entre o Cerrado e a Floresta. Se essas pessoas não tiverem oportunidades e instrumentos econômicos serão levadas a desmatar para transformar madeira em carvão e a conduzir muitas vezes uma pecuária extensiva desordenada e perigosa para a floresta. A tarefa, portanto, é assegurar alternativas a essas populações, alternativas que sejam, ao mesmo tempo, ambientalmente seguras e economicamente viáveis.

Essa tarefa tem 3 componentes. O primeiro componente é definir o elenco de atividades produtivas, de acordo com a natureza de cada microrregião: lavouras perenes, cultivo de peixes, produção para o biodiesel e plantio ou replantio de árvores. Essas atividades teriam de ser apoiadas tecnológica e financeiramente por uma estrutura de extensionismo organizada pelo Governo Federal em colaboração com os Governos Estaduais.

O segundo componente dessa tarefa é alguma forma de remuneração específica que vincule essas populações aos programas de segurança ambiental e de construção econômica. Uma pequena compensação mensal, por exemplo, por sua participação em práticas de prestação de contas e de vigilância comunitária.

O terceiro componente é o monitoramento, pelo próprio aparato estatal, de preservação da mata e de integridade dessas atividades econômicas legítimas fora da floresta. Há, porém, uma grande diferença entre uma atividade pública de vigilância que complementa e reforça uma agenda econômica construtiva e uma atividade pública de vigilância que substitui uma agenda econômica construtiva — nós queremos a primeira, não a segunda.

O terceiro conjunto de iniciativas que estou começando a debater com os Governadores tem a ver com a indústria, em particular com o problema de vincular o complexo verde — a floresta — com a indústria na Amazônia. O que a população da Amazônia mais deseja é a oportunidade de emprego. E nós precisamos encontrar os meios práticos de reconciliar essa aspiração com o nosso compromisso de manter o nosso grande tesouro natural, a Floresta Amazônica.

Hoje, a Zona Franca de Manaus, que é, ao lado da mineração no sul do Estado do Pará, uma das 2 maiores atividades econômicas na Amazônia, tem pouco a ver com a floresta, tem uma relação minimalista com a floresta. E nós queremos indústrias que tenham uma relação maximalista com a floresta, que transformem produtos madeireiros e não madeireiros da floresta e que fabriquem tecnologia apropriada para o manejo de uma floresta tropical.

Não bastará, no entanto, na Amazônia Legal, que é mais do que floresta, haver apenas indústrias que transformem produtos florestais. Será preciso, igualmente, haver indústrias que transformem produtos agropecuários e minerais, e organizar um sistema regulatório e tributário — primeiro, na Amazônia e, depois, talvez, em todo o País — que favoreça a essas indústrias agropecuárias e minerais a agregação de valor.

Estamos começando a debater várias fórmulas. Uma fórmula possível, só para efeito de debate, é a seguinte: organizar incentivos fiscais para a instalação dessas indústrias da floresta, indústrias que transformem os produtos madeireiros e não madeireiros. Mas, com respeito às indústrias agropecuárias e minerais, não incentivar o estabelecimento delas senão incentivar a agregação de valor nelas, uma vez estabelecidas.

O quarto conjunto de iniciativas que estou começando a discutir com os Governadores diz respeito à formação de recursos humanos. Esse projeto de desenvolvimento sustentável na Amazônia, com e sem florestas, só vai adiante com a qualificação da população da Amazônia.

Temos grande preocupação com a formação de quadros científicos e tecnológicos e com o estabelecimento de universidades que aproveitem aquele vasto laboratório natural. Mas a nossa primeira preocupação em matéria de formação de recursos humanos está no ensino médio, hoje o elo fraco do sistema público de educação.

A idéia é continuar ampliando o projeto federal dos CEFETs ou dos IFETs para construir, em colaboração com os Estados, um novo modelo de escola média que combine um ensino geral, porém de orientação analítica e capacitadora, com o ensino técnico e profissional. O Governo Federal seria, numa primeira etapa, responsável pela instalação dessa rede de escolas. E talvez a primeira responsabilidade dos Estados federados na colaboração com o Governo Federal seria contribuir, sobretudo, para a formação e a organização das carreiras do professorado que passaria a ensinar nessa escola.

Concluí minha apresentação inicial, só para efeito de ajudar a provocar a nossa discussão.

Reafirmo minha tese central: a causa da Amazônia sustentável, mais do que qualquer outra no Brasil dos nossos dias, é capaz de comover, de esclarecer e de orientar a Nação.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Dando continuidade à audiência pública, passo a palavra, pela ordem, aos autores do requerimento.

Em primeiro lugar, ao Deputado Nilson Pinto, do PSDB do Pará, por 5 minutos.

O SR. DEPUTADO NILSON PINTO – Sr. Ministro, em primeiro lugar, desejo cumprimentar V.Exa. pela palestre e pela clareza com que expôs o plano que concebeu.

Mais do que satisfeito, fiquei aliviado ao ver, depois de muito tempo, que o fundamentalismo que era aplicado no trato das questões amazônicas está sendo substituído por inteligência.

Então, meus parabéns a V.Exa.

Espero que as propostas, que me parecem coerentes, sejam levadas a cabo.

É sobre esse primeiro ponto que gostaria de argüir V.Exa.

Em 1995, ainda no primeiro mandato do Presidente Fernando Henrique Cardoso, participei da elaboração de uma proposta de política nacional para a Amazônia. Nas linhas apresentadas por V.Exa., reconheço certa similaridade com muitos pontos levantados à época.

A dificuldade que surgiu a partir daí, depois de elaborada essa política para a Amazônia, é idêntica à que me pergunto se poderá acontecer com o Plano Amazônia Sustentável e que medidas poderão ser tomadas para que não aconteça a descoordenação das ações. Por quê? Porque passar de um plano coerente para ações integradas em um Governo que tenha estrutura de elaboração orçamentária baseada em setores é tarefa dificílima.

Então, eis a primeira pergunta: como V.Exa. imagina que se possa garantir a coordenação das ações do presente Plano e também no futuro. para que não haja descontinuidade com mudança de Governo?

A segunda questão está relacionada a algo muito concreto na Amazônia de hoje, as nossas grandes cidades. A Região Metropolitana de Belém tem em torno de 2 milhões de habitantes; a de Manaus, também. São metrópoles que continuam recebendo migrantes de outras partes do País, particularmente do Nordeste, e que compõem um problema particular, incluindo muitas das mazelas que se vêem nas outras grandes cidades, com o agravante de que elas estão na Amazônia.

A pergunta é: o que o Plano prevê, o que o Plano pensa sobre a evolução das grandes cidades amazônicas, para que não sejam asfixiadas por uma proposta de crescimento que não contemple a população que ali vive?

A terceira questão diz respeito ao curtíssimo prazo. As ações de um plano desenham ou tentam desenhar um futuro sustentável, um futuro feliz, que é a meta que se pretende alcançar. E cada vez que discuto um plano, ou que ouço a apresentação de um plano, lembro-me de frase de um brasileiro estudioso de Filosofia, o Prof. José Arthur Gianotti, que V.Exa. deve conhecer bem, que diz que o intelectual brasileiro costuma se refugiar no futuro. Nossa questão é o presente, é o agora, sem descurar do futuro, que evidentemente é fundamental — e a região amazônica aponta nessa direção.

Temos problemas emergenciais hoje agravados pela enorme quantidade de restrições econômicas impostas à atividade produtiva na Amazônia. Eu gostaria de saber se o Plano reserva alguma atenção para a solução de problemas atuais, de curtíssimo prazo, emergenciais, que estão trazendo uma série de dificuldades à implementação de atividades agrícolas, pecuárias, econômicas de uma forma geral na Amazônia.

São essas as questões gerais, tão gerais quanto o Plano. Não pretendo entrar em detalhes específicos, porque creio que não é o objetivo do Plano.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Dando seqüência a este primeiro bloco do debate, concedo a palavra à Deputada Vanessa Grazziotin, PCdoB do Amazonas, também autora de requerimento.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Sra. Presidente, eu gostaria de fazer uma solicitação a V.Exa. O Deputado Sarney Filho vai ter de se retirar para tomar um vôo. Então, se fosse possível, peço a V.Exa. que abra uma exceção e conceda-lhe a palavra primeiro. De minha parte, não há nenhum problema.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Consulto os demais autores e Deputados inscritos. (Pausa.)

Então, com a palavra o Sr. Deputado Sarney Filho.

O SR. DEPUTADO SARNEY FILHO -Obrigado, Sra. Presidenta.

Quero parabenizar o Ministro Mangabeira Unger, porque S. Exa. tem idéias e sabe defendê-las. Isso é muito importante nesse tipo de discussão.

Tenho algumas dúvidas sobre a visão do Ministro a respeito da Amazônia. Tendo em vista as circunstâncias internacionais — o aquecimento global decorrente da ação do homem, como comprovado cientificamente, e o fato de o Brasil ser o quarto maior emissor de gases do efeito estufa por causa do desmatamento da Amazônia, e a Amazônia é um bioma que presta serviços relevantes à qualidade de vida no planeta Terra —, eu acredito que a manutenção do bioma não se dá por deleite nem específico benefício de segmentos da sociedade, mas por necessidade de que ele continue a prestar serviço num momento crucial da humanidade, que se encontra numa verdadeira encruzilhada.

Então, justamente em face dessa perspectiva, eu receio que esse Plano entenda a Amazônia não como um bioma a ser preservado — e aí eu me refiro à Amazônia florestada —, mas, sim, como uma fronteira agrícola a ser cuidadosamente ocupada pelo modelo tradicional, com as adaptações devidas, para manter o nível de desenvolvimento desejado por determinados segmentos do Governo e da sociedade.

Nesse aspecto, eu diria que temos uma grande convergência: o zoneamento ecológico e econômico. Acho premente a necessidade desse zoneamento. Não o zoneamento feito por Estados, mas o zoneamento feito pelo bioma e para o bioma, com metodologia unificada, bancado e coordenado pela União.

Por intermédio desse zoneamento se iria clarificar quais as áreas possíveis de antropizações, quais as áreas sensíveis à manutenção daquele bioma e quais as áreas que nada têm a ver com essa manutenção. Portanto, o zoneamento é importante, Sr. Ministro, mas discordo um pouco da visão de que a regulamentação fundiária tem que precedê-lo. Não há vínculo entre ume outro. Eles podem correr em paralelo.

Por outro lado, Sr. Ministro, eu não vi do Ministério que coordena as ações de desenvolvimento sustentável na Amazônia — talvez até tenha ocorrido, porque cheguei um pouquinho atrasado — nada em relação às unidades de conservação, importantíssimas para deter o desmatamento irresponsável e também para manter os serviços ambientais do bioma.

Para encerrar, quero ressaltar mais o seguinte: a Amazônia não é só um bioma que presta serviços à humanidade, à vida no planeta Terra. Não é só o grande refrigerador que é. Não é só um dos maiores estoques de gases do efeito estufa. A Amazônia também é a maior biodiversidade do planeta Terra. E todos sabemos que, além da engenharia genética, da biotecnologia, é fundamental para o desenvolvimento da Amazônia que se incentive a bioprospecção, o conhecimento da nossa biodiversidade, porque em 2003 isso já envolvia volumes de comércio da ordem de 700 bilhões de dólares.

Eram estas, Sr. Ministro, as observações que eu queria fazer. Infelizmente, não vou poder ouvir sua resposta, mas vou ter acesso às notas taquigráficas com suas palavras.

Quero parabenizá-lo mais uma vez. É importante que discutamos em torno de idéias concretas.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Ainda em relação ao primeiro bloco de inscritos, isto é, os autores dos requerimentos que geraram essa audiência pública, passo a palavra à Deputada Vanessa Grazziotin, do PCdoB do Amazonas.

A SRA. DEPUTADA VANESSA GRAZZIOTIN – Muito obrigado, Sra. Presidenta.

Em primeiro lugar, gostaria de cumprimentar V.Exa., Deputada Janete Capiberibe, o Deputado Nilson Pinto, que dirige a Comissão de Meio Ambiente, e o Ministro Mangabeira Unger.

Vou fazer um esforço enorme para ser sucinta na minha intervenção, porque vários são os Parlamentares que desejam se manifestar neste momento.

Ministro Mangabeira Unger, antes de mais nada, quero cumprimentá-lo. Tive oportunidade de fazê-lo pessoalmente em solenidade no Palácio do Planalto, quando o Presidente da República, ao lado de quase todos os Governadores da Amazônia — infelizmente, o Governador do querido Estado de Roraima não compareceu — anunciou que V.Exa. seria o Coordenador do PAS — Plano Amazônia Sustentável.

Quero dizer, Sra. Presidente, sem falsa modéstia, que no ano passado os Parlamentares — Deputados e Senadores, sobretudo os Deputados, a Deputada Marinha Raupp, que estava à frente da Coordenação da Bancada da Região Norte, o Deputado Paulo Rocha, que a sucedeu, enfim, as Coordenações de todas as bancadas dos Estados da Amazônia Legal — decidimos organizar um grande evento na Comissão da Amazônia para discutir não só o desmatamento, não só a terra indígena, não só a questão dos biocombustíveis, mas a totalidade dos problemas amazônicos.

Recorremos aos Ministério da Integração Nacional e do Meio Ambiente, mas foi no Ministério Extraordinário de Assuntos Estratégicos que encontramos guarida, Sr. Ministro. Foi exatamente lá que as luvas casaram muito bem com as nossas mãos, porque a nossa preocupação era a mesma de V.Exa.

Durante todo o debate em torno do PAS, muitos nos diziam: “Mas o PAS é um plano que está engavetado. Vocês vão discutir algo que está na gaveta?” E nós respondíamos: “Exatamente, porque está na gaveta é que precisamos debater para ressuscitar o PAS.

E hoje, com muita felicidade, Ministro Mangabeira Unger, quando o Presidente Lula anuncia o novo Ministro do Meio Ambiente, vejo que S.Exa. já traz à baila assuntos relativos ao PAS. Fico feliz, repito, pois é melhor a polêmica em torno do assunto do que ele sequer ser discutido. Aliás, havia pessoas no Governo que sequer sabiam o que era PAS — Plano Amazônia Sustentável.

Sempre que tivemos oportunidade, dissemos ao Presidente da República e a vários Ministros que o PAS não poderia ser coordenado pelo Ministério do Meio Ambiente, pois ele não é um Ministério-fim, mas um Ministério-meio. O Coordenador do PAC ou de qualquer programa de desenvolvimento não pode ser o Ministério do Meio Ambiente, porque este tem de fazer a interlocução, a tal transversalidade a que se refere, e como toda a razão, a Ministra Marina Silva.

Dissemos ao Presidente da República que o Coordenador do PAS teria de ser alguém que estivesse mais próximo à Presidência da República. E, na época, víamos 2 caminhos: ou a Casa Civil ou o Ministério que V.Exa. dirige. Como quem coordena o PAC é a Casa Civil, eu penso que, até por uma questão de divisão de atribuições e responsabilidades, o Presidente escolheu V.Exa. para coordenar o PAS. E tenha certeza V.Exa. de que contará não só com o meu apoio, mas também com o da grande maioria dos Parlamentares desta Casa, daqueles que durante o ano de 2007 se envolveram no debate desse problema.

Acho que V.Exa. começa bem. Não pude estar na reunião realizada no Estado do Amazonas, mas sei que V.Exa. já começa a discutir com os Governadores a aplicabilidade desse Plano que não pode ser letra morta, que não pode ser apenas uma carta de princípios. A essa carta de princípios têm de ser agregados programas claros, programas que, no meu entendimento, Sr. Ministro, devem ser de curto, de médio e de longo prazos. A política estratégica de longo prazo depende de ações imediatas, porque se estas não são concebidas e não são implementadas, nada acontece. E as de longo prazo, então, nem pensar.

Posso dizer que no Estado do Amazonas há também um Coordenador do PAS, que não é outro senão o Secretário de Estado de Planejamento. Em cada um dos Estados deveria haver cargo semelhante, porque, além dos programas, esse Plano deve ter a capacidade de integrar os agentes públicos e privados. E o público não é só a União, mas a União, os Estados e os municípios. Então, o que V.Exa. levanta está correto.

O ex-Ministro Sarney Filho, nosso colega Deputado, tem razão. Já participei nesta Casa de uma CPI que tratou da grilagem de terras públicas na Amazônia e, na época, somente no meu Estado do Amazonas — fui a Sub-Relatora dessa parte — conseguimos cancelar 50 milhões de hectares de terras tituladas de forma fraudulenta em cartórios. Temos de trabalhar a regularização fundiária junto com o zoneamento ecológico e econômico, porque aí, Sr. Ministro, acabaremos com a polêmica que interessa a muitos. Que polêmica? A falsa polêmica de que na Amazônia não deve ter agropecuária, de que a Amazônia tem de ficar de fora do Programa Nacional de Biocombustíveis. Como podemos aceitar afirmações como essa? Nós, que vivemos na região, sabemos: a Amazônia não é formada de um único bioma. Como vamos dizer que o homem da Amazônia não pode participar do Programa Nacional de Biocombustíveis? Nós estamos evoluindo, avançando, construindo indústrias comunitárias de manejo, de produção óleo vegetal.

Nós temos as RESEX, as Reservas Extrativistas, que hoje não podem ser trabalhadas como na época da extração da borracha há um século ou quase isso. Não. Hoje, temos de trabalhar as reservas de forma manejada, temos de adensar o que a natureza já nos deu para garantir melhor e maior produtividade.

Para concluir, eu gostaria de deixar algumas perguntas a V.Exa., Sr. Ministro. O assunto me chamou a atenção porque eu vi o Senador Tião Viana dizer que iria propor a reativação do CONAMAZ, que foi regulamentado pelo Decreto nº 1.541, de 1995. Esse decreto diz que o CONAMAZ — o Conselho Nacional da Amazônia Legal integra a estrutura do Ministério do Meio Ambiente. Suas atribuições são corretas: assessorar o Presidente da República na formulação de política nacional integrada. coordenar e articular ações, opinar sobre os projetos de lei relativos à ação do Governo Federal na Amazônia. Ocorre que o CONAMAZ é ligado ao Ministério do Meio Ambiente.

Eu pergunto a V.Exa. o que acha da idéia. Entendo que ele tem que acabar e digo por quê. Havia, até há pouco tempo, no Ministério do Meio Ambiente uma Secretaria da Amazônia. A última reforma, que, aliás, prevê o fechamento de vários postos do IBAMA, criou o Instituto Chico Mendes e também extinguiu a reforma a Secretaria da Amazônia existente no âmbito do Ministério do Meio Ambiente. Então, não tem sentido o CONAMAZ ficar no Ministério do Meio Ambiente, se nem Secretaria da Amazônia existe mais. No seu lugar, criou-se a Secretaria de Mudanças Climáticas.

Então, eu pergunto: o que V.Exa. acha da idéia de, em torno do PAS, criar um conselho relativo à Amazônia Legal e do qual participem não só Ministros, mas também Governadores e, quem sabe?, Prefeitos de Capitais e de municípios do interior, além de representantes de institutos de pesquisa, de educação etc.?

Em segundo lugar, V.Exa. fala de incentivos fiscais para a produção. Qual a sua opinião, Sr. Ministro, sobre os projetos de lei que façam com que as Unidades da Federação tenham a sua renda aumentada por conta da preservação da floresta, e, portanto, do serviço ambiental que prestam ao País?

Nesta Casa, tramitam vários projetos nesse sentido. Da Senadora Marina Silva, o FPE Verde, um projeto fantástico, que trata de Imposto de Renda Verde. Queria ouvir a opinião de V.Exa., se V.Exa. tem um plano e se acha possível introduzirmos esse assunto ainda agora na reforma tributária.

Também pergunto a V.Exa. sobre o Sistema de Proteção da Amazônia — SIPAM. Ele nasceu junto com o SIVAM, na década passada. O SIVAM acabou — foi transformado em Cindacta IV — e o SIPAM ficou na Casa Civil, meio capenga. Qual sua opinião a respeito? O que fazer com o SIPAM, porque, em minha opinião, do jeito que está, não pode ficar. Inclusive, a ele foi garantido o orçamento para fazer o levantamento cartográfico, pelo menos, de parte importante da Amazônia.

Por fim, Sr. Ministro, queria que V.Exa comentasse matéria publicada no jornal londrino The Independent, no dia 15. Aliás, não é matéria, mas um editorial. E o The New York Times dos últimos dias acabou também promovendo uma grande repercussão.

O editorial do jornal londrino diz que uma coisa tem de ficar clara: “que a parte do Brasil” — e essa parte é a Amazônia — “é importante demais para ser deixada aos brasileiros. Se perdermos as florestas, perderemos a batalha contra as mudanças climáticas”.

Isso não é novidade, porque conhecemos a opinião de Al Gore em relação à Amazônia. Aliás, Al Gore virou rapidamente uma grande autoridade ambientalista mundial! O que o senhor pensa dessas declarações que volta e meia partem de lideranças importantes internacionais?

Muito obrigada, e desculpe-me, Sra. Presidenta, Deputada Janete Capiberibe, por ter excedido o meu tempo.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Antes de passar a palavra ao último autor de requerimento que motivou esta audiência pública, o Deputado Giovanni Queiroz, quero avisar que o Sr. Ministro solicitou nossa compreensão para que S.Exa. pudesse ser liberado às 12h30min, pois tem outro compromisso agendado. Então, solicito a compreensão das Sras. e dos Srs. Parlamentares que estão participando do debate.

Tem a palavra, por 5 minutos, o Deputado Giovanni Queiroz, do PDT do Estado do Pará.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Muito obrigado.

Sra. Presidente, Sr. Ministro, Deputado Nilson Pinto, eu serei econômico até nos elogios.

Sr. Ministro, quero dizer a V.Exa. que sua explanação foi excepcional. Do meu ponto de vista, saímos de um estrangulamento que se propunha para a Amazônia, de tornar a região apenas uma vitrine, como V.Exa. se referiu, para sonhar com o seu efetivo desenvolvimento, com preservação, sim, mas eu não chegaria ao exagero de dizer que teria de ser desmatamento zero. De repente, teremos de discutir: por que desmatamento zero? É o melhor? Essa mata é improdutiva? Ela pode ser transformada em mata produtiva. Então, essa é uma questão para, mais à frente, ser discutida.

Mas, neste momento, temos de frear o desmatamento, e o Estado tem de se fazer presente, Sr. Ministro. Na verdade, o Estado é absolutamente ausente no processo de frear esse desmatamento que ele tanto apregoa necessário, mas que muito pouco faz a respeito. O Ministério do Meio Ambiente, lamentavelmente, tem sido omisso, absolutamente alienado e até acovardado, porque denúncias lhe são encaminhadas. Pessoalmente, entreguei, algumas vezes, à Sra. Ministra Marina Silva denúncias de desmatamento de áreas por invasões de reservas florestais na Amazônia. E aí entra a questão da segurança jurídica, que o Estado, às vezes, não assegura, permitindo a invasão de reservas florestais e de propriedades, quando tinha a obrigação de preservá-las.

Segunda questão. Está tramitando no Congresso Nacional medida provisória que permite ao Estado regularizar as áreas de até 15 módulos fiscais, com o máximo de 15,5 mil hectares. No entanto, alguns ambientalistas entendem que a regularização fundiária pode vir em prejuízo ou em incentivo ao desmatamento. Trata-se de uma interpretação equivocada. São áreas já ocupadas as que seriam regularizadas. Isso permitiria o acesso dos seus respectivos proprietários a incentivo fiscal para reflorestar ou para outra atividade, o que aumentaria a produção e, com isso, diminuiria o processo de desmatamento.

Sr. Ministro, V.Exa. irá enfrentar muitas dificuldades, mas tenho certeza de que, como guerreiro que é, poderá ajudar a Amazônia a se transformar para vir ao encontro do que nós precisamos para o País.

Nesse sentido, Sr. Ministro, temos ali um problema que tem de ser enfrentados em caráter emergencial: a política industrial. Enquanto permitirmos que se sangre a Amazônia, retirando os seus minérios, que são recursos não renováveis, como se está fazendo atualmente, vamos ficar, daqui a alguns anos, como na Serra do Navio, no Amapá, com o buraco, a miséria e o apito do navio.

Isso já ocorre hoje na região sul do Estado do Pará, onde atua Vale do Rio Doce. A Vale é uma empresa excepcional, mas tem de ser motivada para verticalizar a produção, para que possa gerar emprego, renda e qualidade de vida para o povo que ali vive, como alternativa, sim, econômica para a Amazônia, como propôs V.Exa. Para tanto, precisamos mudar essa política que estimula a exportação. A Lei Kandir veio estimular esse tipo de prática, que tem de ser reorganizada e readaptada.

Quero, então, saber qual a proposta que V.Exa. tem no sentido de o País mudar esse enfoque de exportação de matéria-prima em detrimento da verticalização da produção na área.

E a terceira questão. Eu estava lá quando foi anunciado o PAS. O Ministro Geddel dizia que nos próximos dias já teria um estímulo fiscal a ser colocado para o reflorestamento, Deputado Nilson Pinto. Seria financiamento com 4% de juro, até 12 anos de carência, logicamente dependendo da espécie da floresta a ser plantada, e até 20 para pagar. Quero dizer a V.Exa. o seguinte: se ficar só na mão do Banco da Amazônia operar esse tipo de processo, não acontece. Digo isso porque eu conheço a estrutura, nós conhecemos. Eu sou reflorestador, sou sócio do Banco da Amazônia, que me financia em 600 hectares de teca plantada. O Banco da Amazônia não dá conta de operacionalizar um fluxo um pouquinho maior de demanda. Não atende nem a demanda de hoje, muito menos a de amanhã, no estímulo de governo. Então, é necessário que se estenda para o Banco do Brasil e o Banco do Estado do Pará, para que sejam agentes financeiros.

Para concluir. Sr. Ministro, a dose foi muito forte, foi cavalar, como dizem na minha região, para matar cavalo. Isolam a Amazônia na sua condição de produção, como disse o Deputado Nilson Pinto. Ações pontuais e emergenciais em que nós precisamos contar com V.Exa. Primeiro, resolução do Banco Central diz que a partir de 1º de julho não pode liberar 1 centavo. Nenhum banco, nenhum banco, para produção agrícola, para custeio, para investimento, para qualquer coisa, para quem não tiver já a licença ambiental garantida. Essa licença ambiental, Sr. Ministro, precisa ter o georreferenciamento da área, para se fazer o cadastro ambiental rural, para depois sair a licença ambiental rural. Se todos os profissionais fossem para a região amazônica, porque é para a Amazônia toda, não são só os 36 municípios, demoraria, no mínimo, 4 anos. No mínimo. Isso aceito pelo Presidente do INCRA, que reconhece que não tem como.

Fomos ao Ministro da Agricultura e ele disse: “Eu concordo, não tem jeito, isso não pode continuar, porque vai isolar a Amazônia”. E ali é a produção de um Paraná inteiro. Em termos de grãos e em termos de pecuária. Nós temos 30% da pecuária do Brasil. É um estrangulamento. E a partir de 1º de julho não pode mais liberar. O Banco do Brasil, querendo ser mais realista do que o rei e estando autorizado pela mesma resolução, já está exigindo desde 1º de maio esse procedimento. Estrangulamento e isolamento da Amazônia. Os procedimentos deverão vir no sentido de diminuir ou estancar o desmatamento. Eu concordo. Mas esse, para quem lá já produz, lá já está, não pode ser feito.

Então, quero pedir a V.Exa. que interceda junto ao Governo. Já que a D. Marina Silva não veio e parece que o outro é mais pragmático e deve ser um pouco mais sensível nessas demandas de homens que produzem na Amazônia e buscam integrá-la ao País, ao desenvolvimento nacional, para que possamos continuar a produzir, até que alternativas, como V.Exa. propõe, cheguem para tirar o homem do avanço na derrubada da mata, para reflorestar aquela região já desmatada e produzir de forma intensiva, como V.Exa. bem propõe.

São essas as nossas considerações.

Parabéns mais uma vez, Ministro.

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe.) – Antes de passar a palavra ao Ministro Mangabeira Unger, consulto o plenário desta audiência pública sobre a possibilidade de darmos continuidade à audiência pública em data próxima. É uma solicitação do Ministro. Ele tem compromisso às 13h. Solicitou ficar até às 12h30. São 12h24.

Ministro, os autores dos requerimentos têm um profundo interesse em discutir o Plano Amazônia Sustentável e o PAC da Amazônia e há presença de um número muito grande de Parlamentares agora. Estão presentes os Deputados Marinha Raupp, de Rondônia; Francisco Rodrigues, de Roraima; Francisco Praciano, do Amazonas; Laurez Moreira, do Tocantins; Mendes Thame, de São Paulo; Paulo Rocha (Coordenador da Bancada do Norte), do Pará; José Genoíno, de São Paulo; Vanessa Grazziotin; Marcio Junqueira, de Roraima; Giovanni Queiroz, do Pará; Devanir Ribeiro, do PT; Zequinha Marinho, do PMDB do Pará; Homero Pereira, do PR de Mato Grosso; Carlito Merss, do PT de Santa Catarina; e Fernando Melo, do PT do Acre. E para um segundo bloco estão inscritos 9 Parlamentares.

Agora, eu consulto o plenário, a partir da solicitação do Ministro, e nós continuaremos este debate muito importante para a nossa região em data a mais próxima possível que nós possamos…

O SR. DEPUTADO MARCIO JUNQUEIRA – Pela ordem, Sra. Presidente.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe.) – Pela ordem, Deputado Marcio Junqueira.

O SR. DEPUTADO MARCIO JUNQUEIRA – Todos entendemos que o Ministro tem compromisso, mas nós também temos. E todos nós que estamos aqui deixamos nossos compromissos para vir. Porque se dá a conotação de que só o Ministro tem compromisso. Todos aqui têm compromisso. Portanto, deveria ter sido analisado antes, porque eu deixei de viajar hoje para o meu Estado para ficar nesta audiência. Então, todos nós aqui temos compromisso.

Fica registrado que eu acho isso uma deselegância, entendo que nós devemos ser mais incisivos quando trouxermos aqui autoridades, porque nós vimos aqui para sermos ouvidos, não só para ouvirmos.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Deputado Marcio Junqueira, o senhor tem razão, com certeza. E nós deixamos à apreciação deste plenário o encerramento após este primeiro bloco e adiamento da audiência pública ou sua continuação agora.

O SR. DEPUTADO FRANCISCO RODRIGUES – Pela ordem.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Pela ordem, Deputado.

O SR. DEPUTADO FRANCISCO RODRIGUES – Nobre Deputada, a exemplo do Deputado Marcio Junqueira, eu não quero aqui, de forma alguma, culpar o Ministro Mangabeira Unger, porque nós obviamente sabemos que alguns compromissos assumidos pelos Srs. Ministros e até outros convidados prejudicam muitas vezes os convites ou as convocações. É claro que isso se tem repetido sistematicamente aqui, na Câmara. Semana passada, tivemos uma audiência pública em que no calor da discussão, na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional, o Ministro da Justiça, Tarso Genro, deixou, acredito, o Presidente da FUNAI representando-o. Estava presente também um Governador.

Então, eu gostaria até, e aqui vai uma sugestão ampla, não apenas para esta Comissão, mas para todos nós, Parlamentares, de encontrarmos um mecanismo regimental para, ao ser convidado um Ministro, ser agendado de forma que não houvesse nenhum prejuízo quando da sua presença aqui. Que fosse agendado com um tempo elástico, para que fossem discutidas as questões e os Parlamentares, nas suas manifestações, não ficassem prejudicados. Porque nós temos uma série de situações a serem discutidas. O Deputado Marcio Junqueira…

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Solicito a compreensão…

O SR. DEPUTADO FRANCISCO RODRIGUES – O Deputado Marcio Junqueira, quando… Nobre Parlamentar, gostaria que V.Exa. pedisse silêncio ao Plenário. Quero dizer que a manifestação do Deputado é absolutamente compreensível. Ele deixou de viajar. Outros Parlamentares aqui, o Deputado José Genoíno, Moreira Mendes, os demais Deputados, todos ficam preocupados porque nós queríamos na verdade que, com as explicações do Ministro Mangabeira Unger, que, diga-se de passagem, são absolutamente claras… Esse projeto concebido pelo Ministro Mangabeira Unger, o PAS, vem, na verdade, revigorar a Amazônia. Eu tenho certeza, Ministro, e aqui não quero tecer nenhum elogio gratuito, até porque sou da Oposição, que V.Exa. é o melhor quadro deste Governo que está aí instalado. V.Exa., na verdade, está trazendo à discussão programas importantíssimos que estão represados na administração pública nacional. Agora, é lógico que isso cria esse pequeno incidente quanto à participação efetiva dos Parlamentares nos debates.

Então, seria bom que ficasse claro, eu vou até sugerir… Aqui tem um regimentalista de carteirinha histórico nesta Casa, o Deputado José Genoíno, que poderia até ajudar a propor uma mudança para que os convidados permanecessem até o final do debate. Essa é a minha sugestão, que é ampla, não apenas para esta Comissão, mas para todas as Comissões desta Casa.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Obrigada ao Deputado Francisco Rodrigues.

O SR. DEPUTADO MOREIRA MENDES – Pela ordem.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Pela ordem, o Deputado Moreira Mendes. Em seguida…

(Intervenção fora do microfone. Ininteligível..)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Após o Deputado Moreira Mendes, Deputado Genoíno.

O SR. DEPUTADO MOREIRA MENDES – Eu quero ser muito rápido para dizer o seguinte: temos de ser objetivos. Acho que o Ministro tem razão. Ele tem os compromissos dele, a gente tem que entender isso, assim como nós também temos. E é tão importante o que o Ministro tem a dizer neste debate que eu até preferiria realmente que a sua presença fosse adiada, senão ele vai ficar respondendo às perguntas com rapidez e nós vamos ficar aqui também fazendo as nossas indagações de afogadilho, o que não é o caso.

Então, eu concordo com a proposta de V.Exa. Ouvido o Ministro, se ele acha outra data na agenda, porque é importantíssimo nós continuarmos com este debate aqui. E todos aqui, especialmente os que representam os Estados da Amazônia, devem também dar a sua opinião e ouvir o Ministro.

Era isso que eu queria dizer.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Pela ordem, 1 minuto para o Deputado José Genoíno.

O SR. DEPUTADO JOSÉ GENOÍNO – Presidente, é uma sugestão. Que a Comissão adie a audiência pública e marque outra proximamente, com a mesma lista de inscritos que está aí. Portanto, é a lista que está aí.

(intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

O SR. DEPUTADO JOSÉ GENOÍNO – Não, não, você falou muito.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Com a palavra, pela ordem, o Deputado Wandenkolk.

O SR. DEPUTADO JOSÉ GENOÍNO – Então, a minha sugestão é: interrompe agora e retoma a audiência com a lista dos inscritos proximamente.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Deputado Wandenkolk. Depois, submeterei à apreciação do plenário a continuação em uma próxima data.

O SR. DEPUTADO WANDENKOLK GONÇALVES – Deputada Janete, eu não considero que o Ministro Mangabeira veio a esta audiência hoje. Para mim, não existiu a audiência, até porque, quando nós marcamos a audiência, a primeira coisa que consultamos é a agenda do Ministro, para que possamos justamente usufruir da sua presença num debate como este, tão importante. Então, para mim, ele não veio, não veio a esta audiência. Então, não temos que adiar nada. Eu fico até curioso, Ministro, de saber o que tem mais importante na sua agenda do que esta discussão, para saber se realmente a Amazônia é importante ou não. Eu realmente fiquei curioso de saber, até porque V.Exa. é que se predispôs a vir neste momento. Para falar apenas 5, 10 minutos e não ouvir, não adianta nada. O programa que V.Exa. explicitou aqui nós já ouvimos em outra oportunidade. V.Exa. tem que ouvir os amazônidas, como é que se faz para buscar realmente alternativa para a Amazônia. Ou significa dizer que nós desconhecemos. Eu não considero, atribuo a uma deselegância de V.Exa. e um desrespeito de V.Exa. para com esta Comissão, porque todos nós também deixamos outros compromissos para privilegiar e priorizar V.Exa., porque todos nós precisamos ouvi-lo. Então, não considero que V.Exa. veio hoje a esta Comissão.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Submeto ao plenário…

(Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Antes de passar a palavra para o Ministro, nós teremos que decidir, porque há um bloco de 10 Parlamentares inscritos que não fizeram sua intervenção ainda. E a sugestão do Deputado Genoíno…

(Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – … que eu quero…

Eu me dirijo ao plenário. O Ministro responderá a esse primeiro bloco. E submeto também que a sugestão do Deputado Genoíno seja acatada e no dia 4 de junho, às 10h, numa quarta-feira, o Ministro esteja de volta aqui, nas Comissões da Amazônia e de Meio Ambiente, para a continuação da audiência pública.

(Intervenção fora do microfone. Ininteligível.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Bom, o Ministro vai estar no exterior e sugere o dia 11. Então, eu submeto aos Parlamentares.

Deputados e Deputadas que concordam com essa proposta permaneçam como se encontram. (Pausa.)

Aprovada.

Então, eu repasso: será no dia 11, quarta-feira, às 10h…

O SR. DEPUTADO WANDENKOLK GONÇALVES – Contra o meu voto.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – …a continuação da audiência pública, registrado o voto contrário do Deputado Wandenkolk.

Passo a palavra para o Ministro dar as suas respostas e fazer as suas considerações finais. Com a palavra, Sr. Ministro.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado. Em primeiro lugar, eu quero registrar, Deputados, o meu entendimento a respeito do processo. Sem dúvida, o meu entendimento exprime a minha falta de experiência nesses assuntos. Eu não havia entendido que esta visita hoje à Comissão seria uma visita singular. A minha proposta é vir aqui quantas vezes os senhores me aceitem. Eu posso vir toda semana se quiserem. Em princípio, a minha idéia é organizar a minha agenda de modo a assegurar que quase sempre esteja em Brasília nas quartas-feiras.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Solicito silêncio, para que possamos todos ouvir a participação do Sr. Ministro.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Agora, quero dizer também que estou fazendo o melhor que posso para reconciliar as minhas tarefas, dormindo muito pouco e me esforçando para ser delicado e correto com todos. Eu não gostaria de sair desta Comissão com o desagrado de seus membros, porque a última coisa que faço nas relações com os outros, sejam poderosos ou não, é praticar indelicadezas. Então, se os senhores não me eximirem, eu não sairei. Eu só sairei com a sua licença. Eu estou tentando reconciliar muitas tarefas e muitas obrigações numa situação difícil e me prontifico a voltar a este recinto quantas vezes me quiserem. Hoje, eu tenho um programa particular por causa de uma emergência que surgiu. Mas, se a Comissão entender ser indelicado da minha parte sair para atender a essa emergência, não sairei. Só sairei com a sua licença.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Sra. Presidente, eu acho que nós temos é que (ininteligível) Ministro, alguns ânimos tenham se exaltado, mas frente a uma emergência, todos nós estamos liberados automaticamente.

Acho que esta Comissão agradece a presença de V.Exa., agradece a disponibilidade de V.Exa. de poder voltar quantas vezes forem necessárias para esclarecimentos e debates. E eu entendo que, já votada a matéria sobre a possibilidade do retorno do senhor no dia 11, já fica assim votado e o Ministro dispensado, logicamente, e com as nossas desculpas, porque, com certeza, alguns podem ter se exacerbado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Tendo em vista que os trabalhos desta reunião conjunta foram gravados e seus registros constarão dos Anais da Comissão, consulto o plenário sobre a possibilidade da dispensa da leitura da ata. (Pausa.)

Fica dispensada a leitura.

Em votação a ata da reunião conjunta das Comissões da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional; de Minas e Energia; e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.

Aprovada a ata.

Agradeço a valiosa contribuição e os esclarecimentos prestados pelo expositor, que estará de retorno no dia 11 de junho, às 10h. Nessa audiência, todos os inscritos farão uso da palavra e o Ministro disporá de todo o tempo necessário para que esgotemos toda a pauta pré-agendada no dia de hoje.

Nada mais havendo a tratar, convoco os membros deste colegiado para as reuniões com o Ministro dos Transportes, Sr. Alfredo Nascimento, no Gabinete do Ministro, na Esplanada dos Ministérios, às 15h de hoje, e com o Comandante da Marinha, almirante Júlio Soares de Moura, no Gabinete do Comandante, na Esplanada dos Ministérios, às 16h30.

Declaro encerrada a presente reunião.





A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Declaro aberta a presente reunião de audiência pública conjunta, promovida pela Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional e pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável — cujo Presidente, André de Paula, encontra-se compondo a Mesa —, em atendimento aos Requerimentos de nº. 363, de 2008, de autoria da Deputada Vanessa Grazziotin, subscrito pelos Deputados Luciano Castro e Giovanni Queiroz; nº 371, de 2008, da Deputada Dalva Figueiredo, subscrito pelo Deputado Sergio Petecão; nº 372, de 2008, da Deputada Janete Capiberibe, subscrito pelo Deputado Marcelo Serafim, e nº 182, de 2008, do Deputado Nilson Pinto, subscrito pelos Deputados André de Paula, Marcelo Almeida, Antonio Carlos Mendes Thame, Ricardo Tripoli, Givaldo Carimbão, Germano Bonow, Luiz Carreira, Moreira Mendes e Wandenkolk Gonçalves.

A reunião foi convocada para debater a política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia, tendo com convidado o Ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Sr. Mangabeira Unger.

Inicialmente, gostaria de cumprimentar todos presentes, em especial o Sr. Ministro e o Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Deputado André de Paula.

Informo que em razão de compromissos assumidos pelo Sr. Ministro a reunião anterior foi interrompida, no último dia 21 de maio, após a fala de S.Exa.

Por favor, eu solicito silêncio, para que esta reunião de audiência pública possa acontecer com harmonia e com a participação de todos.

Então, a reunião de 21 de maio, como eu dizia, foi interrompida após a fala do Ministro  e a exposição de alguns dos autores dos requerimentos, Deputados Nilson Pinto, Vanessa Grazziotin e Giovanni Queiroz. Na condição de Presidente da Frente Parlamentar Ambientalista, também o Deputado Sarney Filho fez uso da palavra, junto com os 3 autores do requerimento.

Aos Parlamentares que quiserem se inteirar do que foi discutido na reunião anterior, informo que se encontram sobre as bancadas cópias das notas taquigráficas, já distribuídas a todos os Deputados das Comissões da Amazônia e de Meio Ambiente, por e-mail. Sobre as bancadas também se encontram dispostas cópias da ata da audiência do dia 21.

Ficou acordado que retomaríamos nossas atividades de hoje garantindo a palavra aos Parlamentares inscritos para debate que não tiveram a oportunidade de falar, conforme lista elaborada no dia 21. Pela ordem, os Deputados: Marcio Junqueira, do DEM de Roraima; Antonio Carlos Mendes Thame, do PSDB de São Paulo; Francisco Rodrigues, do DEM de Roraima; José Genoíno, do PT de São Paulo; Marinha Raupp, do PMDB de Rondônia; Francisco Praciano, do PT do Amazonas, e Moreira Mendes, do PS de Rondônia.

O Sr. Ministro, no entanto, gostaria de retomar a sua fala para esclarecer alguns pontos que considera importantes, incluindo a reunião acontecida entre o Sr. Ministro e os Governadores.

Se todos concordam, eu repasso a palavra ao Sr. Ministro Mangabeira, para esses novos esclarecimentos. 

Com a palavra o Sr. Ministro.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado, Deputada.

Srs. Deputados, Sras. Deputadas, meus concidadãos, em primeiro lugar, eu reitero as minhas desculpas pela interrupção que eu provoquei na última audiência pública, causada por um imprevisto grave que surgiu. Reafirmo a grande importância que atribuo a essa discussão com o Congresso Nacional.

Todos nós temos momentos de dúvidas e desalento. O que eu posso dizer é que nos meus tais momentos o convívio com o Congresso Nacional tem sido um fonte não só de consolo mas também de inspiração. Estarei sempre disponível para esta Comissão em qualquer momento. E para mim será sempre um manancial de orientação do meu trabalho ouvi-los e poder debater com os senhores. 

Pedi a Sra. Deputada uma oportunidade de fazer um relato inicial. Nas semanas transcorridas desde a nossa última discussão ocorreu uma reunião em Belém com os Governadores de toda a Amazônia Legal e persisti nas minhas viagens de estudo e debate pelos Estados da Amazônia. 

Estou, portanto, em condições de lhes prestar um relato mais preciso a respeito das nossas idéias sobre os primeiros passos no desdobramento do Plano Amazônia Sustentável. 

Começo com algumas observações preliminares a respeito da direção e do método deste Plano Amazônia Sustentável, e, em seguida, enumero 7 iniciativas que discutimos com os Governadores em Belém e que agora estou discutindo mais pormenorizadamente com meus colegas Ministros e com cada um dos Governos da Amazônia Legal. 

A minha primeira observação preliminar é que já ocorreu uma grande mudança. Pela primeira vez na história do Brasil a Amazônia está no centro da atenção nacional. Esse fato extraordinário e auspicioso cria uma imensa oportunidade para mobilizar capital político a serviço de um grande projeto de preservação, de desenvolvimento e de defesa da Amazônia. Estou aflito para aproveitar cada dia, cada hora, e levar este projeto adiante na janela de oportunidade política que temos. 

A minha segunda observação preliminar é que não é correto dizer que o nosso problema principal hoje seja um conflito entre objetivos de preservação e objetivos de desenvolvimento. Não há dúvida de que mais adiante, à medida que desdobrarmos nossas iniciativas, surgirão contradições pontuais entre iniciativas desenvolvimentistas e iniciativas preservacionistas. Mas o problema principal agora não é esse, o problema principal agora é que estamos muito aquém de onde deveríamos e poderíamos estar, tanto em matéria de preservação quanto em matéria de desenvolvimento.

A Nação anseia por uma reconciliação profunda e duradoura entre  desenvolvimento e preservação da Amazônia. 

Há uma convergência abrangente no País em direção à tese do desenvolvimento sustentado. Só há poucos brasileiros que entendem que a Amazônia deva ser um santuário vazio de gente e de iniciativa econômica,  também poucos que entendem que o preço inevitável do desenvolvimento seja a aceitação de atividades econômicas devastadoras do bioma Amazônia. A grande maioria sustenta a tese do desenvolvimento sustentável. O nosso problema é que essa convergência ainda é relativamente abstrata e a nossa tarefa é preenche-la tão rapidamente quanto possível com conteúdo prático. 

A minha terceira observação preliminar é que as causas da preservação, do desenvolvimento e da defesa estão entrelaçadas na Amazônia. Não haverá preservação do meio ambiente sem desenvolvimento econômico. Tenho dito em todo lugar que a Amazônia não é apenas uma coleção de árvores, é um grupo de pessoas. Se os 25 milhões de brasileiros que moram lá não tiverem oportunidades econômicas serão impelidos inexoravelmente em direção à atividades que acelerarão o desmatamento. Portanto, um projeto ambiental carente de projeto econômico seria inconsistente e contraproducente. 

Por outro lado, sem um projeto econômico também não haverá estruturas produtivas e sociais organizadas. Uma vasta região sem estruturas produtivas e econômicas organizadas é muito difícil de defender. 

A minha quarta observação preliminar é que a causa da Amazônia não é uma causa regional, é uma causa nacional. A Amazônia é o terreno privilegiado para repensar e reorganizar todo o País. Na Amazônia joga-se o futuro do Brasil. 

O Plano Amazônia Sustentável, que o Presidente e o Governo determinaram que eu coordenasse, não é uma planilha, é um conjunto de diretrizes e de compromissos que agora temos que transformar em ações concretas. E não sou o dirigente deste Plano, sou o coordenador. 

O projeto Amazônia é necessariamente uma obra coletiva a ser construída em conjunto, em primeiro lugar, com os Governos da Amazônia Legal e depois com as forças organizadas de todo o País. E este recinto é o ambiente privilegiado em que inicia-se o debate nacional.

Feitas essa 4 observações preliminares, passo a descrever sumariamente os 7 conjuntos de iniciativas que já começamos a debater como conteúdo do Plano Amazônia Sustentável e que serviram de foco às nossas discussões em Belém.

O primeiro conjunto de iniciativas tem a ver com regularização fundiária e zoneamento ecológico e econômico. Se há um problema que tenha prioridade causal sobre todos os outros na Amazônia hoje é a regularização fundiária. Toda a Amazônia brasileira é um caldeirão de insegurança jurídica. Não conseguiremos resolver nenhum dos problemas da Amazônia se não avançarmos decisiva e rapidamente na regularização da propriedade da terra. 

Enquanto a Amazônia permanecer nessa situação de insegurança jurídica generalizada, tudo o que contruirmos será construído sobre areias movediças. 

Para avançar na regularização fundiária, temos que caminhar simultaneamente em 2 trilhos. O primeiro trilho é fortalecer as capacitações administrativas dos órgãos responsáveis, federais e estaduais, a começar pelo INCRA, mas duvido que seja suficiente. 

Nenhum dos grandes países da história moderna que enfrentou um problema fundiário dessa dimensão, inclusive os Estados Unidos, no curso do século XIX, conseguiu resolvê-lo sem revisões de grande dimensão no seu Direito Civil sobre a propriedade da terra, e nós não seremos uma exceção. 

Há certos institutos no Direito Agrário brasileiro existente que permitem uma trajetória acelerada da posse insegura para a propriedade plena, mas nós teremos de alargar esse caminho, esses institutos, como a legitimação da posse ou a regularização fundiária com dispensa de licitação não serão suficientes. As revisões jurídicas necessárias estão em 2 categorias. De um lado, permitir esse movimento acelerado da posse para a propriedade e, de outro lado, enriquecer as conseqüências jurídicas da posse legítima, para que quem ainda não goze da propriedade plena possa gozar de muitos dos direitos que compõem a plena propriedade. 

É nesse clima de regularização fundiária que poderemos avançar no zoneamento ecológico e econômico. 

Para corrigir o mal-entendido que surgiu na nossa última discussão, não entendo que a regularização fundiária precisa ser condição antecedente do zoneamento, mas é no ambiente de um grande progresso sobre regularização fundiária que poderemos também progredir no zoneamento. A tarefa do zoneamento é definir uma estratégia para a Amazônia com floresta e outra para a Amazônia sem floresta, estratégias distintas para cada uma das microrregiões da Amazônia. 

O segundo conjunto de iniciativas que comecei a discutir com os Governos da Amazônia Legal e com meus colegas tem a ver com as medidas contra o desmatamento. Precisamos persistir e até radicalizar no combate contra o desmatamento. 

Afirmo de maneira inequívoca: o Governo brasileiro não encara a floresta Amazônica como fronteira agrícola. 

Há medidas emergenciais já lançadas sob a rubrica da Operação Arco Verde destinadas a fortalecer o combate contra o desmatamento. Mas nós temos agora que enfrentar 2 problemas estruturais. O primeiro problema é municiar, com quadros e com meios técnicos, as unidades de conservação. Não adianta criar unidades de conservação sem equipá-las com pessoas e com técnicas. As árvores não se defendem por si mesmas. 

O segundo problema estrutural a resolver é decidir até que ponto devemos e podemos insistir no reflorestamento das áreas que foram ilegalmente devastadas. 

O terceiro conjunto de iniciativas tem a ver com a situação das populações de pequenos produtores, agrícolas ou extrativistas, que atuam nas zonas de transição entre o cerrado e a floresta. 

Quando essas pessoas não têm alternativas econômicas legítimas, são levadas a desmatar, conduzindo, nas áreas desmatadas, uma pecuária extensiva, desordenada e de pequena escala, vendendo madeira ilegalmente ou transformando madeira em carvão. 

Nós precisamos construir para essas populações um elenco de alternativas de produção que sejam economicamente viáveis e ambientalmente seguras, lavouras perenes, cultivo de peixes, plantio de árvores ou produção para o biodiesel, dependendo das vocações de cada lugar. Precisamos construir um mecanismo para remunerar essas populações, além dos ganhos normais de suas atividades produtivas, em troca das obrigações que assumiriam de prestar contas e de monitorar. E essa remuneração especial seria um vínculo que sacramentasse o engajamento dessas pessoas nesses programas. 

Finalmente, o Estado também tem que vigiar, mas uma coisa é a vigilância estatal para complementar uma agenda econômica construtiva, que é o que queremos, e outra coisa é a vigilância estatal para substituir a falta de uma agenda econômica construtiva, que é o que queremos evitar.

O quarto conjunto de iniciativas já discutidas com os Governadores tem a ver com a organização da agricultura e da pecuária na Amazônia sem floresta, na Amazônia dos nossos grandes cerrados ou savanas tropicais. 

Ali temos uma oportunidade de apontar caminho para o País todo. Há 2 grandes tarefas paralelas, uma econômica e física e outra institucional. 

A tarefa econômica e física começa com a constatação de que no Brasil hoje, para cada hectare sob lavoura, há 3 hectares entregues à pecuária extensiva, que é uma forma relativamente ineficiente de produção. 

Todo o mundo sabe que o Estado do Mato Grosso é hoje um dos grandes celeiros não só do Brasil, mas do mundo. Mas toda a atividade agrícola daquele Estado ocorre em 8% do seu território. 

Nós poderíamos, no Brasil, com relativa facilidade, dobrar a área sob cultivo e triplicar o nosso produto agrícola sem tocar uma única árvore. A tarefa física e econômica é recuperar pastagens, substituir pecuária extensiva por intensiva, e integrar essa pecuária intensiva com uma agricultura de alto valor agregado, e nesse contexto enfrentar os problemas de transporte e de insumos da agricultura brasileira. 

Hoje o problema número um de transporte na agricultura brasileira é o escoamento dos grãos do Centro-Oeste para o Norte, e problema prioritário em matéria de insumos é superar a nossa desnecessária dependência da importação de fertilizantes. 

Os fertilizantes respondem por cerca de 40% do custo dos produtos agrícolas, e o mercado mundial de fertilizantes está na mão de um pequeno número de oligopólios. É um verdadeiro cartel, e nós precisamos quebrar esse cartel. Paralelamente a essa tarefa econômica e física, há uma tarefa institucional até mais importante. Sem cumprirmos a tarefa institucional não conseguiremos levar a cabo a tarefa econômica e física. 

Temos que superar o contraste nocivo que existe no País há muito tempo entre uma agricultura familiar e uma agricultura empresarial. O desenho institucional de uma agricultura moderna é um só, e, enquanto tivermos esse contraste, é muito grande o risco de os problemas centrais da agricultura brasileira caírem no fosso entre esses 2 ideários agrícolas. 

A primeira vertente dessa construção institucional, que nós poderíamos começar na Amazônia dos cerrados, é a coordenação estratégica entre o Estado e o produtor, e essa coordenação tem um conteúdo definido. Em primeiro lugar, organizar a comercialização do produto. Quando o mercado não faz, o Estado tem que fazer como vanguarda do mercado. Em segundo lugar, organizar o extensionismo agrícola, a assistência técnica, que foi destroçada no País nas últimas décadas e que é a correia de transmissão indispensável entre os inventos da EMBRAPA e a atividade do produtor rural. E, em terceiro lugar, organizar a política de preços do seguro agrícola e o seguro de renda para resguardar a agricultura contra a combinação fatal do risco físico e do risco econômico. 

A segunda grande vertente da construção institucional é reorganização dos mercados agrícolas do Brasil. Na maioria dos nossos mercados agrícolas em todo o País, os produtores estão fragmentados e os fornecedores e compradores estão cartelizados. Por isso, os compradores e fornecedores se apropriam da parte do excedente econômico da atividade agrícola. Nós temos que reorganizar os mercados para fortalecer os produtores diante dos compradores e dos fornecedores. 

A terceira grande vertente dessa construção constitucional é o conjunto de facilidades jurídicas e de incentivos econômicos para as práticas de concorrência cooperativa entre os produtores. É um conceito mais amplo do que o de cooperativa no sentido estrito. Significa que os produtores podem competir entre si, cooperar ao mesmo tempo, fazer mutirão de certos recursos comerciais, tecnológicos ou financeiros, e com isso ganhar acesso à economia fiscal. Uma grande tarefa de levar o Brasil para a posição número um no mundo em produção e exportação agrícola. 

O quinto conjunto de iniciativas debatidas com os Governadores e os Ministros, tem a ver com a indústria na Amazônia. Não faz sentido tratar o tema industrial na Amazônia como um sacrilégio. Não há projeto econômico sem indústria e já há muita indústria na Amazônia. 

Na Amazônia com floresta, a indústria que temos tem quase nada a ver com a floresta. Na Zona Franca de Manaus, a indústria produz coisas como motocicletas, é uma relação minimalista com a floresta. Nós queremos indústrias que tenham uma relação maximalista coma  floresta, indústrias que transformem produtos madeireiros e não-madeireiros da floresta e que fabriquem tecnologia apropriada ao manejo sustentável de uma floresta tropical. 

Quase toda a tecnologia florestal disponível no mundo evoluiu para manejar florestas temperadas, que são muito mais homogêneas do que as florestas tropicais. Nós temos que criar essa tecnologia e, na Amazônia sem floresta, indústrias que transformem produtos agropecuários e minerais, para agregar valor. 

Nós temos, por exemplo, em muitas partes do País, uma atividade de mineração que agrega pouquíssimo valor, e a exportação de produtos minerais representa hoje 37,5% da nossa pauta de exportações. 

Nós estamos discutindo agora a seguinte conjectura: precisamos de incentivos para desenvolver essas indústrias, e a conjectura é que, para as indústrias florestais, os incentivos devam ser para estabelecê-las, enquanto que, para as indústrias agropecuárias e minerais na Amazônia sem floresta, os incentivos devem ser não para estabelecê-las, mas para empurrá-las a agregar mais valor. 

O sexto conjunto de iniciativas discutidas com os Governadores tem a ver com o transporte multimodal na Amazônia. Nós podemos e precisamos superar a nossa fixação histórica por transporte rodoviário e integrar os elementos rodoviários, ferroviário e aquaviário e, ao mesmo tempo, construir a ligação entre a Amazônia e o resto do mundo. 

O sétimo conjunto de iniciativas tem a ver com capacitação de recursos humanos. Sem gente capacitada as outras 6 séries de iniciativas não irão para frente. É claro que queremos formar quadros técnicos e científicos nas universidades da Amazônia, capazes de aproveitar esse vasto laboratório natural, que é o bioma amazônico. 

Mas a prioridade não é essa. É consertar o elo fraco do sistema escolar em todo o País, que é o ensino médio, e construir, a começar pela Amazônia, o novo modelo de escola média por iniciativa federal, em colaboração com Estados, uma escola média com uma fronteira aberta entre o ensino geral, porém de orientação analítica e capacitadora — nada de “decoreba” enciclopédica —, e o ensino técnico e profissional. Não queremos uma divisão rígida entre ensino geral e ensino técnico. Em primeiro lugar, não queremos porque entendemos que na evolução das economias contemporâneas o trabalhador cada vez mais precisa dominar um conjunto de capacitações práticas e conceituais genéricas. E, em segundo lugar, porque não queremos criar um contraste no Brasil entre o ensino de generalista para as elites e o ensino de especialista para as massas.

Aí estão enumerados os 7 conjuntos de iniciativas que definem um projeto para a Amazônia, que não seria exagerado chamar revolucionário. Essa é a grande revolução brasileira, hoje. E essas iniciativas terão que ser reforçadas pela defesa da Amazônia e pela reafirmação inequívoca e incondicional da nossa soberania na Amazônia.

Para dar força prática a essa reafirmação, nós temos de atender os 2 imperativos centrais de defesa da Amazônia, que são: primeiro, monitoramento; segundo, mobilidade. Poder monitorar, a partir do espaço e da terra, e poder mover as nossas forças rapidamente em direção a qualquer problema.

Srs. Deputados, a Amazônia é hoje a nossa grande fronteira não só da geografia, mas também da imaginação.

Da preservação, do desenvolvimento e da defesa da Amazônia resultará o engrandecimento do Brasil. (Palmas.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Sr. Ministro Mangabeira Unger a exposição.

Na continuidade dos trabalhos desta audiência pública, sugiro que, após ouvirmos 4 Deputados, passemos a palavra, para resposta, ao Sr. Ministro Mangabeira Unger.

Informo que uma nova lista de inscrição para debates está à disposição dos Parlamentares. Portanto, quem desejar interpelar o Sr. Ministro deverá registrar seu nome na lista.

Esclareço ao senhor expositor e aos Srs. Parlamentares que a reunião está sendo gravada para posterior transcrição e, por isso, solicito que durante suas exposições falem ao microfone.

Cada expositor terá o prazo de 3 minutos e o interpelado o tempo que achar necessário para responder, facultadas a réplica e a tréplica. Cada Parlamentar que se dirija ao Sr. Ministro terá o tempo de 3 minutos, tendo igual tempo o Sr. Ministro para resposta.

Os apartes e interpelações deverão ser feitos estritamente quanto ao assunto objeto da convocação, nos termos regimentais.

Concedo a palavra ao nobre Deputado Marcio Junqueira, do DEM, de Roraima.

O SR. DEPUTADO MARCIO JUNQUEIRA – Sra. Presidenta, Sr. Ministro Mangabeira Unger, Sras. e Srs. Deputados, primeiro, Sr. Ministro, quero agradecer e reconhecer a sua desenvoltura e o seu compromisso o qual tinha assumido na reunião passada de voltar, assim cumprindo aquilo que V.Exa.  tinha estabelecido. Por isso, agradecemos a V.Exa.

Serei breve, pois já tivemos oportunidades, em momentos diferentes, de falar sobre as questões. Volto a insistir que, pelo fato de a Amazônia representar metade deste País, pelo fato de a Amazônia representar o nosso maior bem no que diz respeito aos recursos hídricos, à biodiversidade. Insisto que temos que discutir de forma ampla, e vejo o senhor buscando este caminho. 

No entanto, entendo também que não podemos achar que somos, Deputado André de Paula, detentores do conhecimento para discutirmos sozinhos. Precisamos de auxílio, de apoio, de opiniões de brasileiros comprometidos com esta Nação. Vou sempre insistir, de brasileiros, pois o que vemos é que a condição da Amazônia chegou ao ponto que chegou em função da ausência do Estado e de pseudos amazônidas que se julgam detentores do conhecimento total. Não. A Amazônia se divide em várias e diferentes realidades. A Amazônia conta com biomas diferentes.

Eu vejo aqui muitas críticas, muitas acusações, mas não vejo ninguém falar, nem ouço que a BASF, que a VERBATIM, lá no Estado do Amazonas, têm resíduos químicos que estão sendo depositados em algum lugar. Mas isso é necessário, pelo que Manaus representa. 

Agora, vejo acusações levianas quando dizem que o meu Estado de Roraima foi, depois do Mato Grosso, o segundo Estado que mais desmatou. Ora, conheçam. Que fique registrado na Comissão que Roraima é o Estado da Federação, é o Estado da Amazônia que tem a condição única de plantar sem desmatar. Em Roraima nós não precisamos derrubar uma árvore sequer para plantar. E são realidades diferentes, como a realidade do Acre, do Amazonas, do Amapá, a realidade de Rondônia, do Pará. O que nós não podemos é ficar com infantilidade e com critérios para satisfazer pessoas que na verdade querem nos tirar a Amazônia. 

O Deputado Giovanni Queiroz colocava, na sua interpelação na reunião passada, o que representa o Pará na conjuntura nacional e, por que não dizer, mundial? Porque é muito fácil criticar quando não se sabe de onde vem um bife saboroso, um belo pedaço de carne, de proteína, do qual todos nós seres humanos — não há outro modo ainda, precisamos. Ele vem de um animal que precisou de pasto de fato. Agora, existem novas tecnologias que temos que discutir. Temos capacidade de discutir. 

Vejo que o Ministro Mangabeira Unger tem essa preocupação. Mas o que eu peço, Ministro, é que V.Exa. escute os amazônidas, que V.Exa. escute quem vive a realidade do dia a dia. Naturalmente, escutando nossos irmãos do Nordeste, do Centro-Oeste, do Sul. Não importa. O que importa é que brasileiros discutam o nosso maior bem, que é a Amazônia. 

Assim, termino a minha exposição. Não vou fazer nenhum questionamento neste momento. Sobre a regularização fundiária, quero inclusive parabenizar o senhor sobre a postura com relação ao INCRA, que, de fato, tem-se tornado um empecilho neste País, principalmente na região Amazônica, porque o INCRA não tem projeto nenhum, a não ser usar as superintendências de forma política para eleger candidatos a Governo, a Prefeito, a Deputado, à custa de uma instituição pública, assim como a FUNAI, como o IBAMA, que são os exageros da política.

Nós temos que ter maturidade, e entendo que estamos a caminho dela. 

Agradeço a paciência da Presidenta. 

Sr. Ministro, a Deputada Maria Helena gostaria de saber a sua opinião sobre o trabalho do INPE realizado na Amazônia. 

Muito obrigado, Sra. Presidenta.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado Marcio Junqueira. 

Passo a palavra ao Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, do PSDB de São Paulo.

O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME – Sra. Presidenta, Sras. e Srs. Deputados, Sr. Ministro, é um privilégio poder aqui compartilhar desse momento em que nós temos a prerrogativa de poder fazer algumas perguntas diretas, objetivas, para sabermos a sua opinião a respeito de alguns assuntos. 

A visão que nós temos do enfrentamento de questões ambientais é de que só se conseguem resultados eficientes se nós atuarmos ao mesmo tempo em 3 vertentes: legislação, investimentos públicos e privados e, terceiro, conscientização e gestão compartilhada. 

O terceiro item, conscientização, muitas vezes é esquecido, mas é importantíssimo. Se já tivéssemos a consciência, não só em São Paulo, nos Estados maiores consumidores de madeira, mas na Europa e nos Estados Unidos de que deve ser exigida a certificação, o rastreamento da madeira, e de que não se deveria comprar móveis cuja madeira adviesse de desmatamento da Amazônia, nós já teríamos um grande caminho andado. 

A segunda vertente, investimentos, está muito ligada ao que V.Exa. propõe, que é o Plano Amazônia Sustentável sob seu comando. São investimentos públicos claríssimos para ajudar na fiscalização, na criação de infra-estrutura adequada, investimentos em tecnologia e desenvolvimento de pesquisa para poder aproveitar melhor os produtos da madeira. Está claro. 

Mas há um terceiro ponto, que é a legislação, proposta por V.Exa., hoje, aqui no Parlamento brasileiro. Portanto, permita-me focar somente nesse ponto da legislação para ouvir a sua opinião a respeito do nosso papel. 

O Nicholas Stern, no seu relatório recente, disse que as mudanças climáticas constituem a mais grave falha de mercado. Portanto, uma distorção de mercado, o mercado falhou na história do capitalismo. E o mercado age implacavelmente, a todo momento, criando uma dinâmica. As forças de mercado vão selecionando os produtos mais baratos para produzir o melhor produto pelo menor preço. Em suma, para se fazer um bom negócio. 

A única forma de influir no mercado é por meio do Governo, que o faz por meio de investimentos e de leis. 

O Estado atua através das suas leis, do arcabouço jurídico, em 2 famílias. Uma é a família de leis de comando e controle; outra, a de leis de incentivos. Foi graças a essas 2 famílias que temos hoje o PROALCOOL, o álcool brasileiro. Na década de 70, houve uma dupla intervenção do Estado na área de comando e controle, com medidas compulsórias, obrigatórias para mistura de 20%, na época, de álcool à gasolina; e medidas de incentivos, brutais subsídios para diminuir o custo de produção do álcool, que era o dobro da gasolina. Quinze anos depois, as medidas de incentivos desapareceram. As medidas compulsórias continuaram criando esse mercado permanente que permitiu se instalar uma curva de aprendizagem, que fez com que o custo de produção do álcool caísse para mais da metade e hoje ele custe 40% a menos que o custo de 1 litro de gasolina. 

Objetivamente, as minhas perguntas são as seguintes. Na área de comando e controle, nós temos em votação, hoje — neste momento foi interrompida porque começou a votação em plenário — uma PEC que estende para crimes ambientais de devastação acima do percentual exigido de reserva legal as mesmas punições para o cultivo de psicotrópicos em áreas brasileiras. Ou seja, quem for pego, depois de um prazo, sem ter recuperado a reserva devastada, terá sua propriedade sujeita a uma expropriação sem pagamento. 

Queria ouvir a sua opinião a respeito. Esta está em votação e parece que o Governo está favorável. Imagino que seja favorável, porque depois serão discutidos os detalhes na comissão que vai ser formada. Por enquanto, está na Comissão de Constituição e Justiça. 

Sobre a área de incentivos, queria ouvir a sua opinião a respeito de 3 leis. Uma, a lei que cria, realmente, incentivos para a produção florestal, uma economia da floresta, como é a legislação de Costa Rica e outros países que dão brutais incentivos, isenções para quem trabalha com extrativismo. Não é só estabelecer preço mínimo, mas incentivos fiscais para que fique realmente interessante manter aquela floresta em pé como fonte de renda. 

Segunda pergunta: o Brasil não tem uma legislação que permita o patenteamento de invenções e descobertas a partir de seres vivos. Um médico brasileiro, em Ribeirão Preto, percebeu que, quando a jararaca mordia uma pessoa, a sua pressão arterial despencava, e imaginou que no veneno da jararaca houvesse um hipotensor. Isolou o princípio ativo e não pode patentear. A Pfizer o fez no exterior e criou o Captropil, vendido com o nome de Capoten, e nós ficamos a ver navios. 

Qual é a sua opinião a respeito de uma legislação que permita esse patenteamento para explorarmos o nosso patrimônio genético?

E, terceiro, nós temos uma legislação muito fraca a respeito de partição de benefícios — essa é uma discussão internacional. Estamos tendo dificuldades em fazer uma regulamentação da conversão da biodiversidade que foi votada também aqui na Rio 92. Em 1997, o Protocolo de Kyoto regulamentou a convenção de mudança do clima, mas a convenção de biodiversidade até hoje não foi regulamentada em nível internacional. Mas, em âmbito nacional, nós temos uma lei incompleta, que não estimula. Qual é a sua opinião a respeito de nós reformularmos esta lei para termos um instrumento que estimule o uso sustentável, legalizado, por empresas brasileiras para explorar essa riqueza imensa, que é o nosso patrimônio genético, como fármacos, cosméticos e outros produtos?

São essas as perguntas. 

Muito obrigado. É um prazer e uma satisfação tê-lo aqui conosco.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado. 

Passo a palavra ao Deputado Francisco Rodrigues, do DEM de Roraima. (Pausa.) Não se encontra presente. Repasso a palavra ao Deputado José Genoíno, do PT de São Paulo. (Pausa.). Também não se encontra presente. Passo a palavra ao Deputado Francisco Praciano, do PT do Amazonas. (Pausa.) Ausente. 

Com a palavra o Deputado Moreira Mendes, do PPS de Rondônia.

O SR. DEPUTADO MOREIRA MENDES – Sra. Presidenta, Sr. Ministro, estou aqui substituindo o Presidente Paulo, que precisou se ausentar, com muita honra. Quero dizer a V.Exa. que participei, na semana retrasada, do início da audiência pública e quero parabenizá-lo pela iniciativa de voltar a esta Casa para concluir aquilo que iniciamos naquela data. Eu, naquele dia, cheguei tarde — e isso aqui é uma coisa muito complicada, porque temos que correr da sala para a cozinha a fim de resolver o problema de estarmos em várias comissões ao mesmo tempo — e não ouvi todo o seu pronunciamento. Mas tive o cuidado de pedir as notas taquigráficas e li atentamente todo o seu pronunciamento daquele dia. E quero confessar a V.Exa., com muita alegria, que finalmente –– isso é uma avaliação pessoal –– eu encontro uma pessoa que ocupa uma posição de destaque na Administração Pública Federal que verdadeiramente se preocupou com a questão da Amazônia.

Falar da Amazônia é muito romântico. Até as socialites do Rio de Janeiro, no chá das 17h, resolvem um dia fundar uma ONG para cuidar de uma árvore da Amazônia sem ter a menor noção do que seja aquilo, da sua realidade, quem vive lá, qual o nosso problema.

Quero dizer ao senhor que eu represento o Estado de Rondônia. Sou paulista, paulistano, e resido na Amazônia com muito orgulho há 36 anos. Sou testemunha viva de tudo o que aconteceu, sobretudo no meu Estado, Rondônia, que foi um exemplo de colonização para o Brasil, do INCRA, que fez uma colonização exemplar e onde se privilegiou a pequena propriedade. Todas essas pessoas do Brasil inteiro estão em Rondônia, de norte a sul, de leste a oeste. Foram para lá ocupar terra, plantar, produzir e, agora, são escorraçados, ou pelo menos os desinformados, os que não conhecem a nossa realidade, os que tratam a Amazônia com romantismo e imaginam que fazendo leis cada vez mais rígidas… Acabou de citar o Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, por quem tenho o maior respeito, uma proposta de emenda constitucional de sua autoria que discutimos há pouco na CCJ, que vai no mesmo caminho.

Uso uma expressão popular que diz o seguinte: não é na teia que vamos conseguir resolver o problema do desmatamento na Amazônia; não é por aí. Enquanto o Governo, as autoridades e as ONGs não entenderem que necessariamente é preciso conversar com os 25 milhões de brasileiros que vivem lá, não vamos conseguir avançar em nada.

É preciso valorizar a floresta em pé; é preciso pagar ao produtor brasileiro, que reside lá para que ele seja um fiscal da Amazônia. Tudo isso está contido nas suas palavras.

Por isso quero muito mais do que fazer perguntas… V.Exa. foi tão brilhante no seu posicionamento, que é irretocável. Só tenho dúvidas com esse rancor que ainda existe, com esse ranço que há das pessoas que não compreendem a Amazônia, se o Governo aqui representado pelo senhor vai conseguir implantar tudo aquilo que o senhor está propondo, que é o único caminho: valorizar a floresta, valorizar o homem, educar o homem, aplicar tecnologias. Não há outra forma.

Quem imagina que vai conseguir transformar esses 22 milhões, esses 25 milhões de brasileiros, na sua palavra, em aborígenes, está redondamente enganado porque isso não vai acontecer. Temos, sim, a responsabilidade de preservar.

Sou um modesto proprietário rural. Quero dizer a V.Exa. que, quando fui para lá, a primeira coisa que comprei foi uma propriedade rural. Comprei e paguei com meu dinheiro, não achei na rua, não ganhei de ninguém. Então, não é legítimo que alguém venha agora dizer que eu não posso fazer daquilo que eu comprei, paguei, o que eu quero. Mas quando eu comprei, tínhamos um limite de 50%, que foi preservado. Hoje, tenho a consciência, e quero dizer a V.Exa. que, se fosse começar hoje, não derrubaria nem os 50% que derrubei. Isso é uma consciência pessoal minha que foi evoluindo.

Agora, não podemos simplesmente esquecer essa realidade, tratar como se nada disso acontecesse.

Estive, na semana passada, no sul do meu Estado, na região do CONESUL, região de campo, de cerrado. Temos um erro, e V.Exa. o trata com muita propriedade: a Amazônia legal é uma coisa, e o bioma amazônico é outra coisa completamente diferente, e por isso não pode ser tratado igual. Há um erro, há um equívoco nessa questão que está na Medida Provisória nº 2.166.

Não quero me alongar muito, Ministro. Apenas digo que estou muito satisfeito em ouvi-lo. Aliás, eu não ouvi; eu li, mas, quando cheguei, aqui percebi que o senhor repetiu muito daquilo que disse naquele dia.

Ontem à noite, acompanhando o Governo do meu Estado, estive numa visita ao Ministro do Meio Ambiente.

Ontem à noite, acompanhando o Governador do meu Estado, estive numa visita ao Ministro do Meio Ambiente. E quero aqui publicamente dizer que fiquei impressionado com o posicionamento do Ministro. Imaginava uma coisa e encontrei outra. Imaginava um radical que não entendesse o nosso problema, mas percebo que pelo menos, embora tenha o discurso do radical de prender o boi voador, de botar a Polícia para prender, para bater, na prática, na nossa frente, tem um discurso mais centrado, procura o diálogo, quer promover o entendimento, no sentido de encontrar soluções práticas para a questão da Amazônia. Lá, no Pará, parece que ele já fez o encaminhamento, no sentido de encontrar um caminho.

Ministro, quero que V.Exa. continue com essa bandeira. Sou de um partido de oposição, mas estou aqui dizendo para V.Exa. não desempunhar essa bandeira. O caminho é este. Tudo o que V.Exa. disse é o que há. Temos de promover a regularização fundiária, o zoneamento. Quero dizer a V.Exa. que o meu Estado foi o primeiro Estado brasileiro a ter zoneamento sócioecológico e econômico. Ali, está tudo definido o que pode, onde pode, como pode e quando pode ser feito. É valorizar a floresta em pé.

Agora, não podemos com esse discurso rancoroso de não se comprar a soja da Amazônia, de não se comprar o boi da Amazônia, de não se comprar a madeira da Amazônia. Isso é um absurdo, mas é o que ouvimos. Na CCJ não ouvi outra coisa: não à soja da Amazônia, não ao boi da Amazônia, não à madeira da Amazônia, não ao desenvolvimento da Amazônia. E como fica o povo que vive lá, sem alternativa alguma? 

Todos são bons para propor alguma coisa, mas não ouvi um ainda que propusesse: nós vamos tirar desse lado, mas vamos dar desse lado. E V.Exa. está com esse discurso, reconhece que há um exagero, que precisamos realmente controlar a devastação e a questão do meio ambiente, mas por outro lado reconhece que é preciso estender a mão aos 25 milhões de brasileiros que estão lá.

Essas são as minhas considerações ao Ministro e parabéns pelas suas palavras.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Solicito ao Deputado Moreira Mendes que assuma a Presidência dos trabalhos, a fim de que eu possa participar dos debates.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Presidente, peço a palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Pela ordem. V.Exa. tem a palavra.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Apenas para encaminhamento, quero sugerir que ao falarem 3 ou 4 Deputados, pudéssemos ouvir o Ministro, para que a coisa não se esgotasse na palavra dos Deputados e se perdesse a lógica do raciocínio daqueles que primeiro falaram. Isso ocorreu da vez anterior, e não podemos ouvir do Ministro as ponderações ou as suas considerações a respeito daquilo que suscitávamos durante o debate.

Portanto, entendo que o Ministro poderia agora fazer alguma consideração, se S.Exa. entender que deva fazê-lo sobre as colocações dos demais companheiros e prosseguir. Ouvimos mais 4 e novamente devolvíamos a palavra ao Ministro para suas considerações.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Ilustre Deputado, quero lhe informar que, assim que cheguei a este plenário, ouvi a Deputada Janete Capiberibe já estabelecer esse critério: depois que 4 Parlamentares usassem da palavra, o Ministro responderia. E ela é a quarta.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – E eu distraído não devo ter ouvido, porque da vez anterior falamos 8.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Então, vamos ouvir agora a Deputada Janete Capiberibe, a quem passo a palavra. Em seguida, volto a Presidência a S.Sª para ouvir as respostas do Ministro.

A SRA. DEPUTADA JANETE CAPIBERIBE – Sr. Presidente, Deputado Moreira Mendes, Sr. Ministro, Sras. e Srs. Parlamentares, senhores e senhoras presentes na audiência pública que ora acontece.

Quero rapidamente deixar uma pergunta a o Sr. Ministro. Segundo sua exposição, o PAS, Plano Amazônia Sustentável, está pensado para todas as suas etapas, do início da implantação, considerando todos os aspectos, até o final, segundo o plano. Quer dizer, aliar desenvolvimento com sustentabilidade social, ambiental, econômica.

Sabemos que cerca de 1 bilhão de reais existem, se é que existem, para a implantação do PAS. Quero tirar essa dúvida. Pergunto: que obras estão previstas pelo Governo Federal para serem executadas com esse recurso? Que instituição federal será a executora desse orçamento?

Obrigada.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Devolvo a Presidência à Deputada Janete Capiberibe.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Repasso a palavra ao Líder do PR, de Roraima, Deputado Luciano Castro. O Deputado é o último inscrito para este primeiro bloco de perguntas. Em seguida, o Ministro fará suas explicações.

Com a palavra o Deputado Luciano Castro.

O SR. DEPUTADO LUCIANO CASTRO – Sra. Presidenta, Sras. e Srs. Deputados, saúdo o nosso Ministro e digo da nossa honra em recebê-lo. Quero externar a V.Exa. algumas preocupações.

Primeiramente, V.Exa. coloca com idéias bastante ajustadas todo esse novo planejamento e a concepção do novo modelo de desenvolvimento da Amazônia. Agrada-nos bastante, e acho que aqui no plenário não há um único Deputado que não se agrade em ouvir esse planejamento e as idéias de V.Exa.

A pergunta primeira que se faz é a seguinte: até onde o Governo vai estar comprometido com isso? Quando V.Exa. fala em estabelecer para a Amazônia, por exemplo, um pólo em desenvolvimento industrial diferenciado –– e até faz referência à Zona Franca de Manaus ––, não há nenhum ajuste com a floresta num pólo eletroeletrônico. Vamos criar um modelo industrial que possa se utilizar dos benefícios da floresta, por exemplo, biocosméticos, indústria madeireira. Qual o compromisso do Governo até aí? Quais as linhas de financiamento que serão obtidas para a implementação de um programa industrial efetivamente competitivo dentro da Amazônia?

Uma outra questão que V.Exa. apresenta é a questão dos cerrados, muito próximos ao Mato Grosso, mas sabe também que em Roraima, na região central do Estado, temos uma região de campos, que difere até um pouco da Amazônia extensiva, que sai do Mato Grosso para cima.

Incomoda-me muito a posição agressiva do Ministro do Meio Ambiente referente ao Governador Blairo Maggi. O Governador Blairo Maggi é um homem determinado, produtor de altíssimo nível, um homem que contribui decisivamente para a pauta de exportação do País. Estou falando como produtor, não estou falando nem como Governador. Todas as mazelas de desmatamentos são contabilizados nas costas do Governador Blairo Maggi.

O Governo — e eu sou Líder da base do Governo — tem um modelo ocupacional da Amazônia –– e V.Exa. descreveu bem isso ––, de assentamento na Amazônia que são desvastadores. E V.Exa. foi claro quando disse: não dá para fazer. Pensar em desenvolvimento, em desenvolvimento sustentável, sem recursos e sem estabelecer um critério de ocupação, inclusive da regularização fundiária.

V.Exa. começou a colocar isso como uma prioridade. Como o zoneamento econômico, ecológico de toda a região, para que a gente possa definir exatamente o que queremos.

Por exemplo, um modelo de assentamento. Colocam-se assentados na região sem a mínima condição. Sabe o que eles fazem? Eles a queimam, porque é a sua forma de sobrevivência, é mais barato. Ele queima porque não tem tostão algum para isso.

Não há, por parte do Governo, por exemplo, um programa de mecanização diária para a produção de alimentos na áreas que já estão desmatadas e que podem ser altamente produtivas. Isso não acontece por parte do Governo? Não há dinheiro definido, não há um programa. Como V.Exa. disse, não há assistência técnica. O INCRA faz essas ocupações de forma desordenada e, depois, larga a conta com os Estados, que são os que ficam mantendo todo esse grupo de assentados que vivem miseravelmente e que nunca sairão do grau de pobreza, tentando sobreviver a qualquer custo. É desse modelo diferenciado da Amazônia que precisamos. 

Acho que V.Exa., na sua proposta, tenta mudar isso. O nível de comprometimento do Governo precisa estar claro na proposta, com ações concretas. Por outro lado, da outra vez que V.Exa. esteve na Comissão de Relações Exteriores, fiz-lhe uma pergunta e, como eram muitas, V.Exa. não me esclareceu. Estou neste Congresso há 18 anos e sempre falou-se muito da internacionalização da Amazônia, de interesses escusos na nossa área, e isso era muito utopia, era discurso de Deputado. Era discurso de Deputado! Só que, no início do Governo Lula, começamos a falar muito a respeito e não deram muita importância ao assunto. 

Mas, agora, o tom mudou. O Presidente da República começou a mandar recado, dizendo que a Amazônia brasileira é dos brasileiros. Repetidas vezes ele tem falado isso. O Presidente da República mandou atuar de forma rigorosa em cima das ONG’s da Amazônia, determinando que se verificasse essa compra de áreas por estrangeiros na Amazônia.

A pergunta é a seguinte, Ministro: acendeu a luz vermelha no Governo, que descobriu algo que já estamos falando há muito tempo, ou seja, de que os interesses sobre a Amazônia não estão… Não vamos ter, na Amazônia, uma invasão armada, não! Vamos ter na Amazônia uma invasão econômica, de posse e, quando abrirmos os olhos, já não teremos mais controle sobre a área. Assim, serão discutidos nos tribunais internacionais os interesses econômicos daqueles que estão em busca de tomar ou de controlar esse pedaço do Brasil.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Concedo a palavra ao Sr. Ministro, para responder a esse primeiro bloco do debate. Em seguida, continuaremos com os novos inscritos — 4 para o próximo bloco.

Informo ainda que os próximos oradores são os Deputados Leonardo Monteiro, Sergio Petecão, V.Exa., Ricardo Tripoli, Wellington Fagundes, Neudo Campos, Giovanni Queiroz, Homero Pereira, José Geraldo, do Pará, e Elcione Barbalho, do PMDB do Pará. Também está conosco a Deputada Marinha Raupp, que não estava presente no momento em que anunciamos.

Com a palavra o Sr. Ministro.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muitas das observações feitas pelos Srs. Deputados são de natureza geral, as observações dos Deputados Márcio Junqueira e Moreira Mendes, de um lado, e dos Deputados Mendes Thame e Luciano Castro de outro. 

Devo dizer que concordo com todas as observações gerais que foram feitas, não discordo de nenhuma delas. Muitas vezes, nesse início de debate nacional a respeito da Amazônia, encontro-me na seguinte situação peculiar: meu interlocutor discorda de mim, mas eu concordo com ele. Atribuo essa circunstância peculiar à tendência de enfatizar um aspecto da problemática, seja desenvolvimentista, preservacionista ou de defesa. Se há ou não contradição entre esses objetivos, é algo que só poderemos determinar se levarmos a discussão a um plano mais concreto. Enquanto permanecermos nesse plano das abstrações doutrinárias ou da enumeração de preocupações, estaremos apenas reafirmando valores legítimos, mas não estaremos resolvendo o problema estratégico do que fazer amanhã.

Então, aprecio todas essas discussões, mas confesso uma preocupação minha: que esse Projeto Amazônia é para nós, brasileiros de nossa geração, uma oportunidade não só de transformação nacional como de união nacional, porque os problemas e as soluções na Amazônia não são encontráveis no mapa das ideologias tradicionais. Exigem inovações institucionais. Então, nós não deveríamos abordar essa problemática como uma oportunidade de reafirmar, de maneira mecânica, os contrastes ideológicos herdados. Seria desperdiçar a grande oportunidade inventiva e unificadora que temos aqui.

Então, se tenho uma discordância em relação a algumas das observações, é muito menos uma discordância quanto ao conteúdo do que uma discordância quanto ao tom. Eu gostaria de mudar o tom do nosso debate, mas eu não sei como fazê-lo. Eu gostaria que o tom fosse de desarmamento espiritual, que nós nos uníssemos na procura de um objetivo comum que nós temos e que não sabemos ainda como realizar.

Vou ser muito direto sobre isso. Criou-se no País a impressão de haver um combate entre desenvolvimentistas e ambientalistas. E há um combate entre alguns extremados. Mas o nosso problema não é esse, o nosso problema não é o combate. O nosso problema é a confusão. É que nós convergimos sobre um objetivo que ainda não sabemos na prática como efetivar. Estamos tentando descobrir. Então, a atitude propícia a essa descoberta é uma atitude de abertura, de falta de preconceito, de dúvida, e não de polêmica. Esse é, portanto, o meu registro.

Quantos às propostas específicas citadas pelo Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, em geral me parecem boas, mas eu não vou emitir uma opinião sobre esta ou aquela proposta de lei sem estudá-la muito, sem passar muitas horas estudando, consultando, ouvindo e discutindo. Não vou ter reações instantâneas sobre nada, porque, se eu fizesse isso, eu estaria traindo a minha função, que é ajudar a coordenar, a unir, a suscitar a descoberta de um caminho.

Se tenho uma observação em relação às propostas citadas pelo Deputado Antonio Carlos Mendes Thame é que, no passado, demos ênfase demais ao negativo e ênfase de menos ao positivo. Se tivermos um ambientalismo carente de agenda econômica construtiva, acabaremos por ter uma concepção do problema do meio ambiente como a concepção que tinha o Presidente Washington Luís da questão social: que era um caso de polícia. Mas não é um caso de polícia, embora a polícia possa ser pontualmente necessária. É um caso de imaginação e de construção institucional, de resolução de problema. Então, em geral, proponho menos ênfase nas punições e mais ênfase nas construções e nos incentivos.

Em relação ao comentário da Deputada Janete Capiberibe, quero corrigir um mal-entendido. O PAS não está definido assim, como uma planilha do começo ao fim. Não é isso. O PAS é um conjunto de diretrizes e de compromissos. O caminho, nós agora vamos construir, e vamos construir coletivamente.

Fico perplexo quando me perguntam o que vai acontecer daqui a 2 anos e como vai ser resolvido isso, resolvido aquilo, como se eu fosse um pequeno ditador para decidir e revelar o conteúdo desse plano secreto. Não é assim. É uma obra coletiva em construção. E estou tentando acelerar desde já o processo pela definição dos 7 conjuntos de iniciativas que enumerei. O método subjacente é o método de tratar do longo prazo a curto prazo, quer dizer, encontrar ações que possam começar já e que sinalizem um caminho.

Aí, surge um problema transversal, por assim dizer, que não abordei nos meus comentários iniciais e que é o seguinte: se tentarmos deslanchar todas essas iniciativas que descrevi, simultaneamente, em todo lugar na Amazônia, é muito grande o risco de não conseguirmos, no tempo politicamente disponível, alcançar o grau de densidade e de coordenação dessas iniciativas, necessário, primeiro, para surtir o efeito transformador e, segundo, para desempenhar a função sinalizadora, de sinalizar o caminho que queremos seguir.

Por isso, propus, em Belém, aos Governadores e ao Presidente que identificássemos em toda a Amazônia algumas microrregiões e que procurássemos, na primeira etapa, concentrar e coordenar as iniciativas naquelas unidades territoriais. Dessa forma, correndo contra o tempo, contra o relógio, temos uma chance maior de alcançar o patamar crítico de densidade das iniciativas, para que possam fazer diferença e mostrar o caminho. Esse é um princípio metodológico muito importante. Pedi aos Governadores que nos próximos dias formalizassem as suas propostas iniciais de quais microrregiões em seu Estado devem ser candidatas a esse papel, o papel de servir de terreno privilegiado desse experimentalismo institucional que nos propomos a fazer.

Em relação à indagação do Deputado Luciano Castro sobre o modelo industrial, devo dizer que precisamos de um grande avanço industrial na Amazônia também: como eu disse, na Amazônia florestada, indústrias localizadas nas cidades e nas periferias urbanas capazes de transformar produtos florestais e de fabricar tecnologia florestal; na Amazônia sem floresta, indústrias capazes de elevar o nível de agregação de valor daquela economia — agregação de valor na transformação dos produtos minerais e na transformação dos produtos agropecuários.

A idéia principal, por enquanto, não é investimento direto do Estado nessas indústrias, porque não seriam indústrias estatais. A idéia são os incentivos, como a Zona Franca é um sistema de incentivos. Aí surge a questão: a que devem ser dirigidos os incentivos? E aí é que vem aquela conjectura que citei, que há uma distinção a fazer. As indústrias florestais são uma novidade. Então, a nossa idéia, provisoriamente, é que os incentivos para as indústrias florestais devem ser para o seu estabelecimento, para instalá-las. Porque, sem incentivos, elas não serão instaladas. Mas, para as indústrias de transformação agropecuária e mineral, que seriam parte de cadeias produtivas de setores já organizados da economia, faz mais sentido dirigir os incentivos não para a instalação das indústrias, mas para subir a escala de agregação de valor. O que queremos é ter uma intensificação de valor na Amazônia sem floresta, é essa a idéia.

A internacionalização da Amazônia é uma preocupação agora compartilhada em todo o Governo e em todo o País. Eu não sei datar, Sr. Deputado, o momento em que acendeu a luz vermelha, eu não sei se houve um momento. O que posso dizer é que todos estamos preocupados com isso e compreendemos que temos de tomar um conjunto de medidas — medidas emergenciais e acauteladoras, de um lado, e medidas estruturais de outro.

As medidas emergenciais e acauteladoras têm a ver com uma possível revisão das nossas leis. Elas talvez sejam excessivamente permissivas em relação à penetração da Amazônia por interesses estrangeiros. E nós estamos estudando isso, o Governo está estudando isso e está considerando uma série de opções. É uma preocupação muito viva na consciência do Governo, assim como na consciência de todo o País. As medidas estruturais têm a ver com o próprio projeto de desenvolvimento econômico, já que uma área economicamente vazia é praticamente indefensável, e com o projeto de defesa, no qual as nossas grandes preocupações são o binômio que citei, de monitoramento e mobilidade.

Agora, Srs. Deputados, quero externar uma preocupação processual que tenho, por conta do grande valor que dou a essa colaboração com os senhores. Como eu disse no início da minha reflexão preliminar, estarei sempre disponível. Se os senhores me quiserem aqui toda semana, eu virei toda semana, mas vou acabar entediando esse grupo. Tenho a impressão, talvez por inexperiência minha, que esse formato, embora útil, não é suficiente para o objetivo de colaboração que desejo, porque é muito formal. Então, há esse rito de eu fazer uma palestra, os senhores fazerem intervenções em 2 minutos… Não é uma relação de trabalho. Serve para desenvolver idéias e para compreendermos onde estamos nas nossas concepções. Eu gostaria de construir uma relação de trabalho, mas não sei como fazer isso. Uma idéia que tenho é estabelecermos um pequeno grupo de trabalho de Parlamentares em relação a cada um daqueles 7 temas, daqueles 7 conjuntos de iniciativas que citei. E que os senhores me permitissem de fato trabalhar com esses 7 pequenos grupos e, com isso, introduzir o Congresso no íntimo da formulação do desdobramento do Plano Amazônia Sustentável. Não sei, para ser franco, se isso viola alguma regra do Congresso ou alguma norma de cortesia na separação dos poderes, mas me confesso ansioso para encontrar um procedimento que nos permita institucionalizar uma relação de trabalho. Então, eu gostaria de ouvir dos senhores propostas e de saber se há alguma maneira de viabilizar a sugestão que dei agora.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Obrigada, Sr. Ministro. 

Vamos debater esse assunto na Comissão da Amazônia. Hoje à tarde, às 14h, teremos reunião deliberativa, quando poderemos levar à consideração das Sras. e dos Srs. Deputados da Comissão a sua proposição. V.Exa. tomará conhecimento da resposta imediatamente.

As audiências públicas ocorrem segundo o Regimento Interno da Câmara Federal. Esse formato, não podemos modificá-lo. No entanto, podemos debater, sim, a criação de um grupo de trabalho das Comissões da Amazônia e do Meio Ambiente para debatermos com V.Exa. esses 7 itens enfatizados aqui para o início da implantação do PAEs.

Passo a palavra ao Deputado Sergio Petecão, do PMN do Acre.

O SR. DEPUTADO SERGIO PETECÃO – Cumprimento a Sra. Presidenta, Deputada Janete Capiberibe, o Deputado Moreira Mendes e o Ministro Mangabeira Unger. 

Na verdade, Sr. Ministro, vou ser bem objetivo, até para facilitar as suas respostas. 

Todos sabemos que se tem debatido muito a respeito do plantio de cana-de-açúcar na Amazônia. Nós, no Acre, temos uma pequena experiência. De certa forma, criou-se uma expectativa na população do Estado e do Município de Capixaba, porque temos no Acre o grande problema do desemprego. Esse empreendimento está parado em razão do entendimento de alguns setores do Governo Federal de que não se pode plantar cana-de-açúcar na Amazônia. Estou falando nas áreas degradadas e não em derrubar um palmo de floresta. Refiro-me às áreas que já estão totalmente devastadas. 

Quero saber qual o seu entendimento a esse respeito e qual a política do Governo Federal, de concreto, no que diz respeito à plantação de cana-de-açúcar na região amazônica, em especial no Estado do Acre, o meu Estado.

Realizamos, nesta semana, um seminário em Rio Branco, no qual contamos com a participação de vários Parlamentares. Vale registrar que o Deputado Moreira Mendes nos deu o prazer de participar do seminário, assim como alguns Parlamentares desta Casa. O evento foi realizado mediante parceira firmada entre a Comissão da Amazônia e o SINDRECEITA. Na ocasião, debatemos a integração entre Brasil e Peru. Todos sabemos que temos ali a BR-317, que faz essa ligação. Criou-se uma perspectiva muito grande, não só no nosso Estado, como nos Estados de Rondônia e Mato Grosso, de mantermos uma relação com o país vizinho, o Peru, e conseqüentemente chegarmos ao Oceano Pacifico por meio dessa estrada.

 Todavia, preocupa-me o fato de que foram investidos milhões e milhões de reais por conta do Governo brasileiro e do Governo peruano, tendo em vista que a parte peruana não foi concluída, mas há previsões no sentido da possibilidade de ser concluída até o ano de 2010. Quero saber quais são as estratégias, por parte do Governo Federal, de investimento nessa região, se é que o Governo brasileiro tem interesse nessa saída do Brasil com o Peru. O meu medo é que essa estrada se transforme num mero corredor de tráfico de drogas. V.Exa. sabe que ela também faz ligação com o Peru e a Bolívia. E se não tivermos uma política de desenvolvimento para aquela região, poderemos ter uma estrada que vai ligar nada a coisa alguma. Portanto, quero saber se o Governo Federal tem interesse no desenvolvimento daquela região e também na plantação de cana-de-açúcar na Amazônia, em especial no Estado do Acre.

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Muito obrigado, Deputado Sergio Petecão.

Passo a palavra ao Deputado Ricardo Tripoli, do PSDB de São Paulo.

O SR. DEPUTADO RICARDO TRIPOLI – Sra. Presidenta, estimada Deputada Janete Capiberibe, estimado amigo Deputado Moreira Mendes, Sr. Ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, Mangabeira Unger, vou na contramão de boa parte do que foi dito aqui. 

A sua abordagem, Sr. Ministro, foi muito interessante no sentido de que existe um discurso que há muitos anos se decanta do desenvolvimento acoplado à sustentabilidade, mas há muita pouca prática no sentido de convergir essas 2 intenções. 

Eu, em 26 anos de vida pública, já tive oportunidade de apreciar centenas de diagnósticos no que diz respeito à Amazônia. De que maneira deveríamos utilizar da melhor forma esse grande projeto que entendo como projeto estratégico para o Brasil, que é a nossa Amazônia, inclusive a própria biodiversidade. 

Serei muito objetivo nas minhas manifestações. A primeira delas é quanto à questão do monitoramento do desmatamento na Amazônia, feito pelo INPE, que tem sido criticado de forma injusta tanto pelo Ministro da Agricultura quanto pelo Governador do Mato Grosso Blairo Maggi. Vimos que há um descompasso do pronunciamento do Governador. No dia em que ele vai à televisão e diz que os índices de desmatamento no seu Estado têm diminuído — entendo que, quando ele fala em desmatamento, não está acoplando a queimadas de florestas, deve utilizar dois parâmetros de avaliação —, sai no jornal que o Brasil perde o Estado do Rio de Janeiro em termos de desmatamento e queimadas. A meu ver, o INPE, para reafirmar a sua importância, no que diz respeito a esse monitoramento, é uma instituição não só de reconhecimento nacional, como internacional. 

A segunda questão, Sr. Ministro, é sobre a pesquisa científica. Recordo-me que, em 1992, quando participei da Rio 92, nos 2 fóruns, tanto das governamentais, quanto das não-governamentais, no Aterro do Flamengo e no Centro, onde foram realizadas as governamentais, um grupo de alemães difundia, naquela época, que cerca de 18 mil espécies ainda não estavam identificadas na floresta amazônica, um dos maiores berços da biodiversidade de todo o Planeta, e que nós poderíamos estar perdendo muito. A meu ver, o mundo acadêmico mostra que há uma grande oportunidade de o Brasil crescer na exploração científica desses produtos ainda não identificados. Estamos ainda na época do domínio de Dom João VI exportando café em  saca para o mundo e importando o sachê de café solúvel. A mesma coisa acontece com a Amazônia: não agregamos valor aos nossos produtos. 

A terceira questão é sobre os subsídios. A fala de V.Exa. foi muito bem colocada, mas há necessidade de um direcionamento de políticas públicas. Num mundo capitalista, sem recursos e sem dinheiro, não há a mínima condição de avançarmos nem na questão do desenvolvimento nem na questão da sustentabilidade. 

No dia em que a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o Ministro Reinhold Stephanes estiveram aqui, eu formulei uma pergunta para eles, porque, naquele mesmo dia, o jornal O Estado de S. Paulo publicava que o BNDES estaria financiando o empreendimento da Vale do Rio Doce na ordem de 7 bilhões de reais. Perguntei aos 2 Ministros quando eles tinham recebido um aporte dessa dimensão. 

Portanto, se há interesse de direcionar políticas públicas estratégicas para a Amazônia, há necessidade de um investimento altíssimo, em razão da importância que tem estrategicamente a Amazônia para todos nós, sejam os ruralistas, sejam os ambientalistas. Estou tentando convergir na linha de idéias da exposição de V.Exa. 

A única sugestão que vou deixar aqui de tudo que consegui aprender até hoje, embora eu imagine que tenha muita coisa ainda para aprender com o mundo acadêmico, científico e político, é a seguinte: por que não pegamos essas regiões que já foram desmatadas no Sudeste e Sul do País e não fazemos um projeto de subsídios ou de financiamento a custo baixo, a fim de que não haja investimento barato na queimada e derrubada da floresta amazônica e dê tempo ainda de pensarmos estrategicamente num desenvolvimento correto para o setor amazônico? 

Entendo que o problema crucial que V.Exa. vai enfrentar é a questão econômica e financeira para que haja um direcionamento de políticas públicas que realmente possam ser viáveis e possamos obviamente colher frutos desse grande projeto amazônico.

Se V.Exa. pegar o mapa do Brasil, verificará que nas Regiões Sul e Sudeste — estou colocando essas 2 áreas estrategicamente — existem muitas áreas desmatadas já desocupadas. Essas áreas poderiam ser ocupadas pela agricultura, pelo setor do agronegócio. Por que elas não são ocupadas? Porque são áreas caras, as terras custam muito nessas regiões. Por que não invertemos o processo? Nós atraímos o setor do agronegócio para essas áreas, subsidiados pelo Governo, o que é normal no mundo inteiro. Só no Brasil, quando se fala em subsídio, todo mundo corre. Subsidiemos e a região da floresta amazônica se manterá não diria intacta, mas dentro de um novo modelo de desenvolvimento. Estamos ainda com uma cultura arcaica, ultrapassada. Entendo que isso justificaria a possibilidade de termos na mesma mesa ambientalistas e ruralistas e, quem sabe, o início da solução do problema.

Muito obrigado, Sr. Ministro, Deputada Janete Capiberibe e Deputado Moreira Mendes.

 A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado Ricardo Tripoli a participação.

Passo a palavra ao Deputado Wellington Fagundes, do PR do Mato Grosso.

O SR. DEPUTADO WELLINGTON FAGUNDES – Saúdo a Sra. Presidenta, Deputada Janete Capiberibe, o Deputado Moreira Mendes, proponente desta audiência pública, e o Ministro Mangabeira Unger. 

Inicialmente, Ministro, eu gostaria de parabenizá-lo porque eu senti que V.Exa. é uma das primeiras pessoas que está procurando entender a Amazônia para dela falar. O grande problema hoje no mundo e no Brasil é que as pessoas querem falar da Amazônia sem conhecê-la. Eu sou filho de um nordestino que foi da Bahia para Mato Grosso a pé. Sou nascido no Mato Grosso e digo a V.Exa. que não conheço a Amazônia.

O Estado do Mato Grosso tem uma situação diferenciada — daí a importância de saber a diferenciação dos ecossistemas e principalmente a colonização de cada Estado. No meu Estado, por exemplo, temos 3 ecossistemas: o Cerrado, o Pantanal, que é uma região extremamente frágil, mas não se está discutindo o Pantanal Mato-grossense. Na Flórida, gasta-se bilhões para tentar recuperar aquilo que destruíram do Parque Everglades. Se não fizermos investimentos na área de saneamento nas cabeceiras, vamos destruir o Pantanal. Portanto, precisamos discutir o Pantanal, que é uma das maiores reservas, um dos maiores biomas do mundo. Temos também a questão da Amazônia. Hoje, o Mato Grosso está sendo a vedete, mas as pessoas não sabem as diferenciações entre o Cerrado, o Pantanal e a Amazônia.

Deputado Ricardo Tripoli, quero dizer a V.Exa. que sou um ruralista, mas também sou um ambientalista. Não vejo diferenciação entre os 2 setores. É perfeitamente possível ser um grande ruralista, sendo um grande ambientalista. Entendo que não podemos transformar a situação do campo como ideológica. Aliás, no Brasil, é muito difícil diferenciar com o pluripartidarismo no qual vivemos hoje.

Acredito, Ministro, que o grande desafio é discutir realmente o processo de financiamento da preservação da Amazônia. É importante dizer por que o Amazonas hoje tem 97% do seu território ainda intacto. Primeiro, a colonização daquela região é totalmente diferente da do Mato Grosso. Para desbravar o Mato Grosso foram chamados brasileiros de todos os recantos do País. E quem foi para lá foi com a cultura de “abrir”, porque se você não “abrisse” não teria a posse. Então, desde o pequeno até o grande, e cada um na sua época, todos chegaram lá com esse desafio. 

No início, eram as roças de toco, plantadas principalmente pelos nordestinos, mineiros, baianos, paulistas e outros tantos. Depois, vieram os sulistas para “abrir” o cerrado, que não valia nada. Nós, de origem nordestina, dizemos o seguinte: “Essa terra só serve para criar calango; não tem nada o que produzir.” Mas vieram os sulistas, que fizeram a abertura, fizeram pesquisas por conta própria, muitos deles falindo; e hoje nós temos um Estado com uma produção invejável, apesar de todos os desafios. 

Para se ter uma idéia, até há pouco tempo éramos o maior produtor de algodão. Mas essa produção foi dizimada. Eis que um programa do Governo do Estado incentivou novamente a cultura do algodão e, de repente, em 3 anos, voltamos a ser o maior produtor de algodão, respondendo por 54% da produção. 

Então, Ministro, V.Exa. falou sobre os 7 programas que colocou como revolucionários, e acredito que, realmente, se nós conseguirmos transformar isso… E, quando digo nós, é porque V.Exa. não pode estar sozinho. A sociedade tem que estar com V.Exa., com essa proposta que V.Exa. fez aqui para aproximar-se mais do Congresso. Gostaria que o Deputado Homero falasse um pouco melhor. Mas é importante também que nos juntemos nesse fórum de trabalho. Talvez aí a sociedade que lá vive organizada… Porque temos entidades hoje extremamente desorganizadas. V.Exa. falou sobre alguns aspectos da questão da infra-estrutura, do cartel de fertilizantes. Portanto, são essas as adversidades que hoje nós enfrentamos para produzir. 

Finalizo, dizendo que todos nós queremos realmente preservar a Amazônia. Mas nós precisamos saber de que forma podemos fazê-lo. E eu acredito que não temos outra forma a não ser criando pólos tecnológicos de desenvolvimento. Porque nossas divisas não podem ficar abandonadas, não podem ser cercadas estrategicamente por reservas indígenas; nós não podemos ficar a mercê da criação de reservas indígenas, sem discutir isso com a sociedade, principalmente com o Congresso; e não podem ocorrer situações como a que está acontecendo em meu Estado, em relação à BR-158, que liga nossa região como Pará. Essa estrada já existe há mais de 50 anos, e, agora, quando o Governo sinalizou com seu asfaltamento, foi lá a FUNAI e criou uma reserva indígena — bem em cima da BR 158 — para impedir seu asfaltamento, para impedir que seja feita a infra estrutura necessária para que possamos ter competitividade.

Ainda, Ministro — o tempo é curto —, quero dizer que o INCRA, lá, não é chamado de INCRA; nós o chamamos de “incravado”, porque ele é realmente um órgão que historicamente tem emperrado principalmente a questão da legalização, sobre a qual V.Exa. tanto falou. Olha, a corrupção histórica do INCRA também é coisa absurda. Então, acho que todas essas questões são desafios que V.Exa. terá que enfrentar — e que não pode estar sozinho, até porque o Governo também tem seus antagonismos. 

O Ministro Carlos Minc assumiu o Ministério dizendo que é do Rio de Janeiro e que nunca foi à Amazônia. Mas sua primeira fala foi criticando aqueles que estão na Amazônia. Ora, a Mata Atlântica foi praticamente dizimada, e nós temos sérios problemas ambientais na costa marítima; aliás, temos 8 mil quilômetros de costa marítima totalmente desprotegidos, e que também estão sendo pirateados no dia a dia. Portanto, acho que proteger as riquezas nacionais é um desafio que temos, e aí não pode haver Estado, divisão territorial nem muito menos ideológica ou de qualquer outra maneira. 

Acho que nós temos que discutir a Amazônia, entendendo a complexidade de um País tão grande como o nosso, com todas as dificuldades.

Quero saber, também, já que V.Exa. que tem experiência internacional, de que modo a comunidade internacional está realmente comprometida com a preservação da Amazônia, porque, acredito, se não tivermos transferência de tecnologia e transferência de recursos, será difícil fazer a preservação ideal que todos nós queremos.

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Quero comunicar que está acontecendo votação nominal no plenário. Já aconteceu uma votação. Vou suspender, por 2 minutos, a audiência pública. O motivo dessa rápida paralisação é que o Ministro precisa se dirigir ao toilet. (Pausa). 

Com o retorno do Ministro, retomamos os trabalhos. 

Devido ao fato de que se encontram presentes os Deputados Neudo Campos e Homero Pereira, e ausentes os Deputados Giovanni Queiroz e Elcione Barbalho, nós passaremos a palavra aos 2 últimos inscritos. 

Sr. Ministro, quero que V.Exa. compreenda que debateremos, hoje à tarde, a proposta de V.Exa. sobre a criação do grupo de trabalho, o que consideramos  importante.

Então, está com a palavra o Deputado Neudo Campos, do PP, que foi Governador de Roraima por 2 mandatos. 

O SR. DEPUTADO NEUDO CAMPOS – Muito obrigado, Sra. Presidenta. 

Sr. Ministro, eu quero primeiro parabenizá-lo pela forma racional como tem apresentado esse problema que se arrasta há longo tempo para ser resolvido, para ser apreciado. Nunca, antes, eu tinha visto uma exposição tão racional como a que V.Exa. colocou. O nome disso é racionalidade. 

Não custa dizer que antes imperou a irracionalidade. A irracionalidade do “não”, de sempre dizer “não”, de sempre negar tudo aos povos do Amazonas. Ali, tudo que se ia fazer era proibido; ou se fazia de forma clandestina ou se dizia “não”. Os exemplos estão aí, entre eles o da extração de minérios em terras indígenas. Sobre a questão dos minérios que estão lá, há uma grande riqueza no subsolo e uma pobreza incomensurável dos povos indígenas. Ninguém é mais pobre neste País do que os índios. Ninguém vive mais miseravelmente do que os índios. E ainda morando em cima de tal riqueza! Falta racionalidade, Ministro. O que quero dizer é que temos que discutir mais isso. 

Eu compreendo perfeitamente sua sugestão de criar grupos de trabalho para discutirmos os problemas da Amazônia. Por exemplo, meu Estado de Roraima que tem extensão do cerrado que já é uma Amazônia em transição para o Caribe. Então, ele não tem a densa floresta que tem o Acre, já é uma floresta em transição. Tem cerrado e tem as montanhas da fronteira. 

Temos que ver o que significa, por exemplo, a Venezuela para nós, dentro da nossa estratégia. Como é que podemos desprezar a Venezuela? O tratamento à Venezuela tem que ser importante, porque ela é o quinto maior produtor de petróleo; é um país que, em termos agrícolas, importa muitas coisas; até importa soja do Mato Grosso. E nós podemos produzir essa soja. E não só isso. Há muitas outras coisas que a Venezuela nos coloca. 

Do ponto de vista estratégico, é absolutamente fundamental que o Brasil ajude a Guiana a asfaltar uma estrada que saia de Lethem, na fronteira com o Brasil, até Georgetown, e faça um porto em Berbice, em águas profundas, que sirva tanto para a Guiana quanto para Roraima.

Na Zona Franca de Manaus, que exporta, essa é uma saída que já vai sair lá na frente. Está a 2 dias de caminhão desse porto do Caribe, que está a 2 dias do Pacífico. Roraima é o Estado mais próximo do Pacífico e, portanto, da Ásia, da China. Enfim, temos que pensar nisso. 

Sr. Ministro, quero me inserir nesse seu grupo, quero me oferecer para participar, para contribuir no horário, no momento em que for acertado. Quero que pensemos sobre isso. 

Temos também que ouvir sobre a questão fundiária. Veja quanto Roraima é diferente. O regime de chuvas em Roraima é diferente do restante do País. Lá está chovendo agora. A chuva começa em abril, maio, e vai até agosto, setembro. Ou seja, a safra de Roraima coincide com a entressafra do restante do País. Os empresários do Centro-Oeste, do Sul e do Sudeste podem investir em Roraima, produzir naquele Estado, com vistas à exportação. Além de tudo, o Estado está no Hemisfério Norte. Está a 3 dias do Canal do Panamá, do Pacífico. Enfim, são pontos absolutamente importantes, quando se planeja isso.

Qual é o entrave a tudo isso? A questão fundiária, a falta do título definitivo registrado no cartório de registro de imóveis. E isso é coisa tão simples, uma coisa que não dói. Não são recursos do Governo Federal que vão ser transferidos para Roraima. Na verdade, Roraima era do Estado do Amazonas. Foi federalizado com a criação do Território Federal do Rio Branco, onde nasci. E, depois, quando veio a Constituição de 1988, foi estadualizado. Ou seja, queremos que as terras do Amazonas que foram federalizadas sejam agora estadualizadas para Roraima. Isso é lógico. É um direito; é algo que nos atravanca a vida inteira. 

Como Governador, uma holding conhecidíssima chamada Mitsubishi queria investir lá para, sem derrubar uma única árvore, produzir soja para exportação para o Japão. O Japão consome soja de uma forma diferente. Não é soja para ração; é uma soja mais rica em proteínas para consumo humano. E lá produzimos adequadamente muito bem isso. Estamos perto do Canal do Panamá, estamos a 1 mil quilômetros de Porto La Cruz, na Venezuela — ou seja, um dia, um dia e meio de viagem —, que está a menos de um dia do Canal do Panamá, de navio. Então, há toda uma estratégia, toda uma logística que facilita. E nada disso aconteceu. Estamos numa pobreza; estamos vivendo numa dependência danada porque o Governo Federal, de longe, só diz uma coisa para nós: não, não e não! E isso não é deste Governo; isso vem de antes. 

Quer coisa mais irracional, Ministro, do que essa questão indígena, em que os produtores de arroz e os índios estão brigando? É uma briga irracional. Os índios poderiam participar dessa riqueza, mas não participam. O que vai acontecer é que se vai separar, não se vai mais produzir arroz, e os índios continuarão vivendo na miséria. Um não produz e o outro não se beneficia. 

Temos de ser racionais. Pela primeira vez, estou vendo projetos racionais, que têm sido apresentados por V.Exa. 

A extração de minerais em terras indígenas é um ponto que tem de ser abordado pelo bem dos índios, pelo bem do nosso País. Se o Governo Federal não procurar resolver essa questão, vai continuar existindo exploração clandestina — não são pagos impostos e se beneficiam meia dúzia de aventureiros que se propõem a fazer isso.

Ministro, mais uma vez, parabenizo V.Exa. pela sua abordagem, pelo seu projeto. Quero que se pense nessa questão estratégica da Venezuela, nessa estrada de Georgetown, para servir de porto de mar para Roraima e, talvez, para a Zona Franca. É mais perto. 

Enfatizo que todo entrave ao nosso desenvolvimento provém de uma única coisa, que é a questão fundiária. As terras existem, e a União não está lá para reclamá-las, não está lá para habitá-las, mas não deixa ninguém ter o título definitivo delas. Elas não servem de garantia para os projetos junto aos bancos. Por conseguinte, as coisas não avançam. 

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Obrigada, Deputado Neudo Campos.

Deputados Giovanni Queiroz e Homero Pereira, para que encerremos este bloco, solicito a compreensão de V.Exas. quanto às suas reflexões e questionamentos ao Ministro. 

Tem a palavra o Deputado Giovanni Queiroz, do PDT do Pará.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Minha compreensão V.Exa. vai ter, com certeza. Quem falou menos falou 8 minutos, quem falou mais falou 16 minutos. Logicamente, vou ficar no meio-termo.

Sr. Ministro, mais uma vez, cumprimento V.Exa. Tentarei ser bem sintético. V.Exa. traz para nossa reflexão propostas para uma Amazônia diferente. Com o aprendizado que obteve pelas andanças que fez, por ouvir tantos segmentos da Amazônia, pôde sintetizá-las num documento e na sua fala. V.Exa. insiste em dizer que quer aprender todo dia. É nesse sentido mesmo que temos de caminhar. 

Minha preocupação é como V.Exa. vai poder, sistematizando as idéias, concretizar ações na Amazônia. 

O ex-Governador Neudo Campos comentou sobre a dificuldade que teve quanto à regularização fundiária, que poderia viabilizar o Estado, tirá-lo da miséria. Mas isso depende da União — da transferência das terras da União para o Estado ou da regularização, pela União, das terras daquela região para propiciar o desenvolvimento efetivo.

Então, minha preocupação é como V.Exa. vai conseguir mexer com o INCRA, com o IBAMA, com a FUNAI, com os Governos dos Estados. Muitos deles são morosos, incompetentes, negligentes, preguiçosos e não pensam grande como V.Exa. está tentando pensar, como nós queremos pensar, para o desenvolvimento efetivo da Amazônia, integrando-a ao processo de desenvolvimento nacional. Minha preocupação, Ministro, é como V.Exa. pode fazer isso. 

E aí vem uma idéia, que trago comigo há muito tempo. Sou mineiro de nascimento. Fiz Medicina no Rio de Janeiro e fui para o interior do Pará. Fui o primeiro médico de uma corrutela de lá, de um povoado. Hoje sou fazendeiro e também reflorestador. Já carrego comigo há muitos anos — os colegas aqui sabem disso — a idéia de se criar o Estado de Carajás no sul do Pará, de desmembrá-lo do Pará. Em 1.248 mil quilômetros quadrados, proponho a criação de um novo território, com novo gerenciamento. Há também a idéia de criação do Estado do Tapajós, mais a oeste do Pará, na região de Santarém. O Estado de Carajás, na região de Marabá, no polígono mineral de Carajás. 

Minha sugestão, Ministro, é a seguinte: V.Exa., para implementar ações objetivas em uma determinada região, para ser um modelo piloto em toda a Amazônia — enquanto isso, logicamente, tendo ações em todos os Estados, em todas as direções —, poderia criar um território federal. V.Exa. indicaria o Governador, que teria uma ação direta sobre aquela região, comprometido com o projeto de V.Exa. 

Por que eu sugiro a região de Carajás? Poderia ter o nome de território do sul do Pará, de território de Carajás, o nome que quisessem colocar. Porque lá V.Exa. vai encontrar tudo isto que menciona: a área desmatada e grande; a área de mata em pé; a questão indígena; o cerrado; o Rio Araguaia, que precisa tornar-se navegável durante os 12 meses do ano — ele o é durante 8 meses; a questão das hidrelétricas a serem construídas ali, seja a de Santa Isabel, seja a de Marabá, que já têm projetos; uma questão forte e enorme a se concretizar. 

O Governo Federal precisará ser parceiro na política industrial, ou seja, na política de exportação do minério, na política minerária. Estamos vendo que o buraco está sendo aberto, com as riquezas naturais não-renováveis, que são os nossos minérios, esvaindo-se. Haverá miséria em torno do buraco, e vamos ter o apito do trem e o apito do navio, como ocorreu em Serra do Navio, no Amapá, se não tivermos uma política industrial diferenciada, uma política minerária de exploração. 

Nós não deixamos de ser uma coloniazinha sem-vergonha. Desculpem-me a expressão. Somos uma mera colônia, que está sendo explorada por outros países, pelas empresas que se dizem nacionais e que fazem o jogo internacional. Não são eles que estão nos explorando. Nós é que estamos nos permitindo ser explorados por negligência, por tolerância excessiva. Por tolerância excessiva, repito. Cabe ao Governo Federal disciplinar isso. 

Sr. Ministro, lanço-lhe um desafio: proponha ao Presidente a criação do território na região sul e sudeste do Estado do Pará, na região de Marabá. V.Exa. vai encontrar a questão minerária, a questão do transporte, a questão da logística do transporte, bem colocada por V.Exa. Vamos sair do estreito caminho rodoviário para alargar essa condição de transporte com as ferrovias e as hidrovias.

Estamos próximos dos portos de exportação, como o de Vila do Conde. Poderia ser levada uma ferrovia até lá, ou a Hidrovia Araguaia-Tocantins. Já temos a energia de Tucuruí para garantir o desenvolvimento industrial, mas precisamos de mais hidrelétricas, como a de Marabá e a de Santa Isabel, não só para tornar mais navegável o Rio Araguaia, mas também para gerar energia para estimular esse desenvolvimento.

Sr. Ministro, V.Exa. traz outra questão. Gostaria de ter sugestões para relação de trabalho, Deputado Neudo Campos. Fico pensando em como poderia ser. O Deputado Moreira Mendes nos provocou. S.Exa. quer uma relação de trabalho. Fico pensando… Se pegassem um Deputado de cada Estado, como seria isso? Quem estaria interessado em se inscrever para participar de um debate uma vez por semana ou uma vez por mês, numa sexta-feira pela manhã? Nós bateríamos papo, almoçaríamos juntos e discutiríamos tema por tema.

V.Exa. fala em regularização fundiária. Depende do INCRA, depende do Estado. V.Exa. fala em zoneamento econômico-ecológico. Rondônia já tem o dela, mas o Pará não tem. Colocamos dinheiro lá, mas o nosso Secretário do Meio Ambiente não se mexeu. Não se mexeu, repito. O dinheiro colocado no Orçamento da União foi disponibilizado. V.Exa. fala na indústria. Vamos precisar da política do Estado. O Estado precisa ser parceiro da União nessa política industrial capaz de alavancar o desenvolvimento, gerando emprego. V.Exa. fala de transporte multimodal. Temos de buscar o interesse dos outros Ministérios para que possamos vê-lo implantado. E V.Exa. fala na capacitação de recursos humanos. Precisa-se do Estado e da União. 

Eu não vejo outra alternativa a não ser a criação de um território, para que haja ali um modelo de desenvolvimento efetivo, que sirva de exemplo para toda a Amazônia. Eu ouvi isso de V.Exa. Não estou criando nada. Foi V.Exa. que, numa conversa rápida que tivemos, disse-me para trazer algumas propostas de ações para criarmos ali uma microrregião, onde possamos implementar ações que sirvam de modelo para toda a Amazônia. 

Eram essas as minhas ponderações. Isso deve ser feito imediatamente. Vamos à prática.

V.Exa. vai encontrar muitas dificuldades, porque, como já disseram aqui, e eu apenas vou repetir… O INCRA, na minha região, também é “incravado”. O nome do INCRA, na minha região, é “incravado”. 

E mais: a Superintendência do INCRA, em Marabá, é a maior do Brasil. Estão exigindo zoneamento econômico-ecológico para tirar licença ambiental, sob pena de, a partir do dia 1º, não haver mais crédito para o produtor rural. No INCRA de Marabá só tem um técnico para analisar o georreferenciamento que estão exigindo de todo produtor. Ele é de Palmas. Briguei para que fosse para lá. Ele passa uma semana lá e 20 dias em Palmas. Não existe ninguém. Até hoje foram certificadas apenas 24 propriedades. Duas delas são minhas. O interessante é que há 2 anos estou brigando para certificá-las. Há 2 anos! Agora certificaram a segunda. 

É este o Estado brasileiro: da incompetência, da negligência e da irresponsabilidade, porque querem limitar o crédito do povo da Amazônia, a partir do dia 1º, para quem não tiver licença ambiental. 

Na Amazônia — no Pará, em particular —, para se tirar uma licença ambiental… Eu demorei 14 meses para tirar licença ambiental, a fim de explorar madeira que eu plantei. Cito esse exemplo para V.Exa. ter noção do que vai encontrar pela frente, Ministro. 

Mas nós seremos parceiros de V.Exa. Coloco-me à disposição de V.Exa. para discutirmos todos os termos que V.Exa. quiser e para ajudá-lo no Congresso Nacional. Vamos tentar agilizar a tramitação de leis. Acho que todos nós ficamos entusiasmados de ver uma luz no fim do túnel, com as propostas de V.Exa. 

Muito obrigado. 

O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Muito obrigado, Deputado Giovanni Queiroz.

Passo a palavra ao último inscrito, Deputado Homero Pereira. Em seguida, o Ministro vai responder todos os questionamentos. Depois nós encerraremos esta audiência pública.

Com a palavra o Deputado Homero Pereira.

O SR. DEPUTADO HOMERO PEREIRA – Sr. Presidente, serei breve. Resta pouca coisa a dizer, para não ser redundante, para não repetir o que nossos companheiros já disseram. 

O Ministro brindou-nos novamente, nesta oportunidade, com um volume de informações importantes. Acertou o Presidente da República, quando colocou o Programa Amazônia Sustentável sob a coordenação de S.Exa., que é uma pessoa ponderada. 

Eu não tenho mais observações a fazer. Apresento apenas 2 sugestões.

Primeiro, sugiro a V.Exa. que internalize suas idéias no âmbito do Governo. Vejo que V.Exa. está indo conversar com os Governadores. Há Ministérios — não quero nominá-los — envolvidos com o tema “Amazônia Sustentável” que fazem discursos totalmente diferentes, principalmente no tocante a instrumentos de comando e controle, que o Deputado Moreira Mendes mencionou. Eles são necessários, obviamente, mas não no sentido de serem incluídos. 

Se quiserem que as coisas não aconteçam na Amazônia, excluam os amazônidas da discussão. Percebemos claramente, inclusive em algumas propostas, a tentativa de blindar aquilo tudo, de transformar-nos numa sociedade de segunda classe, de subsidiar o Sul do País… Só temos de combinar o seguinte: vamos trazer as 25 milhões de pessoas de volta que dá tudo certo. Tudo ficará zerado. Vamos fazer um grande refrigerador e trazer de lá para cá as 25 milhões de pessoas. Será feito um grande acerto nacional nesse sentido. 

A sugestão de V.Exa. pode ser feita a partir do próprio Ministério. Nós tivemos algumas experiências quanto ao endividamento rural e outras coisas mais. No âmbito dos Ministérios da Agricultura e da Fazenda, criaram-se grupos de trabalhos multidisciplinares, com o envolvimento tanto de Parlamentares como da sociedade civil organizada, o que tem resultado em algumas medidas importantes. Algumas delas deram origem a medidas provisórias.

Se houver o envolvimento da sociedade local, as coisas vão acontecer. De nada adianta criarmos leis, normas de cima para baixo, sem o envolvimento da comunidade local, sem o conhecimento da realidade, já devidamente identificada, conforme V.Exa. disse, por meio de instrumentos modernos, como o zoneamento e a regularização fundiária. Mas o envolvimento das pessoas que estão naquele território é fundamental, sob pena de aquelas idéias não terem eficácia. 

Quando V.Exa. assumiu a coordenação do Plano Amazônia Sustentável, mostrou ser um grande pensador. A Nação já reconhece isso. Mas V.Exa. não pode ser lembrado só como um grande pensador. Tem de ser lembrado também como um grande coordenador, um grande executor desse projeto, porque ele é a solução não apenas para a Amazônia, mas para o Brasil. 

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Dando continuidade aos trabalhos, passo a palavra ao Ministro Mangabeira para responder os questionamentos dos Srs. Parlamentares e também para as suas considerações finais.

Muito obrigada.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado.

 Eu vou mencionar 4 temas recorrentes nessas intervenções. O primeiro deles tem a ver com as alternativas na Amazônia sem floresta. 

Começo respondendo o Deputado Tripoli. S.Exa. disse que ia na contramão das outras intervenções. Eu não entendi dessa forma. S.Exa. disse exatamente o que todos nós estávamos dizendo. 

Fiz uma distinção clara, na minha apresentação inicial, entre a estratégia para a Amazônia com floresta e a estratégia para a Amazônia sem floresta. 

A Amazônia Legal inclui vastas áreas de cerrado ou savana tropical. Não só áreas que foram desmatadas, mas áreas que nunca tiveram florestas, que são savana tropical. Nós precisamos ter uma estratégia para essa Amazônia dos cerrados e estabelecer nela a vanguarda da agricultura brasileira. 

Agora, deve ser feita uma distinção conceitual muito importante, que eu não identifiquei na intervenção de S.Exa. Na grande Amazônia dos cerrados, a tarefa é a construção da agricultura brasileira. O Brasil, pela sua combinação de recursos — água, sol e solo —, tem todas as condições para ser a maior potência agrícola do mundo e para promover o resgate da humanidade nesta fase histórica. 

Para aproveitar esse potencial, como eu disse nas minhas observações iniciais, é necessário que haja uma construção econômica e física. Há problemas práticos a resolver. Um deles, por exemplo, que estamos enfrentando nesses dias, é o dos fertilizantes. É um absurdo que o Brasil, que tem potencial para produzir praticamente tudo o que precisa, em matéria de fertilizantes, e até para exportar, seja radicalmente dependente. E são 40% do custo dos produtos agrícolas.

 Esse problema dos fertilizantes está ligado a uma revolução que temos de fazer na estrutura da mineração, no Brasil. Há toda uma problemática econômica e física. Mas essa tarefa econômica e física passa por uma construção institucional. Nós temos, no Brasil, o ônus de um contraste nocivo e desnecessário entre agricultura familiar e agricultura empresarial. Não tem sentido, embora se compreenda historicamente a genealogia desse contraste entre nós.

Nós precisamos construir o desenho institucional de uma agricultura moderna, e democratizar é um só; e o lugar para começar essa construção é a Amazônia dos cerrados. 

Entre os problemas todos que eu citei, lembro um que me parece crucial, que é a reorganização dos mercados agrícolas. Nós queremos reorganizar os mercados agrícolas em favor dos produtores para limitar o poder dos cartéis de fornecedores e compradores; uma grande tarefa, uma tarefa revolucionária para o País, para o mundo, na Amazônia dos cerrados.

Agora há um outro problema, e aí é que vem a minha distinção conceitual, que tem a ver com a situação específica das populações de pequenos produtores extrativistas e agrícolas que operam nessa zona de transição entre a floresta e o cerrado. Involuntariamente, eles costumam ser a linha de frente de desmatamento. Não é culpa deles, não é caso de polícia; é um caso de agenda econômica construtiva. Eles operam involuntariamente como linha de frente de grandes pecuaristas e agricultores, que vêm atrás deles. 

Então, o que queremos fazer é convertê-los para que, em vez de ser essa linha de frente de desmatamento, seja um cinturão de proteção da Floresta Amazônica e, para isso, precisamos definir um elenco de formas legítimas de produção, apoiadas técnica e financeiramente, e construir um mecanismo de remuneração especial que sacramente o vínculo dessas populações com esses programas. 

É isso que temos de fazer. É uma tarefa prática. O que adianta o País ficar acalentando essas polêmicas abstratas sobre esses contrastes absurdos entre desenvolvimento e preservação? Não é isso. O problema é que ficamos falando e não fazemos. 

Disseram que eu sou um pensador, mas tenho que executar e tal. Eu é que estou ansioso em traduzir essas abstrações em iniciativas concretas, e o que costumo encontrar no País é mais discurso. Mas o País não quer palavras agora sobre a Amazônia; quer ações, e são as ações que vão definir o sentido das palavras.

Agora, o segundo tema que surgiu em várias das intervenções, sobretudo a do Deputado Campos. Nós compartilhamos a Amazônia com os nossos vizinhos sul-americanos, e em algum momento o projeto Amazônia, além de ser um projeto brasileiro, tem de ser um projeto sul-americano, que exprima e reforce o impulso de construção da união sul-americana. O que nos tem inibido é a falta de concretude no nosso próprio projeto. Como podemos discutir com os nossos vizinhos, que são muito menores e mais fracos que nós, se não temos clareza sobre o que queremos para nós? Então, a prioridade é o desdobramento dessa proposta Amazônia nessas iniciativas concretas todas que eu descrevi para, logo em seguida, começar a engajar os nossos vizinhos. 

Agora, ocorre que, na prática, não vamos poder obedecer a essa separação rígida de etapas, porque surgem circunstâncias que vão antecipar esse engajamento dos nossos vizinhos. Dou um exemplo: o Presidente Lula vai se encontrar com o Presidente Chávez no dia 27, em Santa Elena, na Venezuela, na fronteira com Roraima, e eu então propus, e obtive o consentimento dos dois Governos, de organizarmos na véspera, no dia 26, uma reunião dos Governadores de Roraima e de Bolivar, o estado venezuelano vizinho de Roraima, com o engajamento de Ministros brasileiros e venezuelanos, para começarmos a discutir iniciativas conjuntas e paralelas em Bolivar e Roraima e, com isso, antecipar essa dinâmica sul-americana que me parece tão importante. 

Isso é uma grande coisa para nós, para a Venezuela, que não tem projeto definido sobre a Amazônia venezuelana. A Venezuela está preocupada agora com o Faixa do Orinoco, mas o que fica para baixo na Amazônia venezuelana, pouco figura na discussão pública daquele país, quer por parte do Governo, quer por parte da Oposição. 

Então, vamos antecipar essa dinâmica, e eu gostaria também de engajar a Nação nesse debate porque aí, mais uma vez, saímos dos discursos e passamos para os atos, e vamos dar uma dimensão surpreendente, inesperada a esse projeto de união sul-americana. 

Sobre o terceiro ponto em que eu quero insistir, eu falei em 7 grupos de iniciativas, mas não estão todos nos mesmo plano, porque em um deles há um tema que tem primazia sobre todos os outros, e é transversal no debate entre ambientalistas extremados e pessoas que descuidam do meio ambiente. Esse tema é a terra, a regularização fundiária. Eu insisto, vou dizer mil vezes em todo o lugar: enquanto não resolvermos o problema da titularidade da terra na Amazônia, enquanto a Amazônia continuar a ser um purgatório de insegurança jurídica, nada vai funcionar. Nenhuma dessas outras iniciativas vai para frente. 

Então, o tema que tem prioridade causal sobre todos os outros é o da regularização fundiária na Amazônia, e nós não vamos resolver esse problema apenas por medidas administrativas. Nós vamos ter que mudar as leis. 

Nós não podemos resolver o problema fundiário numa região que tem o tamanho da Europa dentro de um direito civil que é mesmo de Portugal do século XVIII. Não funciona isso. Nunca funcionou em nenhum outro país grande. Todos os outros tiveram que mudar as suas leis para resolver esse problema. Nós também vamos ter que mudar, e o eixo dessa mudança é a organização dessa trajetória acelerada da posse para a propriedade.

O quarto tema recorrente nessas intervenções é a dimensão nacional do projeto Amazônia. Que coisa fantástica vemos quando comparamos esse episódio nacional que estamos vivendo agora, de debates sobre a Amazônia, com debates sobre o Nordeste na época de João Goulart e Celso Furtado! Naquela época, o Nordeste era visto como um problema regional. Era um problema de desigualdades regionais e de iniciativas destinadas a sanar as desigualdades regionais. Agora, não. Há uma consciência nascente no Brasil de que a Amazônia é uma causa nacional. O que estamos discutindo não é o conserto da Amazônia, é o conserto do Brasil, e todas essas iniciativas que passam por inovações institucionais têm aplicação para todo o País. 

A Amazônia é a vanguarda da Nação brasileira hoje, e é ali que vamos definir inovações que ajudarão a soerguer e a transformar todo o País. É por causa disso, Deputados, que eu preciso construir com V.Exas. uma relação de trabalho que ultrapasse os limites desse ritual.

Muito obrigado. (Palmas.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputado Janete Capiberibe) – Muito obrigada, Ministro.

Com a palavra, pela ordem, o Deputado Sergio Petecão.

O SR. DEPUTADO SERGIO PETECÃO – Sr. Ministro, a respeito da minha pergunta sobre a cana-de-açúcar na Amazônia…

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Há uma resistência muito grande a permitir a entrada da cana-de-açúcar na Amazônia que tem a ver com o seguinte problema: não basta dizer que o cultivo da cana seja em áreas devastadas. Se ela se aproximar da floresta, teme-se que haja um risco de invasão e não queremos isso. 

Não encaramos a Floresta Amazônica como fronteira agrícola. Agora, não é um dogma, precisamos discutir esse tema, mas desde que haja uma zona considerável que imunize a Floresta Amazônica contra o risco dessa invasão. É um tema aberto a discussão.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Estamos estendo um pouco mais a audiência pública. Concedo a palavra por um minuto ao Deputado Giovanni Queiroz.

O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Sr. Ministro, essa questão do açúcar, de etanol, de biodiesel, como V.Exa. disse, temos que aproveitar toda aquela região já antropizada e desmatada.

Para V.Exa. ter uma noção, a sacarose, segundo experimentos feitos lá na região sul do Pará, é superior à sacarose produzida aqui em Goiás. A tonelagem por hectare produzida chega a 140 toneladas com cana de 14 meses, e a média é de 80, 100 toneladas.

O desmatamento é questão pontual. Quem está desmatando sem autorização que seja penalizado, e o Governo tem como fazer isso. Hoje, com os instrumentos que temos, com GPS, localiza-se pontualmente; desce-se de helicóptero em cima do trator que estiver desmatando. O que não se pode é generalizar a punição para quem está lá desbravando, produzindo.

Então, é como V.Exa. disse: está em aberto a discussão, e que a cana-de-açúcar, o álcool, o biodiesel — do sebo do boi, do dendê, do pinhão manso ou da mamona — sejam instalados. O que não pode é o seguinte: se há o zoneamento e aqui não vai desmatar, não se desmate, mas é preciso que o Estado esteja presente para inibir esse tipo de coisa, e não inibir a produção na região.

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Agora, há uma distinção fazer entre o etanol e a cana de um lado e a produção para o biodiesel de outro. Com relação ao biodiesel, as preocupações são muito menores, porque a base pode ser a pequena produção e é possível imaginar, em muitas áreas, que essa produção para o biodiesel componha aquele elenco de atividades legítimas que descrevi para as populações de pequenos produtores. 

A cana suscita maiores preocupações, mas a discussão está aberta. Não deve haver, nessa discussão sobre a Amazônia, nenhum tabu. Nenhum assunto é proibido, todos os assuntos são permitidos.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Muito obrigada, Sr. Ministro Mangabeira. 

Na conclusão desta audiência pública, a partir das informações trazidas pelo Ministro, já temos encaminhamentos concretos, e um deles será exposto hoje à tarde à apreciação da Comissão da Amazônia, que é a criação de um grupo de trabalho para que discutamos 7 conjuntos de iniciativas para a implantação do Plano Amazônia Sustentável.

Estaremos em contato com o Governo Federal para, no encontro do Presidente Lula com o Presidente Chávez, a Comissão da Amazônia estar presente, nesse conjunto de países amazônicos, que são 8, numa articulação do Governo brasileiro, Executivo, Legislativo e outros Poderes que se façam presentes.

Tendo em vista que os trabalhos dessa reunião conjunta foram gravados e seus registros constarão dos Anais da Comissão, consulto o Plenário da possibilidade de dispensa da leitura da ata. (Pausa.)

Fica dispensada a leitura.

Em votação a ata da reunião conjunta da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e Minas e Energia e da Comissão de Meio Ambiente. (Pausa.)

Aprovada.

Agradeço a valiosa contribuição e os esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro e também a cada Parlamentar que participou desse debate de implantação do PAS.

Nada mais havendo a tratar, convoco os membros desse Colegiado para reunião deliberativa extraordinária hoje, quarta-feira, no Plenário 15, às 14 horas, e também para o seminário Segurança do Transporte Fluvial na Amazônia, a ser realizado sexta-feira, dia 13 de junho, na Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas.

Está encerrada a presente reunião.

CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
CONJUNTA – AMAZÔNIA / MEIO AMBIENTE

EVENTO: Audiência Pública N°: 0884/08 DATA: 11/06/2008
INÍCIO: 10h41min TÉRMINO: 13h17min DURAÇÃO: 02h36min
TEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h36min PÁGINAS: 47 QUARTOS: 32

DEPOENTE/CONVIDADO – QUALIFICAÇÃO

ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da
República.

SUMÁRIO: Debate sobre a política de desenvolvimento sustentável para a Amazônia.

OBSERVAÇÕES

Reunião de audiência conjunta das Comissões da Amazônia, Integração Nacional e de
Desenvolvimento Regional e de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Declaro aberta a presente
reunião de audiência pública conjunta, promovida pela Comissão da Amazônia, Integração
Nacional e de Desenvolvimento Regional e pela Comissão de Meio Ambiente e
Desenvolvimento Sustentável — cujo Presidente, André de Paula, encontra-se compondo a
Mesa —, em atendimento aos Requerimentos de no. 363, de 2008, de autoria da Deputada
Vanessa Grazziotin, subscrito pelos Deputados Luciano Castro e Giovanni Queiroz; no 371, de
2008, da Deputada Dalva Figueiredo, subscrito pelo Deputado Sergio Petecão; no 372, de
2008, da Deputada Janete Capiberibe, subscrito pelo Deputado Marcelo Serafim, e no 182, de
2008, do Deputado Nilson Pinto, subscrito pelos Deputados André de Paula, Marcelo Almeida,
Antonio Carlos Mendes Thame, Ricardo Tripoli, Givaldo Carimbão, Germano Bonow, Luiz
Carreira, Moreira Mendes e Wandenkolk Gonçalves.
A reunião foi convocada para debater a política de desenvolvimento sustentável para a
Amazônia, tendo com convidado o Ministro de Assuntos Estratégicos da Presidência da
República, Sr. Mangabeira Unger.
Inicialmente, gostaria de cumprimentar todos presentes, em especial o Sr. Ministro e o
Presidente da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Deputado André
de Paula.

Informo que em razão de compromissos assumidos pelo Sr. Ministro a reunião anterior
foi interrompida, no último dia 21 de maio, após a fala de S.Exa.
Por favor, eu solicito silêncio, para que esta reunião de audiência pública possa
acontecer com harmonia e com a participação de todos.
Então, a reunião de 21 de maio, como eu dizia, foi interrompida após a fala do Ministro e
a exposição de alguns dos autores dos requerimentos, Deputados Nilson Pinto, Vanessa
Grazziotin e Giovanni Queiroz. Na condição de Presidente da Frente Parlamentar
Ambientalista, também o Deputado Sarney Filho fez uso da palavra, junto com os 3 autores do
requerimento.
Aos Parlamentares que quiserem se inteirar do que foi discutido na reunião anterior,
informo que se encontram sobre as bancadas cópias das notas taquigráficas, já distribuídas a
todos os Deputados das Comissões da Amazônia e de Meio Ambiente, por e-mail. Sobre as
bancadas também se encontram dispostas cópias da ata da audiência do dia 21.
Ficou acordado que retomaríamos nossas atividades de hoje garantindo a palavra aos
Parlamentares inscritos para debate que não tiveram a oportunidade de falar, conforme lista
elaborada no dia 21. Pela ordem, os Deputados: Marcio Junqueira, do DEM de Roraima;
Antonio Carlos Mendes Thame, do PSDB de São Paulo; Francisco Rodrigues, do DEM de
Roraima; José Genoíno, do PT de São Paulo; Marinha Raupp, do PMDB de Rondônia;
Francisco Praciano, do PT do Amazonas, e Moreira Mendes, do PS de Rondônia.
O Sr. Ministro, no entanto, gostaria de retomar a sua fala para esclarecer alguns pontos
que considera importantes, incluindo a reunião acontecida entre o Sr. Ministro e os
Governadores.
Se todos concordam, eu repasso a palavra ao Sr. Ministro Mangabeira, para esses
novos esclarecimentos.
Com a palavra o Sr. Ministro.
O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado, Deputada.
Srs. Deputados, Sras. Deputadas, meus concidadãos, em primeiro lugar, eu reitero as
minhas desculpas pela interrupção que eu provoquei na última audiência pública, causada por
um imprevisto grave que surgiu. Reafirmo a grande importância que atribuo a essa discussão
com o Congresso Nacional.
Todos nós temos momentos de dúvidas e desalento. O que eu posso dizer é que nos
meus tais momentos o convívio com o Congresso Nacional tem sido um fonte não só de
consolo mas também de inspiração. Estarei sempre disponível para esta Comissão em
qualquer momento. E para mim será sempre um manancial de orientação do meu trabalho
ouvi-los e poder debater com os senhores.
Pedi a Sra. Deputada uma oportunidade de fazer um relato inicial. Nas semanas
transcorridas desde a nossa última discussão ocorreu uma reunião em Belém com os
Governadores de toda a Amazônia Legal e persisti nas minhas viagens de estudo e debate
pelos Estados da Amazônia.
Estou, portanto, em condições de lhes prestar um relato mais preciso a respeito das
nossas idéias sobre os primeiros passos no desdobramento do Plano Amazônia Sustentável.

Começo com algumas observações preliminares a respeito da direção e do método
deste Plano Amazônia Sustentável, e, em seguida, enumero 7 iniciativas que discutimos com
os Governadores em Belém e que agora estou discutindo mais pormenorizadamente com
meus colegas Ministros e com cada um dos Governos da Amazônia Legal.
A minha primeira observação preliminar é que já ocorreu uma grande mudança. Pela
primeira vez na história do Brasil a Amazônia está no centro da atenção nacional. Esse fato
extraordinário e auspicioso cria uma imensa oportunidade para mobilizar capital político a
serviço de um grande projeto de preservação, de desenvolvimento e de defesa da Amazônia.
Estou aflito para aproveitar cada dia, cada hora, e levar este projeto adiante na janela de
oportunidade política que temos.
A minha segunda observação preliminar é que não é correto dizer que o nosso problema
principal hoje seja um conflito entre objetivos de preservação e objetivos de desenvolvimento.
Não há dúvida de que mais adiante, à medida que desdobrarmos nossas iniciativas, surgirão
contradições pontuais entre iniciativas desenvolvimentistas e iniciativas preservacionistas. Mas
o problema principal agora não é esse, o problema principal agora é que estamos muito aquém
de onde deveríamos e poderíamos estar, tanto em matéria de preservação quanto em matéria
de desenvolvimento.
A Nação anseia por uma reconciliação profunda e duradoura entre desenvolvimento e
preservação da Amazônia.
Há uma convergência abrangente no País em direção à tese do desenvolvimento
sustentado. Só há poucos brasileiros que entendem que a Amazônia deva ser um santuário
vazio de gente e de iniciativa econômica, também poucos que entendem que o preço
inevitável do desenvolvimento seja a aceitação de atividades econômicas devastadoras do
bioma Amazônia. A grande maioria sustenta a tese do desenvolvimento sustentável. O nosso

problema é que essa convergência ainda é relativamente abstrata e a nossa tarefa é preenche-
la tão rapidamente quanto possível com conteúdo prático.

A minha terceira observação preliminar é que as causas da preservação, do
desenvolvimento e da defesa estão entrelaçadas na Amazônia. Não haverá preservação do
meio ambiente sem desenvolvimento econômico. Tenho dito em todo lugar que a Amazônia não
é apenas uma coleção de árvores, é um grupo de pessoas. Se os 25 milhões de brasileiros que
moram lá não tiverem oportunidades econômicas serão impelidos inexoravelmente em direção
à atividades que acelerarão o desmatamento. Portanto, um projeto ambiental carente de
projeto econômico seria inconsistente e contraproducente.
Por outro lado, sem um projeto econômico também não haverá estruturas produtivas e
sociais organizadas. Uma vasta região sem estruturas produtivas e econômicas organizadas é
muito difícil de defender.
A minha quarta observação preliminar é que a causa da Amazônia não é uma causa
regional, é uma causa nacional. A Amazônia é o terreno privilegiado para repensar e
reorganizar todo o País. Na Amazônia joga-se o futuro do Brasil.
O Plano Amazônia Sustentável, que o Presidente e o Governo determinaram que eu
coordenasse, não é uma planilha, é um conjunto de diretrizes e de compromissos que agora

temos que transformar em ações concretas. E não sou o dirigente deste Plano, sou o
coordenador.
O projeto Amazônia é necessariamente uma obra coletiva a ser construída em conjunto,
em primeiro lugar, com os Governos da Amazônia Legal e depois com as forças organizadas
de todo o País. E este recinto é o ambiente privilegiado em que inicia-se o debate nacional.
Feitas essa 4 observações preliminares, passo a descrever sumariamente os 7
conjuntos de iniciativas que já começamos a debater como conteúdo do Plano Amazônia
Sustentável e que serviram de foco às nossas discussões em Belém.
O primeiro conjunto de iniciativas tem a ver com regularização fundiária e zoneamento
ecológico e econômico. Se há um problema que tenha prioridade causal sobre todos os outros
na Amazônia hoje é a regularização fundiária. Toda a Amazônia brasileira é um caldeirão de
insegurança jurídica. Não conseguiremos resolver nenhum dos problemas da Amazônia se não
avançarmos decisiva e rapidamente na regularização da propriedade da terra.
Enquanto a Amazônia permanecer nessa situação de insegurança jurídica generalizada,
tudo o que contruirmos será construído sobre areias movediças.
Para avançar na regularização fundiária, temos que caminhar simultaneamente em 2
trilhos. O primeiro trilho é fortalecer as capacitações administrativas dos órgãos responsáveis,
federais e estaduais, a começar pelo INCRA, mas duvido que seja suficiente.
Nenhum dos grandes países da história moderna que enfrentou um problema fundiário
dessa dimensão, inclusive os Estados Unidos, no curso do século XIX, conseguiu resolvê-lo
sem revisões de grande dimensão no seu Direito Civil sobre a propriedade da terra, e nós não
seremos uma exceção.
Há certos institutos no Direito Agrário brasileiro existente que permitem uma trajetória
acelerada da posse insegura para a propriedade plena, mas nós teremos de alargar esse
caminho, esses institutos, como a legitimação da posse ou a regularização fundiária com
dispensa de licitação não serão suficientes. As revisões jurídicas necessárias estão em 2
categorias. De um lado, permitir esse movimento acelerado da posse para a propriedade e, de
outro lado, enriquecer as conseqüências jurídicas da posse legítima, para que quem ainda não
goze da propriedade plena possa gozar de muitos dos direitos que compõem a plena
propriedade.
É nesse clima de regularização fundiária que poderemos avançar no zoneamento
ecológico e econômico.
Para corrigir o mal-entendido que surgiu na nossa última discussão, não entendo que a
regularização fundiária precisa ser condição antecedente do zoneamento, mas é no ambiente
de um grande progresso sobre regularização fundiária que poderemos também progredir no
zoneamento. A tarefa do zoneamento é definir uma estratégia para a Amazônia com floresta e
outra para a Amazônia sem floresta, estratégias distintas para cada uma das microrregiões da
Amazônia.
O segundo conjunto de iniciativas que comecei a discutir com os Governos da Amazônia
Legal e com meus colegas tem a ver com as medidas contra o desmatamento. Precisamos
persistir e até radicalizar no combate contra o desmatamento.

Afirmo de maneira inequívoca: o Governo brasileiro não encara a floresta Amazônica
como fronteira agrícola.
Há medidas emergenciais já lançadas sob a rubrica da Operação Arco Verde destinadas
a fortalecer o combate contra o desmatamento. Mas nós temos agora que enfrentar 2
problemas estruturais. O primeiro problema é municiar, com quadros e com meios técnicos, as
unidades de conservação. Não adianta criar unidades de conservação sem equipá-las com
pessoas e com técnicas. As árvores não se defendem por si mesmas.
O segundo problema estrutural a resolver é decidir até que ponto devemos e podemos
insistir no reflorestamento das áreas que foram ilegalmente devastadas.
O terceiro conjunto de iniciativas tem a ver com a situação das populações de pequenos
produtores, agrícolas ou extrativistas, que atuam nas zonas de transição entre o cerrado e a
floresta.
Quando essas pessoas não têm alternativas econômicas legítimas, são levadas a
desmatar, conduzindo, nas áreas desmatadas, uma pecuária extensiva, desordenada e de
pequena escala, vendendo madeira ilegalmente ou transformando madeira em carvão.
Nós precisamos construir para essas populações um elenco de alternativas de produção
que sejam economicamente viáveis e ambientalmente seguras, lavouras perenes, cultivo de
peixes, plantio de árvores ou produção para o biodiesel, dependendo das vocações de cada
lugar. Precisamos construir um mecanismo para remunerar essas populações, além dos
ganhos normais de suas atividades produtivas, em troca das obrigações que assumiriam de
prestar contas e de monitorar. E essa remuneração especial seria um vínculo que
sacramentasse o engajamento dessas pessoas nesses programas.
Finalmente, o Estado também tem que vigiar, mas uma coisa é a vigilância estatal para
complementar uma agenda econômica construtiva, que é o que queremos, e outra coisa é a
vigilância estatal para substituir a falta de uma agenda econômica construtiva, que é o que
queremos evitar.
O quarto conjunto de iniciativas já discutidas com os Governadores tem a ver com a
organização da agricultura e da pecuária na Amazônia sem floresta, na Amazônia dos nossos
grandes cerrados ou savanas tropicais.
Ali temos uma oportunidade de apontar caminho para o País todo. Há 2 grandes tarefas
paralelas, uma econômica e física e outra institucional.
A tarefa econômica e física começa com a constatação de que no Brasil hoje, para cada
hectare sob lavoura, há 3 hectares entregues à pecuária extensiva, que é uma forma
relativamente ineficiente de produção.
Todo o mundo sabe que o Estado do Mato Grosso é hoje um dos grandes celeiros não
só do Brasil, mas do mundo. Mas toda a atividade agrícola daquele Estado ocorre em 8% do
seu território.
Nós poderíamos, no Brasil, com relativa facilidade, dobrar a área sob cultivo e triplicar o
nosso produto agrícola sem tocar uma única árvore. A tarefa física e econômica é recuperar
pastagens, substituir pecuária extensiva por intensiva, e integrar essa pecuária intensiva com
uma agricultura de alto valor agregado, e nesse contexto enfrentar os problemas de transporte
e de insumos da agricultura brasileira.

Hoje o problema número um de transporte na agricultura brasileira é o escoamento dos
grãos do Centro-Oeste para o Norte, e problema prioritário em matéria de insumos é superar a
nossa desnecessária dependência da importação de fertilizantes.
Os fertilizantes respondem por cerca de 40% do custo dos produtos agrícolas, e o
mercado mundial de fertilizantes está na mão de um pequeno número de oligopólios. É um
verdadeiro cartel, e nós precisamos quebrar esse cartel. Paralelamente a essa tarefa
econômica e física, há uma tarefa institucional até mais importante. Sem cumprirmos a tarefa
institucional não conseguiremos levar a cabo a tarefa econômica e física.
Temos que superar o contraste nocivo que existe no País há muito tempo entre uma
agricultura familiar e uma agricultura empresarial. O desenho institucional de uma agricultura
moderna é um só, e, enquanto tivermos esse contraste, é muito grande o risco de os
problemas centrais da agricultura brasileira caírem no fosso entre esses 2 ideários agrícolas.
A primeira vertente dessa construção institucional, que nós poderíamos começar na
Amazônia dos cerrados, é a coordenação estratégica entre o Estado e o produtor, e essa
coordenação tem um conteúdo definido. Em primeiro lugar, organizar a comercialização do
produto. Quando o mercado não faz, o Estado tem que fazer como vanguarda do mercado. Em
segundo lugar, organizar o extensionismo agrícola, a assistência técnica, que foi destroçada no
País nas últimas décadas e que é a correia de transmissão indispensável entre os inventos da
EMBRAPA e a atividade do produtor rural. E, em terceiro lugar, organizar a política de preços
do seguro agrícola e o seguro de renda para resguardar a agricultura contra a combinação fatal
do risco físico e do risco econômico.
A segunda grande vertente da construção institucional é reorganização dos mercados
agrícolas do Brasil. Na maioria dos nossos mercados agrícolas em todo o País, os produtores
estão fragmentados e os fornecedores e compradores estão cartelizados. Por isso, os
compradores e fornecedores se apropriam da parte do excedente econômico da atividade
agrícola. Nós temos que reorganizar os mercados para fortalecer os produtores diante dos
compradores e dos fornecedores.
A terceira grande vertente dessa construção constitucional é o conjunto de facilidades
jurídicas e de incentivos econômicos para as práticas de concorrência cooperativa entre os
produtores. É um conceito mais amplo do que o de cooperativa no sentido estrito. Significa que
os produtores podem competir entre si, cooperar ao mesmo tempo, fazer mutirão de certos
recursos comerciais, tecnológicos ou financeiros, e com isso ganhar acesso à economia fiscal.
Uma grande tarefa de levar o Brasil para a posição número um no mundo em produção e
exportação agrícola.
O quinto conjunto de iniciativas debatidas com os Governadores e os Ministros, tem a
ver com a indústria na Amazônia. Não faz sentido tratar o tema industrial na Amazônia como
um sacrilégio. Não há projeto econômico sem indústria e já há muita indústria na Amazônia.
Na Amazônia com floresta, a indústria que temos tem quase nada a ver com a floresta.
Na Zona Franca de Manaus, a indústria produz coisas como motocicletas, é uma relação
minimalista com a floresta. Nós queremos indústrias que tenham uma relação maximalista
coma floresta, indústrias que transformem produtos madeireiros e não-madeireiros da floresta
e que fabriquem tecnologia apropriada ao manejo sustentável de uma floresta tropical.

Quase toda a tecnologia florestal disponível no mundo evoluiu para manejar florestas
temperadas, que são muito mais homogêneas do que as florestas tropicais. Nós temos que
criar essa tecnologia e, na Amazônia sem floresta, indústrias que transformem produtos
agropecuários e minerais, para agregar valor.
Nós temos, por exemplo, em muitas partes do País, uma atividade de mineração que
agrega pouquíssimo valor, e a exportação de produtos minerais representa hoje 37,5% da
nossa pauta de exportações.
Nós estamos discutindo agora a seguinte conjectura: precisamos de incentivos para
desenvolver essas indústrias, e a conjectura é que, para as indústrias florestais, os incentivos
devam ser para estabelecê-las, enquanto que, para as indústrias agropecuárias e minerais na

Amazônia sem floresta, os incentivos devem ser não para estabelecê-las, mas para empurrá-
las a agregar mais valor.

O sexto conjunto de iniciativas discutidas com os Governadores tem a ver com o
transporte multimodal na Amazônia. Nós podemos e precisamos superar a nossa fixação
histórica por transporte rodoviário e integrar os elementos rodoviários, ferroviário e aquaviário
e, ao mesmo tempo, construir a ligação entre a Amazônia e o resto do mundo.
O sétimo conjunto de iniciativas tem a ver com capacitação de recursos humanos. Sem
gente capacitada as outras 6 séries de iniciativas não irão para frente. É claro que queremos
formar quadros técnicos e científicos nas universidades da Amazônia, capazes de aproveitar
esse vasto laboratório natural, que é o bioma amazônico.
Mas a prioridade não é essa. É consertar o elo fraco do sistema escolar em todo o País,
que é o ensino médio, e construir, a começar pela Amazônia, o novo modelo de escola média
por iniciativa federal, em colaboração com Estados, uma escola média com uma fronteira
aberta entre o ensino geral, porém de orientação analítica e capacitadora — nada de
“decoreba” enciclopédica —, e o ensino técnico e profissional. Não queremos uma divisão
rígida entre ensino geral e ensino técnico. Em primeiro lugar, não queremos porque
entendemos que na evolução das economias contemporâneas o trabalhador cada vez mais
precisa dominar um conjunto de capacitações práticas e conceituais genéricas. E, em segundo
lugar, porque não queremos criar um contraste no Brasil entre o ensino de generalista para as
elites e o ensino de especialista para as massas.
Aí estão enumerados os 7 conjuntos de iniciativas que definem um projeto para a
Amazônia, que não seria exagerado chamar revolucionário. Essa é a grande revolução
brasileira, hoje. E essas iniciativas terão que ser reforçadas pela defesa da Amazônia e pela
reafirmação inequívoca e incondicional da nossa soberania na Amazônia.
Para dar força prática a essa reafirmação, nós temos de atender os 2 imperativos
centrais de defesa da Amazônia, que são: primeiro, monitoramento; segundo, mobilidade.
Poder monitorar, a partir do espaço e da terra, e poder mover as nossas forças rapidamente em
direção a qualquer problema.
Srs. Deputados, a Amazônia é hoje a nossa grande fronteira não só da geografia, mas
também da imaginação.
Da preservação, do desenvolvimento e da defesa da Amazônia resultará o
engrandecimento do Brasil. (Palmas.)

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Sr. Ministro
Mangabeira Unger a exposição.
Na continuidade dos trabalhos desta audiência pública, sugiro que, após ouvirmos 4
Deputados, passemos a palavra, para resposta, ao Sr. Ministro Mangabeira Unger.
Informo que uma nova lista de inscrição para debates está à disposição dos
Parlamentares. Portanto, quem desejar interpelar o Sr. Ministro deverá registrar seu nome na
lista.
Esclareço ao senhor expositor e aos Srs. Parlamentares que a reunião está sendo
gravada para posterior transcrição e, por isso, solicito que durante suas exposições falem ao
microfone.
Cada expositor terá o prazo de 3 minutos e o interpelado o tempo que achar necessário
para responder, facultadas a réplica e a tréplica. Cada Parlamentar que se dirija ao Sr. Ministro
terá o tempo de 3 minutos, tendo igual tempo o Sr. Ministro para resposta.
Os apartes e interpelações deverão ser feitos estritamente quanto ao assunto objeto da
convocação, nos termos regimentais.
Concedo a palavra ao nobre Deputado Marcio Junqueira, do DEM, de Roraima.
O SR. DEPUTADO MARCIO JUNQUEIRA – Sra. Presidenta, Sr. Ministro Mangabeira
Unger, Sras. e Srs. Deputados, primeiro, Sr. Ministro, quero agradecer e reconhecer a sua
desenvoltura e o seu compromisso o qual tinha assumido na reunião passada de voltar, assim
cumprindo aquilo que V.Exa. tinha estabelecido. Por isso, agradecemos a V.Exa.
Serei breve, pois já tivemos oportunidades, em momentos diferentes, de falar sobre as
questões. Volto a insistir que, pelo fato de a Amazônia representar metade deste País, pelo fato
de a Amazônia representar o nosso maior bem no que diz respeito aos recursos hídricos, à
biodiversidade. Insisto que temos que discutir de forma ampla, e vejo o senhor buscando este
caminho.
No entanto, entendo também que não podemos achar que somos, Deputado André de
Paula, detentores do conhecimento para discutirmos sozinhos. Precisamos de auxílio, de
apoio, de opiniões de brasileiros comprometidos com esta Nação. Vou sempre insistir, de
brasileiros, pois o que vemos é que a condição da Amazônia chegou ao ponto que chegou em
função da ausência do Estado e de pseudos amazônidas que se julgam detentores do
conhecimento total. Não. A Amazônia se divide em várias e diferentes realidades. A Amazônia
conta com biomas diferentes.
Eu vejo aqui muitas críticas, muitas acusações, mas não vejo ninguém falar, nem ouço
que a BASF, que a VERBATIM, lá no Estado do Amazonas, têm resíduos químicos que estão
sendo depositados em algum lugar. Mas isso é necessário, pelo que Manaus representa.
Agora, vejo acusações levianas quando dizem que o meu Estado de Roraima foi, depois
do Mato Grosso, o segundo Estado que mais desmatou. Ora, conheçam. Que fique registrado
na Comissão que Roraima é o Estado da Federação, é o Estado da Amazônia que tem a
condição única de plantar sem desmatar. Em Roraima nós não precisamos derrubar uma
árvore sequer para plantar. E são realidades diferentes, como a realidade do Acre, do
Amazonas, do Amapá, a realidade de Rondônia, do Pará. O que nós não podemos é ficar com

infantilidade e com critérios para satisfazer pessoas que na verdade querem nos tirar a
Amazônia.
O Deputado Giovanni Queiroz colocava, na sua interpelação na reunião passada, o que
representa o Pará na conjuntura nacional e, por que não dizer, mundial? Porque é muito fácil
criticar quando não se sabe de onde vem um bife saboroso, um belo pedaço de carne, de
proteína, do qual todos nós seres humanos — não há outro modo ainda, precisamos. Ele vem
de um animal que precisou de pasto de fato. Agora, existem novas tecnologias que temos que
discutir. Temos capacidade de discutir.
Vejo que o Ministro Mangabeira Unger tem essa preocupação. Mas o que eu peço,
Ministro, é que V.Exa. escute os amazônidas, que V.Exa. escute quem vive a realidade do dia a
dia. Naturalmente, escutando nossos irmãos do Nordeste, do Centro-Oeste, do Sul. Não
importa. O que importa é que brasileiros discutam o nosso maior bem, que é a Amazônia.
Assim, termino a minha exposição. Não vou fazer nenhum questionamento neste
momento. Sobre a regularização fundiária, quero inclusive parabenizar o senhor sobre a
postura com relação ao INCRA, que, de fato, tem-se tornado um empecilho neste País,
principalmente na região Amazônica, porque o INCRA não tem projeto nenhum, a não ser usar
as superintendências de forma política para eleger candidatos a Governo, a Prefeito, a
Deputado, à custa de uma instituição pública, assim como a FUNAI, como o IBAMA, que são
os exageros da política.
Nós temos que ter maturidade, e entendo que estamos a caminho dela.
Agradeço a paciência da Presidenta.
Sr. Ministro, a Deputada Maria Helena gostaria de saber a sua opinião sobre o trabalho
do INPE realizado na Amazônia.
Muito obrigado, Sra. Presidenta.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado Marcio
Junqueira.
Passo a palavra ao Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, do PSDB de São Paulo.
O SR. DEPUTADO ANTONIO CARLOS MENDES THAME – Sra. Presidenta, Sras. e
Srs. Deputados, Sr. Ministro, é um privilégio poder aqui compartilhar desse momento em que
nós temos a prerrogativa de poder fazer algumas perguntas diretas, objetivas, para sabermos a
sua opinião a respeito de alguns assuntos.
A visão que nós temos do enfrentamento de questões ambientais é de que só se
conseguem resultados eficientes se nós atuarmos ao mesmo tempo em 3 vertentes: legislação,
investimentos públicos e privados e, terceiro, conscientização e gestão compartilhada.
O terceiro item, conscientização, muitas vezes é esquecido, mas é importantíssimo. Se
já tivéssemos a consciência, não só em São Paulo, nos Estados maiores consumidores de
madeira, mas na Europa e nos Estados Unidos de que deve ser exigida a certificação, o
rastreamento da madeira, e de que não se deveria comprar móveis cuja madeira adviesse de
desmatamento da Amazônia, nós já teríamos um grande caminho andado.
A segunda vertente, investimentos, está muito ligada ao que V.Exa. propõe, que é o
Plano Amazônia Sustentável sob seu comando. São investimentos públicos claríssimos para

ajudar na fiscalização, na criação de infra-estrutura adequada, investimentos em tecnologia e
desenvolvimento de pesquisa para poder aproveitar melhor os produtos da madeira. Está claro.
Mas há um terceiro ponto, que é a legislação, proposta por V.Exa., hoje, aqui no
Parlamento brasileiro. Portanto, permita-me focar somente nesse ponto da legislação para
ouvir a sua opinião a respeito do nosso papel.
O Nicholas Stern, no seu relatório recente, disse que as mudanças climáticas constituem
a mais grave falha de mercado. Portanto, uma distorção de mercado, o mercado falhou na
história do capitalismo. E o mercado age implacavelmente, a todo momento, criando uma
dinâmica. As forças de mercado vão selecionando os produtos mais baratos para produzir o
melhor produto pelo menor preço. Em suma, para se fazer um bom negócio.
A única forma de influir no mercado é por meio do Governo, que o faz por meio de
investimentos e de leis.
O Estado atua através das suas leis, do arcabouço jurídico, em 2 famílias. Uma é a
família de leis de comando e controle; outra, a de leis de incentivos. Foi graças a essas 2
famílias que temos hoje o PROALCOOL, o álcool brasileiro. Na década de 70, houve uma
dupla intervenção do Estado na área de comando e controle, com medidas compulsórias,
obrigatórias para mistura de 20%, na época, de álcool à gasolina; e medidas de incentivos,
brutais subsídios para diminuir o custo de produção do álcool, que era o dobro da gasolina.
Quinze anos depois, as medidas de incentivos desapareceram. As medidas compulsórias
continuaram criando esse mercado permanente que permitiu se instalar uma curva de
aprendizagem, que fez com que o custo de produção do álcool caísse para mais da metade e
hoje ele custe 40% a menos que o custo de 1 litro de gasolina.
Objetivamente, as minhas perguntas são as seguintes. Na área de comando e controle,
nós temos em votação, hoje — neste momento foi interrompida porque começou a votação em
plenário — uma PEC que estende para crimes ambientais de devastação acima do percentual
exigido de reserva legal as mesmas punições para o cultivo de psicotrópicos em áreas
brasileiras. Ou seja, quem for pego, depois de um prazo, sem ter recuperado a reserva
devastada, terá sua propriedade sujeita a uma expropriação sem pagamento.
Queria ouvir a sua opinião a respeito. Esta está em votação e parece que o Governo
está favorável. Imagino que seja favorável, porque depois serão discutidos os detalhes na
comissão que vai ser formada. Por enquanto, está na Comissão de Constituição e Justiça.
Sobre a área de incentivos, queria ouvir a sua opinião a respeito de 3 leis. Uma, a lei que
cria, realmente, incentivos para a produção florestal, uma economia da floresta, como é a
legislação de Costa Rica e outros países que dão brutais incentivos, isenções para quem
trabalha com extrativismo. Não é só estabelecer preço mínimo, mas incentivos fiscais para que
fique realmente interessante manter aquela floresta em pé como fonte de renda.
Segunda pergunta: o Brasil não tem uma legislação que permita o patenteamento de
invenções e descobertas a partir de seres vivos. Um médico brasileiro, em Ribeirão Preto,
percebeu que, quando a jararaca mordia uma pessoa, a sua pressão arterial despencava, e
imaginou que no veneno da jararaca houvesse um hipotensor. Isolou o princípio ativo e não
pode patentear. A Pfizer o fez no exterior e criou o Captropil, vendido com o nome de Capoten,
e nós ficamos a ver navios.

Qual é a sua opinião a respeito de uma legislação que permita esse patenteamento para
explorarmos o nosso patrimônio genético?
E, terceiro, nós temos uma legislação muito fraca a respeito de partição de benefícios —
essa é uma discussão internacional. Estamos tendo dificuldades em fazer uma regulamentação
da conversão da biodiversidade que foi votada também aqui na Rio 92. Em 1997, o Protocolo
de Kyoto regulamentou a convenção de mudança do clima, mas a convenção de
biodiversidade até hoje não foi regulamentada em nível internacional. Mas, em âmbito nacional,
nós temos uma lei incompleta, que não estimula. Qual é a sua opinião a respeito de nós
reformularmos esta lei para termos um instrumento que estimule o uso sustentável, legalizado,
por empresas brasileiras para explorar essa riqueza imensa, que é o nosso patrimônio
genético, como fármacos, cosméticos e outros produtos?
São essas as perguntas.
Muito obrigado. É um prazer e uma satisfação tê-lo aqui conosco.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado.
Passo a palavra ao Deputado Francisco Rodrigues, do DEM de Roraima. (Pausa.) Não
se encontra presente. Repasso a palavra ao Deputado José Genoíno, do PT de São Paulo.
(Pausa.). Também não se encontra presente. Passo a palavra ao Deputado Francisco
Praciano, do PT do Amazonas. (Pausa.) Ausente.
Com a palavra o Deputado Moreira Mendes, do PPS de Rondônia.
O SR. DEPUTADO MOREIRA MENDES – Sra. Presidenta, Sr. Ministro, estou aqui
substituindo o Presidente Paulo, que precisou se ausentar, com muita honra. Quero
dizer a V.Exa. que participei, na semana retrasada, do início da audiência pública e quero
parabenizá-lo pela iniciativa de voltar a esta Casa para concluir aquilo que iniciamos naquela
data. Eu, naquele dia, cheguei tarde — e isso aqui é uma coisa muito complicada, porque
temos que correr da sala para a cozinha a fim de resolver o problema de estarmos em várias
comissões ao mesmo tempo — e não ouvi todo o seu pronunciamento. Mas tive o cuidado de
pedir as notas taquigráficas e li atentamente todo o seu pronunciamento daquele dia. E quero
confessar a V.Exa., com muita alegria, que finalmente –– isso é uma avaliação pessoal –– eu
encontro uma pessoa que ocupa uma posição de destaque na Administração Pública Federal
que verdadeiramente se preocupou com a questão da Amazônia.
Falar da Amazônia é muito romântico. Até as socialites do Rio de Janeiro, no chá das
17h, resolvem um dia fundar uma ONG para cuidar de uma árvore da Amazônia sem ter a
menor noção do que seja aquilo, da sua realidade, quem vive lá, qual o nosso problema.
Quero dizer ao senhor que eu represento o Estado de Rondônia. Sou paulista,
paulistano, e resido na Amazônia com muito orgulho há 36 anos. Sou testemunha viva de tudo
o que aconteceu, sobretudo no meu Estado, Rondônia, que foi um exemplo de colonização
para o Brasil, do INCRA, que fez uma colonização exemplar e onde se privilegiou a pequena
propriedade. Todas essas pessoas do Brasil inteiro estão em Rondônia, de norte a sul, de leste
a oeste. Foram para lá ocupar terra, plantar, produzir e, agora, são escorraçados, ou pelo
menos os desinformados, os que não conhecem a nossa realidade, os que tratam a Amazônia
com romantismo e imaginam que fazendo leis cada vez mais rígidas… Acabou de citar o
Deputado Antonio Carlos Mendes Thame, por quem tenho o maior respeito, uma proposta de

emenda constitucional de sua autoria que discutimos há pouco na CCJ, que vai no mesmo
caminho.
Uso uma expressão popular que diz o seguinte: não é na teia que vamos conseguir
resolver o problema do desmatamento na Amazônia; não é por aí. Enquanto o Governo, as
autoridades e as ONGs não entenderem que necessariamente é preciso conversar com os 25
milhões de brasileiros que vivem lá, não vamos conseguir avançar em nada.
É preciso valorizar a floresta em pé; é preciso pagar ao produtor brasileiro, que reside lá
para que ele seja um fiscal da Amazônia. Tudo isso está contido nas suas palavras.
Por isso quero muito mais do que fazer perguntas… V.Exa. foi tão brilhante no seu
posicionamento, que é irretocável. Só tenho dúvidas com esse rancor que ainda existe, com
esse ranço que há das pessoas que não compreendem a Amazônia, se o Governo aqui
representado pelo senhor vai conseguir implantar tudo aquilo que o senhor está propondo, que
é o único caminho: valorizar a floresta, valorizar o homem, educar o homem, aplicar
tecnologias. Não há outra forma.
Quem imagina que vai conseguir transformar esses 22 milhões, esses 25 milhões de
brasileiros, na sua palavra, em aborígenes, está redondamente enganado porque isso não vai
acontecer. Temos, sim, a responsabilidade de preservar.
Sou um modesto proprietário rural. Quero dizer a V.Exa. que, quando fui para lá, a
primeira coisa que comprei foi uma propriedade rural. Comprei e paguei com meu dinheiro, não
achei na rua, não ganhei de ninguém. Então, não é legítimo que alguém venha agora dizer que
eu não posso fazer daquilo que eu comprei, paguei, o que eu quero. Mas quando eu comprei,
tínhamos um limite de 50%, que foi preservado. Hoje, tenho a consciência, e quero dizer a
V.Exa. que, se fosse começar hoje, não derrubaria nem os 50% que derrubei. Isso é uma
consciência pessoal minha que foi evoluindo.
Agora, não podemos simplesmente esquecer essa realidade, tratar como se nada disso
acontecesse.
Estive, na semana passada, no sul do meu Estado, na região do CONESUL, região de
campo, de cerrado. Temos um erro, e V.Exa. o trata com muita propriedade: a Amazônia legal é
uma coisa, e o bioma amazônico é outra coisa completamente diferente, e por isso não pode
ser tratado igual. Há um erro, há um equívoco nessa questão que está na Medida Provisória no
2.166.
Não quero me alongar muito, Ministro. Apenas digo que estou muito satisfeito em ouvi-lo.
Aliás, eu não ouvi; eu li, mas, quando cheguei, aqui percebi que o senhor repetiu muito daquilo
que disse naquele dia.
Ontem à noite, acompanhando o Governo do meu Estado, estive numa visita ao Ministro
do Meio Ambiente.
Ontem à noite, acompanhando o Governador do meu Estado, estive numa visita ao
Ministro do Meio Ambiente. E quero aqui publicamente dizer que fiquei impressionado com o
posicionamento do Ministro. Imaginava uma coisa e encontrei outra. Imaginava um radical que
não entendesse o nosso problema, mas percebo que pelo menos, embora tenha o discurso do
radical de prender o boi voador, de botar a Polícia para prender, para bater, na prática, na
nossa frente, tem um discurso mais centrado, procura o diálogo, quer promover o

entendimento, no sentido de encontrar soluções práticas para a questão da Amazônia. Lá, no
Pará, parece que ele já fez o encaminhamento, no sentido de encontrar um caminho.
Ministro, quero que V.Exa. continue com essa bandeira. Sou de um partido de oposição,
mas estou aqui dizendo para V.Exa. não desempunhar essa bandeira. O caminho é este. Tudo
o que V.Exa. disse é o que há. Temos de promover a regularização fundiária, o zoneamento.
Quero dizer a V.Exa. que o meu Estado foi o primeiro Estado brasileiro a ter zoneamento
sócioecológico e econômico. Ali, está tudo definido o que pode, onde pode, como pode e
quando pode ser feito. É valorizar a floresta em pé.
Agora, não podemos com esse discurso rancoroso de não se comprar a soja da
Amazônia, de não se comprar o boi da Amazônia, de não se comprar a madeira da Amazônia.
Isso é um absurdo, mas é o que ouvimos. Na CCJ não ouvi outra coisa: não à soja da
Amazônia, não ao boi da Amazônia, não à madeira da Amazônia, não ao desenvolvimento da
Amazônia. E como fica o povo que vive lá, sem alternativa alguma?
Todos são bons para propor alguma coisa, mas não ouvi um ainda que propusesse: nós
vamos tirar desse lado, mas vamos dar desse lado. E V.Exa. está com esse discurso,
reconhece que há um exagero, que precisamos realmente controlar a devastação e a questão
do meio ambiente, mas por outro lado reconhece que é preciso estender a mão aos 25 milhões
de brasileiros que estão lá.
Essas são as minhas considerações ao Ministro e parabéns pelas suas palavras.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Solicito ao Deputado Moreira
Mendes que assuma a Presidência dos trabalhos, a fim de que eu possa participar dos
debates.
O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Presidente, peço a palavra pela ordem.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Pela ordem. V.Exa. tem a palavra.
O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Apenas para encaminhamento, quero sugerir
que ao falarem 3 ou 4 Deputados, pudéssemos ouvir o Ministro, para que a coisa não se
esgotasse na palavra dos Deputados e se perdesse a lógica do raciocínio daqueles que
primeiro falaram. Isso ocorreu da vez anterior, e não podemos ouvir do Ministro as
ponderações ou as suas considerações a respeito daquilo que suscitávamos durante o debate.
Portanto, entendo que o Ministro poderia agora fazer alguma consideração, se S.Exa.
entender que deva fazê-lo sobre as colocações dos demais companheiros e prosseguir.
Ouvimos mais 4 e novamente devolvíamos a palavra ao Ministro para suas considerações.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Ilustre Deputado, quero lhe informar
que, assim que cheguei a este plenário, ouvi a Deputada Janete Capiberibe já estabelecer esse
critério: depois que 4 Parlamentares usassem da palavra, o Ministro responderia. E ela é a
quarta.
O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – E eu distraído não devo ter ouvido, porque
da vez anterior falamos 8.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Então, vamos ouvir agora a
Deputada Janete Capiberibe, a quem passo a palavra. Em seguida, volto a Presidência a S.Sa
para ouvir as respostas do Ministro.

A SRA. DEPUTADA JANETE CAPIBERIBE – Sr. Presidente, Deputado Moreira Mendes,
Sr. Ministro, Sras. e Srs. Parlamentares, senhores e senhoras presentes na audiência pública
que ora acontece.
Quero rapidamente deixar uma pergunta a o Sr. Ministro. Segundo sua exposição, o
PAS, Plano Amazônia Sustentável, está pensado para todas as suas etapas, do início da
implantação, considerando todos os aspectos, até o final, segundo o plano. Quer dizer, aliar
desenvolvimento com sustentabilidade social, ambiental, econômica.
Sabemos que cerca de 1 bilhão de reais existem, se é que existem, para a implantação
do PAS. Quero tirar essa dúvida. Pergunto: que obras estão previstas pelo Governo Federal
para serem executadas com esse recurso? Que instituição federal será a executora desse
orçamento?
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Devolvo a Presidência à Deputada
Janete Capiberibe.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Repasso a palavra ao Líder do
PR, de Roraima, Deputado Luciano Castro. O Deputado é o último inscrito para este primeiro
bloco de perguntas. Em seguida, o Ministro fará suas explicações.
Com a palavra o Deputado Luciano Castro.
O SR. DEPUTADO LUCIANO CASTRO – Sra. Presidenta, Sras. e Srs. Deputados,
saúdo o nosso Ministro e digo da nossa honra em recebê-lo. Quero externar a V.Exa. algumas
preocupações.
Primeiramente, V.Exa. coloca com idéias bastante ajustadas todo esse novo
planejamento e a concepção do novo modelo de desenvolvimento da Amazônia. Agrada-nos
bastante, e acho que aqui no plenário não há um único Deputado que não se agrade em ouvir
esse planejamento e as idéias de V.Exa.
A pergunta primeira que se faz é a seguinte: até onde o Governo vai estar comprometido
com isso? Quando V.Exa. fala em estabelecer para a Amazônia, por exemplo, um pólo em
desenvolvimento industrial diferenciado –– e até faz referência à Zona Franca de Manaus ––,
não há nenhum ajuste com a floresta num pólo eletroeletrônico. Vamos criar um modelo
industrial que possa se utilizar dos benefícios da floresta, por exemplo, biocosméticos, indústria
madeireira. Qual o compromisso do Governo até aí? Quais as linhas de financiamento que
serão obtidas para a implementação de um programa industrial efetivamente competitivo dentro
da Amazônia?
Uma outra questão que V.Exa. apresenta é a questão dos cerrados, muito próximos ao
Mato Grosso, mas sabe também que em Roraima, na região central do Estado, temos uma
região de campos, que difere até um pouco da Amazônia extensiva, que sai do Mato Grosso
para cima.
Incomoda-me muito a posição agressiva do Ministro do Meio Ambiente referente ao
Governador Blairo Maggi. O Governador Blairo Maggi é um homem determinado, produtor de
altíssimo nível, um homem que contribui decisivamente para a pauta de exportação do País.
Estou falando como produtor, não estou falando nem como Governador. Todas as mazelas de
desmatamentos são contabilizados nas costas do Governador Blairo Maggi.

O Governo — e eu sou Líder da base do Governo — tem um modelo ocupacional da
Amazônia –– e V.Exa. descreveu bem isso ––, de assentamento na Amazônia que são
desvastadores. E V.Exa. foi claro quando disse: não dá para fazer. Pensar em
desenvolvimento, em desenvolvimento sustentável, sem recursos e sem estabelecer um critério
de ocupação, inclusive da regularização fundiária.
V.Exa. começou a colocar isso como uma prioridade. Como o zoneamento econômico,
ecológico de toda a região, para que a gente possa definir exatamente o que queremos.
Por exemplo, um modelo de assentamento. Colocam-se assentados na região sem a
mínima condição. Sabe o que eles fazem? Eles a queimam, porque é a sua forma de
sobrevivência, é mais barato. Ele queima porque não tem tostão algum para isso.
Não há, por parte do Governo, por exemplo, um programa de mecanização diária para a
produção de alimentos na áreas que já estão desmatadas e que podem ser altamente
produtivas. Isso não acontece por parte do Governo? Não há dinheiro definido, não há um
programa. Como V.Exa. disse, não há assistência técnica. O INCRA faz essas ocupações de
forma desordenada e, depois, larga a conta com os Estados, que são os que ficam mantendo
todo esse grupo de assentados que vivem miseravelmente e que nunca sairão do grau de
pobreza, tentando sobreviver a qualquer custo. É desse modelo diferenciado da Amazônia que
precisamos.
Acho que V.Exa., na sua proposta, tenta mudar isso. O nível de comprometimento do
Governo precisa estar claro na proposta, com ações concretas. Por outro lado, da outra vez
que V.Exa. esteve na Comissão de Relações Exteriores, fiz-lhe uma pergunta e, como eram
muitas, V.Exa. não me esclareceu. Estou neste Congresso há 18 anos e sempre falou-se muito
da internacionalização da Amazônia, de interesses escusos na nossa área, e isso era muito
utopia, era discurso de Deputado. Era discurso de Deputado! Só que, no início do Governo
Lula, começamos a falar muito a respeito e não deram muita importância ao assunto.
Mas, agora, o tom mudou. O Presidente da República começou a mandar recado,
dizendo que a Amazônia brasileira é dos brasileiros. Repetidas vezes ele tem falado isso. O
Presidente da República mandou atuar de forma rigorosa em cima das ONG’s da Amazônia,
determinando que se verificasse essa compra de áreas por estrangeiros na Amazônia.
A pergunta é a seguinte, Ministro: acendeu a luz vermelha no Governo, que descobriu
algo que já estamos falando há muito tempo, ou seja, de que os interesses sobre a Amazônia
não estão… Não vamos ter, na Amazônia, uma invasão armada, não! Vamos ter na Amazônia
uma invasão econômica, de posse e, quando abrirmos os olhos, já não teremos mais controle
sobre a área. Assim, serão discutidos nos tribunais internacionais os interesses econômicos
daqueles que estão em busca de tomar ou de controlar esse pedaço do Brasil.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Concedo a palavra ao Sr.
Ministro, para responder a esse primeiro bloco do debate. Em seguida, continuaremos com os
novos inscritos — 4 para o próximo bloco.
Informo ainda que os próximos oradores são os Deputados Leonardo Monteiro, Sergio
Petecão, V.Exa., Ricardo Tripoli, Wellington Fagundes, Neudo Campos, Giovanni Queiroz,
Homero Pereira, José Geraldo, do Pará, e Elcione Barbalho, do PMDB do Pará. Também está

conosco a Deputada Marinha Raupp, que não estava presente no momento em que
anunciamos.
Com a palavra o Sr. Ministro.
O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muitas das observações feitas
pelos Srs. Deputados são de natureza geral, as observações dos Deputados Márcio Junqueira
e Moreira Mendes, de um lado, e dos Deputados Mendes Thame e Luciano Castro de outro.
Devo dizer que concordo com todas as observações gerais que foram feitas, não
discordo de nenhuma delas. Muitas vezes, nesse início de debate nacional a respeito da
Amazônia, encontro-me na seguinte situação peculiar: meu interlocutor discorda de mim, mas
eu concordo com ele. Atribuo essa circunstância peculiar à tendência de enfatizar um aspecto
da problemática, seja desenvolvimentista, preservacionista ou de defesa. Se há ou não
contradição entre esses objetivos, é algo que só poderemos determinar se levarmos a
discussão a um plano mais concreto. Enquanto permanecermos nesse plano das abstrações
doutrinárias ou da enumeração de preocupações, estaremos apenas reafirmando valores
legítimos, mas não estaremos resolvendo o problema estratégico do que fazer amanhã.
Então, aprecio todas essas discussões, mas confesso uma preocupação minha: que
esse Projeto Amazônia é para nós, brasileiros de nossa geração, uma oportunidade não só de
transformação nacional como de união nacional, porque os problemas e as soluções na
Amazônia não são encontráveis no mapa das ideologias tradicionais. Exigem inovações
institucionais. Então, nós não deveríamos abordar essa problemática como uma oportunidade
de reafirmar, de maneira mecânica, os contrastes ideológicos herdados. Seria desperdiçar a
grande oportunidade inventiva e unificadora que temos aqui.
Então, se tenho uma discordância em relação a algumas das observações, é muito
menos uma discordância quanto ao conteúdo do que uma discordância quanto ao tom. Eu
gostaria de mudar o tom do nosso debate, mas eu não sei como fazê-lo. Eu gostaria que o tom
fosse de desarmamento espiritual, que nós nos uníssemos na procura de um objetivo comum
que nós temos e que não sabemos ainda como realizar.
Vou ser muito direto sobre isso. Criou-se no País a impressão de haver um combate
entre desenvolvimentistas e ambientalistas. E há um combate entre alguns extremados. Mas o
nosso problema não é esse, o nosso problema não é o combate. O nosso problema é a
confusão. É que nós convergimos sobre um objetivo que ainda não sabemos na prática como
efetivar. Estamos tentando descobrir. Então, a atitude propícia a essa descoberta é uma atitude
de abertura, de falta de preconceito, de dúvida, e não de polêmica. Esse é, portanto, o meu
registro.
Quantos às propostas específicas citadas pelo Deputado Antonio Carlos Mendes Thame,
em geral me parecem boas, mas eu não vou emitir uma opinião sobre esta ou aquela proposta
de lei sem estudá-la muito, sem passar muitas horas estudando, consultando, ouvindo e
discutindo. Não vou ter reações instantâneas sobre nada, porque, se eu fizesse isso, eu estaria
traindo a minha função, que é ajudar a coordenar, a unir, a suscitar a descoberta de um
caminho.
Se tenho uma observação em relação às propostas citadas pelo Deputado Antonio
Carlos Mendes Thame é que, no passado, demos ênfase demais ao negativo e ênfase de

menos ao positivo. Se tivermos um ambientalismo carente de agenda econômica construtiva,
acabaremos por ter uma concepção do problema do meio ambiente como a concepção que
tinha o Presidente Washington Luís da questão social: que era um caso de polícia. Mas não é
um caso de polícia, embora a polícia possa ser pontualmente necessária. É um caso de
imaginação e de construção institucional, de resolução de problema. Então, em geral, proponho
menos ênfase nas punições e mais ênfase nas construções e nos incentivos.

Em relação ao comentário da Deputada Janete Capiberibe, quero corrigir um mal-
entendido. O PAS não está definido assim, como uma planilha do começo ao fim. Não é isso. O

PAS é um conjunto de diretrizes e de compromissos. O caminho, nós agora vamos construir, e
vamos construir coletivamente.
Fico perplexo quando me perguntam o que vai acontecer daqui a 2 anos e como vai ser
resolvido isso, resolvido aquilo, como se eu fosse um pequeno ditador para decidir e revelar o
conteúdo desse plano secreto. Não é assim. É uma obra coletiva em construção. E estou
tentando acelerar desde já o processo pela definição dos 7 conjuntos de iniciativas que
enumerei. O método subjacente é o método de tratar do longo prazo a curto prazo, quer dizer,
encontrar ações que possam começar já e que sinalizem um caminho.
Aí, surge um problema transversal, por assim dizer, que não abordei nos meus
comentários iniciais e que é o seguinte: se tentarmos deslanchar todas essas iniciativas que
descrevi, simultaneamente, em todo lugar na Amazônia, é muito grande o risco de não
conseguirmos, no tempo politicamente disponível, alcançar o grau de densidade e de
coordenação dessas iniciativas, necessário, primeiro, para surtir o efeito transformador e,
segundo, para desempenhar a função sinalizadora, de sinalizar o caminho que queremos
seguir.
Por isso, propus, em Belém, aos Governadores e ao Presidente que identificássemos
em toda a Amazônia algumas microrregiões e que procurássemos, na primeira etapa,
concentrar e coordenar as iniciativas naquelas unidades territoriais. Dessa forma, correndo
contra o tempo, contra o relógio, temos uma chance maior de alcançar o patamar crítico de
densidade das iniciativas, para que possam fazer diferença e mostrar o caminho. Esse é um
princípio metodológico muito importante. Pedi aos Governadores que nos próximos dias
formalizassem as suas propostas iniciais de quais microrregiões em seu Estado devem ser
candidatas a esse papel, o papel de servir de terreno privilegiado desse experimentalismo
institucional que nos propomos a fazer.
Em relação à indagação do Deputado Luciano Castro sobre o modelo industrial, devo
dizer que precisamos de um grande avanço industrial na Amazônia também: como eu disse, na
Amazônia florestada, indústrias localizadas nas cidades e nas periferias urbanas capazes de
transformar produtos florestais e de fabricar tecnologia florestal; na Amazônia sem floresta,
indústrias capazes de elevar o nível de agregação de valor daquela economia — agregação de
valor na transformação dos produtos minerais e na transformação dos produtos agropecuários.
A idéia principal, por enquanto, não é investimento direto do Estado nessas indústrias,
porque não seriam indústrias estatais. A idéia são os incentivos, como a Zona Franca é um
sistema de incentivos. Aí surge a questão: a que devem ser dirigidos os incentivos? E aí é que
vem aquela conjectura que citei, que há uma distinção a fazer. As indústrias florestais são uma

novidade. Então, a nossa idéia, provisoriamente, é que os incentivos para as indústrias
florestais devem ser para o seu estabelecimento, para instalá-las. Porque, sem incentivos, elas
não serão instaladas. Mas, para as indústrias de transformação agropecuária e mineral, que
seriam parte de cadeias produtivas de setores já organizados da economia, faz mais sentido
dirigir os incentivos não para a instalação das indústrias, mas para subir a escala de agregação
de valor. O que queremos é ter uma intensificação de valor na Amazônia sem floresta, é essa a
idéia.
A internacionalização da Amazônia é uma preocupação agora compartilhada em todo o
Governo e em todo o País. Eu não sei datar, Sr. Deputado, o momento em que acendeu a luz
vermelha, eu não sei se houve um momento. O que posso dizer é que todos estamos
preocupados com isso e compreendemos que temos de tomar um conjunto de medidas —
medidas emergenciais e acauteladoras, de um lado, e medidas estruturais de outro.
As medidas emergenciais e acauteladoras têm a ver com uma possível revisão das
nossas leis. Elas talvez sejam excessivamente permissivas em relação à penetração da
Amazônia por interesses estrangeiros. E nós estamos estudando isso, o Governo está
estudando isso e está considerando uma série de opções. É uma preocupação muito viva na
consciência do Governo, assim como na consciência de todo o País. As medidas estruturais
têm a ver com o próprio projeto de desenvolvimento econômico, já que uma área
economicamente vazia é praticamente indefensável, e com o projeto de defesa, no qual as
nossas grandes preocupações são o binômio que citei, de monitoramento e mobilidade.
Agora, Srs. Deputados, quero externar uma preocupação processual que tenho, por
conta do grande valor que dou a essa colaboração com os senhores. Como eu disse no início
da minha reflexão preliminar, estarei sempre disponível. Se os senhores me quiserem aqui toda
semana, eu virei toda semana, mas vou acabar entediando esse grupo. Tenho a impressão,
talvez por inexperiência minha, que esse formato, embora útil, não é suficiente para o objetivo
de colaboração que desejo, porque é muito formal. Então, há esse rito de eu fazer uma
palestra, os senhores fazerem intervenções em 2 minutos… Não é uma relação de trabalho.
Serve para desenvolver idéias e para compreendermos onde estamos nas nossas concepções.
Eu gostaria de construir uma relação de trabalho, mas não sei como fazer isso. Uma idéia que
tenho é estabelecermos um pequeno grupo de trabalho de Parlamentares em relação a cada
um daqueles 7 temas, daqueles 7 conjuntos de iniciativas que citei. E que os senhores me
permitissem de fato trabalhar com esses 7 pequenos grupos e, com isso, introduzir o
Congresso no íntimo da formulação do desdobramento do Plano Amazônia Sustentável. Não
sei, para ser franco, se isso viola alguma regra do Congresso ou alguma norma de cortesia na
separação dos poderes, mas me confesso ansioso para encontrar um procedimento que nos
permita institucionalizar uma relação de trabalho. Então, eu gostaria de ouvir dos senhores
propostas e de saber se há alguma maneira de viabilizar a sugestão que dei agora.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Obrigada, Sr. Ministro.
Vamos debater esse assunto na Comissão da Amazônia. Hoje à tarde, às 14h, teremos
reunião deliberativa, quando poderemos levar à consideração das Sras. e dos Srs. Deputados
da Comissão a sua proposição. V.Exa. tomará conhecimento da resposta imediatamente.

As audiências públicas ocorrem segundo o Regimento Interno da Câmara Federal. Esse formato, não podemos modificá-lo. No entanto, podemos debater, sim, a criação de um grupo
de trabalho das Comissões da Amazônia e do Meio Ambiente para debatermos com V.Exa.
esses 7 itens enfatizados aqui para o início da implantação do PAEs.
Passo a palavra ao Deputado Sergio Petecão, do PMN do Acre.
O SR. DEPUTADO SERGIO PETECÃO – Cumprimento a Sra. Presidenta, Deputada
Janete Capiberibe, o Deputado Moreira Mendes e o Ministro Mangabeira Unger.
Na verdade, Sr. Ministro, vou ser bem objetivo, até para facilitar as suas respostas.
Todos sabemos que se tem debatido muito a respeito do plantio de cana-de-açúcar na
Amazônia. Nós, no Acre, temos uma pequena experiência. De certa forma, criou-se uma
expectativa na população do Estado e do Município de Capixaba, porque temos no Acre o
grande problema do desemprego. Esse empreendimento está parado em razão do

entendimento de alguns setores do Governo Federal de que não se pode plantar cana-de-
açúcar na Amazônia. Estou falando nas áreas degradadas e não em derrubar um palmo de

floresta. Refiro-me às áreas que já estão totalmente devastadas.
Quero saber qual o seu entendimento a esse respeito e qual a política do Governo
Federal, de concreto, no que diz respeito à plantação de cana-de-açúcar na região amazônica,
em especial no Estado do Acre, o meu Estado.
Realizamos, nesta semana, um seminário em Rio Branco, no qual contamos com a
participação de vários Parlamentares. Vale registrar que o Deputado Moreira Mendes nos deu o
prazer de participar do seminário, assim como alguns Parlamentares desta Casa. O evento foi
realizado mediante parceira firmada entre a Comissão da Amazônia e o SINDRECEITA. Na
ocasião, debatemos a integração entre Brasil e Peru. Todos sabemos que temos ali a BR-317,
que faz essa ligação. Criou-se uma perspectiva muito grande, não só no nosso Estado, como
nos Estados de Rondônia e Mato Grosso, de mantermos uma relação com o país vizinho, o
Peru, e conseqüentemente chegarmos ao Oceano Pacifico por meio dessa estrada.
Todavia, preocupa-me o fato de que foram investidos milhões e milhões de reais por
conta do Governo brasileiro e do Governo peruano, tendo em vista que a parte peruana não foi
concluída, mas há previsões no sentido da possibilidade de ser concluída até o ano de 2010.
Quero saber quais são as estratégias, por parte do Governo Federal, de investimento nessa
região, se é que o Governo brasileiro tem interesse nessa saída do Brasil com o Peru. O meu
medo é que essa estrada se transforme num mero corredor de tráfico de drogas. V.Exa. sabe
que ela também faz ligação com o Peru e a Bolívia. E se não tivermos uma política de
desenvolvimento para aquela região, poderemos ter uma estrada que vai ligar nada a coisa
alguma. Portanto, quero saber se o Governo Federal tem interesse no desenvolvimento
daquela região e também na plantação de cana-de-açúcar na Amazônia, em especial no
Estado do Acre.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Muito obrigado, Deputado Sergio
Petecão.
Passo a palavra ao Deputado Ricardo Tripoli, do PSDB de São Paulo.

O SR. DEPUTADO RICARDO TRIPOLI – Sra. Presidenta, estimada Deputada Janete
Capiberibe, estimado amigo Deputado Moreira Mendes, Sr. Ministro de Assuntos Estratégicos
da Presidência da República, Mangabeira Unger, vou na contramão de boa parte do que foi dito
aqui.
A sua abordagem, Sr. Ministro, foi muito interessante no sentido de que existe um
discurso que há muitos anos se decanta do desenvolvimento acoplado à sustentabilidade, mas
há muita pouca prática no sentido de convergir essas 2 intenções.
Eu, em 26 anos de vida pública, já tive oportunidade de apreciar centenas de
diagnósticos no que diz respeito à Amazônia. De que maneira deveríamos utilizar da melhor
forma esse grande projeto que entendo como projeto estratégico para o Brasil, que é a nossa
Amazônia, inclusive a própria biodiversidade.
Serei muito objetivo nas minhas manifestações. A primeira delas é quanto à questão do
monitoramento do desmatamento na Amazônia, feito pelo INPE, que tem sido criticado de
forma injusta tanto pelo Ministro da Agricultura quanto pelo Governador do Mato Grosso Blairo
Maggi. Vimos que há um descompasso do pronunciamento do Governador. No dia em que ele
vai à televisão e diz que os índices de desmatamento no seu Estado têm diminuído — entendo
que, quando ele fala em desmatamento, não está acoplando a queimadas de florestas, deve
utilizar dois parâmetros de avaliação —, sai no jornal que o Brasil perde o Estado do Rio de
Janeiro em termos de desmatamento e queimadas. A meu ver, o INPE, para reafirmar a sua
importância, no que diz respeito a esse monitoramento, é uma instituição não só de
reconhecimento nacional, como internacional.
A segunda questão, Sr. Ministro, é sobre a pesquisa científica. Recordo-me que, em

1992, quando participei da Rio 92, nos 2 fóruns, tanto das governamentais, quanto das não-
governamentais, no Aterro do Flamengo e no Centro, onde foram realizadas as

governamentais, um grupo de alemães difundia, naquela época, que cerca de 18 mil espécies
ainda não estavam identificadas na floresta amazônica, um dos maiores berços da
biodiversidade de todo o Planeta, e que nós poderíamos estar perdendo muito. A meu ver, o
mundo acadêmico mostra que há uma grande oportunidade de o Brasil crescer na exploração
científica desses produtos ainda não identificados. Estamos ainda na época do domínio de
Dom João VI exportando café em saca para o mundo e importando o sachê de café solúvel. A
mesma coisa acontece com a Amazônia: não agregamos valor aos nossos produtos.
A terceira questão é sobre os subsídios. A fala de V.Exa. foi muito bem colocada, mas há
necessidade de um direcionamento de políticas públicas. Num mundo capitalista, sem recursos
e sem dinheiro, não há a mínima condição de avançarmos nem na questão do
desenvolvimento nem na questão da sustentabilidade.
No dia em que a Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e o Ministro Reinhold
Stephanes estiveram aqui, eu formulei uma pergunta para eles, porque, naquele mesmo dia, o
jornal O Estado de S. Paulo publicava que o BNDES estaria financiando o empreendimento da
Vale do Rio Doce na ordem de 7 bilhões de reais. Perguntei aos 2 Ministros quando eles tinham
recebido um aporte dessa dimensão.
Portanto, se há interesse de direcionar políticas públicas estratégicas para a Amazônia,
há necessidade de um investimento altíssimo, em razão da importância que tem

estrategicamente a Amazônia para todos nós, sejam os ruralistas, sejam os ambientalistas.
Estou tentando convergir na linha de idéias da exposição de V.Exa.
A única sugestão que vou deixar aqui de tudo que consegui aprender até hoje, embora
eu imagine que tenha muita coisa ainda para aprender com o mundo acadêmico, científico e
político, é a seguinte: por que não pegamos essas regiões que já foram desmatadas no
Sudeste e Sul do País e não fazemos um projeto de subsídios ou de financiamento a custo
baixo, a fim de que não haja investimento barato na queimada e derrubada da floresta
amazônica e dê tempo ainda de pensarmos estrategicamente num desenvolvimento correto
para o setor amazônico?
Entendo que o problema crucial que V.Exa. vai enfrentar é a questão econômica e
financeira para que haja um direcionamento de políticas públicas que realmente possam ser
viáveis e possamos obviamente colher frutos desse grande projeto amazônico.
Se V.Exa. pegar o mapa do Brasil, verificará que nas Regiões Sul e Sudeste — estou
colocando essas 2 áreas estrategicamente — existem muitas áreas desmatadas já
desocupadas. Essas áreas poderiam ser ocupadas pela agricultura, pelo setor do agronegócio.
Por que elas não são ocupadas? Porque são áreas caras, as terras custam muito nessas
regiões. Por que não invertemos o processo? Nós atraímos o setor do agronegócio para essas
áreas, subsidiados pelo Governo, o que é normal no mundo inteiro. Só no Brasil, quando se
fala em subsídio, todo mundo corre. Subsidiemos e a região da floresta amazônica se manterá
não diria intacta, mas dentro de um novo modelo de desenvolvimento. Estamos ainda com uma
cultura arcaica, ultrapassada. Entendo que isso justificaria a possibilidade de termos na mesma
mesa ambientalistas e ruralistas e, quem sabe, o início da solução do problema.
Muito obrigado, Sr. Ministro, Deputada Janete Capiberibe e Deputado Moreira Mendes.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Agradeço ao Deputado Ricardo
Tripoli a participação.
Passo a palavra ao Deputado Wellington Fagundes, do PR do Mato Grosso.
O SR. DEPUTADO WELLINGTON FAGUNDES – Saúdo a Sra. Presidenta, Deputada
Janete Capiberibe, o Deputado Moreira Mendes, proponente desta audiência pública, e o
Ministro Mangabeira Unger.
Inicialmente, Ministro, eu gostaria de parabenizá-lo porque eu senti que V.Exa. é uma
das primeiras pessoas que está procurando entender a Amazônia para dela falar. O grande
problema hoje no mundo e no Brasil é que as pessoas querem falar da Amazônia sem
conhecê-la. Eu sou filho de um nordestino que foi da Bahia para Mato Grosso a pé. Sou
nascido no Mato Grosso e digo a V.Exa. que não conheço a Amazônia.
O Estado do Mato Grosso tem uma situação diferenciada — daí a importância de saber
a diferenciação dos ecossistemas e principalmente a colonização de cada Estado. No meu
Estado, por exemplo, temos 3 ecossistemas: o Cerrado, o Pantanal, que é uma região

extremamente frágil, mas não se está discutindo o Pantanal Mato-grossense. Na Flórida, gasta-
se bilhões para tentar recuperar aquilo que destruíram do Parque Everglades. Se não fizermos

investimentos na área de saneamento nas cabeceiras, vamos destruir o Pantanal. Portanto,
precisamos discutir o Pantanal, que é uma das maiores reservas, um dos maiores biomas do

mundo. Temos também a questão da Amazônia. Hoje, o Mato Grosso está sendo a vedete,
mas as pessoas não sabem as diferenciações entre o Cerrado, o Pantanal e a Amazônia.
Deputado Ricardo Tripoli, quero dizer a V.Exa. que sou um ruralista, mas também sou
um ambientalista. Não vejo diferenciação entre os 2 setores. É perfeitamente possível ser um
grande ruralista, sendo um grande ambientalista. Entendo que não podemos transformar a
situação do campo como ideológica. Aliás, no Brasil, é muito difícil diferenciar com o
pluripartidarismo no qual vivemos hoje.
Acredito, Ministro, que o grande desafio é discutir realmente o processo de
financiamento da preservação da Amazônia. É importante dizer por que o Amazonas hoje tem
97% do seu território ainda intacto. Primeiro, a colonização daquela região é totalmente
diferente da do Mato Grosso. Para desbravar o Mato Grosso foram chamados brasileiros de
todos os recantos do País. E quem foi para lá foi com a cultura de “abrir”, porque se você não
“abrisse” não teria a posse. Então, desde o pequeno até o grande, e cada um na sua época,
todos chegaram lá com esse desafio.
No início, eram as roças de toco, plantadas principalmente pelos nordestinos, mineiros,
baianos, paulistas e outros tantos. Depois, vieram os sulistas para “abrir” o cerrado, que não
valia nada. Nós, de origem nordestina, dizemos o seguinte: “Essa terra só serve para criar
calango; não tem nada o que produzir.” Mas vieram os sulistas, que fizeram a abertura, fizeram
pesquisas por conta própria, muitos deles falindo; e hoje nós temos um Estado com uma
produção invejável, apesar de todos os desafios.
Para se ter uma idéia, até há pouco tempo éramos o maior produtor de algodão. Mas
essa produção foi dizimada. Eis que um programa do Governo do Estado incentivou
novamente a cultura do algodão e, de repente, em 3 anos, voltamos a ser o maior produtor de
algodão, respondendo por 54% da produção.
Então, Ministro, V.Exa. falou sobre os 7 programas que colocou como revolucionários, e
acredito que, realmente, se nós conseguirmos transformar isso… E, quando digo nós, é porque
V.Exa. não pode estar sozinho. A sociedade tem que estar com V.Exa., com essa proposta que
V.Exa. fez aqui para aproximar-se mais do Congresso. Gostaria que o Deputado Homero
falasse um pouco melhor. Mas é importante também que nos juntemos nesse fórum de
trabalho. Talvez aí a sociedade que lá vive organizada… Porque temos entidades hoje

extremamente desorganizadas. V.Exa. falou sobre alguns aspectos da questão da infra-
estrutura, do cartel de fertilizantes. Portanto, são essas as adversidades que hoje nós

enfrentamos para produzir.
Finalizo, dizendo que todos nós queremos realmente preservar a Amazônia. Mas nós
precisamos saber de que forma podemos fazê-lo. E eu acredito que não temos outra forma a
não ser criando pólos tecnológicos de desenvolvimento. Porque nossas divisas não podem
ficar abandonadas, não podem ser cercadas estrategicamente por reservas indígenas; nós não
podemos ficar a mercê da criação de reservas indígenas, sem discutir isso com a sociedade,
principalmente com o Congresso; e não podem ocorrer situações como a que está
acontecendo em meu Estado, em relação à BR-158, que liga nossa região como Pará. Essa
estrada já existe há mais de 50 anos, e, agora, quando o Governo sinalizou com seu
asfaltamento, foi lá a FUNAI e criou uma reserva indígena — bem em cima da BR‐158 — para

impedir seu asfaltamento, para impedir que seja feita a infra‐estrutura necessária para que
possamos ter competitividade.
Ainda, Ministro — o tempo é curto —, quero dizer que o INCRA, lá, não é chamado de
INCRA; nós o chamamos de “incravado”, porque ele é realmente um órgão que historicamente
tem emperrado principalmente a questão da legalização, sobre a qual V.Exa. tanto falou. Olha,
a corrupção histórica do INCRA também é coisa absurda. Então, acho que todas essas
questões são desafios que V.Exa. terá que enfrentar — e que não pode estar sozinho, até
porque o Governo também tem seus antagonismos.
O Ministro Carlos Minc assumiu o Ministério dizendo que é do Rio de Janeiro e que
nunca foi à Amazônia. Mas sua primeira fala foi criticando aqueles que estão na Amazônia.
Ora, a Mata Atlântica foi praticamente dizimada, e nós temos sérios problemas ambientais na
costa marítima; aliás, temos 8 mil quilômetros de costa marítima totalmente desprotegidos, e
que também estão sendo pirateados no dia‐a‐dia. Portanto, acho que proteger as riquezas
nacionais é um desafio que temos, e aí não pode haver Estado, divisão territorial nem muito
menos ideológica ou de qualquer outra maneira.
Acho que nós temos que discutir a Amazônia, entendendo a complexidade de um País
tão grande como o nosso, com todas as dificuldades.
Quero saber, também, já que V.Exa. que tem experiência internacional, de que modo a
comunidade internacional está realmente comprometida com a preservação da Amazônia,
porque, acredito, se não tivermos transferência de tecnologia e transferência de recursos, será
difícil fazer a preservação ideal que todos nós queremos.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Quero comunicar que está
acontecendo votação nominal no plenário. Já aconteceu uma votação. Vou suspender, por 2
minutos, a audiência pública. O motivo dessa rápida paralisação é que o Ministro precisa se
dirigir ao toilet. (Pausa).
Com o retorno do Ministro, retomamos os trabalhos.
Devido ao fato de que se encontram presentes os Deputados Neudo Campos e Homero
Pereira, e ausentes os Deputados Giovanni Queiroz e Elcione Barbalho, nós passaremos a
palavra aos 2 últimos inscritos.
Sr. Ministro, quero que V.Exa. compreenda que debateremos, hoje à tarde, a proposta de
V.Exa. sobre a criação do grupo de trabalho, o que consideramos importante.
Então, está com a palavra o Deputado Neudo Campos, do PP, que foi Governador de
Roraima por 2 mandatos.
O SR. DEPUTADO NEUDO CAMPOS – Muito obrigado, Sra. Presidenta.
Sr. Ministro, eu quero primeiro parabenizá-lo pela forma racional como tem apresentado
esse problema que se arrasta há longo tempo para ser resolvido, para ser apreciado. Nunca,
antes, eu tinha visto uma exposição tão racional como a que V.Exa. colocou. O nome disso é
racionalidade.
Não custa dizer que antes imperou a irracionalidade. A irracionalidade do “não”, de
sempre dizer “não”, de sempre negar tudo aos povos do Amazonas. Ali, tudo que se ia fazer
era proibido; ou se fazia de forma clandestina ou se dizia “não”. Os exemplos estão aí, entre

eles o da extração de minérios em terras indígenas. Sobre a questão dos minérios que estão
lá, há uma grande riqueza no subsolo e uma pobreza incomensurável dos povos indígenas.
Ninguém é mais pobre neste País do que os índios. Ninguém vive mais miseravelmente do que
os índios. E ainda morando em cima de tal riqueza! Falta racionalidade, Ministro. O que quero
dizer é que temos que discutir mais isso.
Eu compreendo perfeitamente sua sugestão de criar grupos de trabalho para discutirmos
os problemas da Amazônia. Por exemplo, meu Estado de Roraima que tem extensão do
cerrado que já é uma Amazônia em transição para o Caribe. Então, ele não tem a densa
floresta que tem o Acre, já é uma floresta em transição. Tem cerrado e tem as montanhas da
fronteira.
Temos que ver o que significa, por exemplo, a Venezuela para nós, dentro da nossa
estratégia. Como é que podemos desprezar a Venezuela? O tratamento à Venezuela tem que
ser importante, porque ela é o quinto maior produtor de petróleo; é um país que, em termos
agrícolas, importa muitas coisas; até importa soja do Mato Grosso. E nós podemos produzir
essa soja. E não só isso. Há muitas outras coisas que a Venezuela nos coloca.
Do ponto de vista estratégico, é absolutamente fundamental que o Brasil ajude a Guiana
a asfaltar uma estrada que saia de Lethem, na fronteira com o Brasil, até Georgetown, e faça
um porto em Berbice, em águas profundas, que sirva tanto para a Guiana quanto para
Roraima.
Na Zona Franca de Manaus, que exporta, essa é uma saída que já vai sair lá na frente.
Está a 2 dias de caminhão desse porto do Caribe, que está a 2 dias do Pacífico. Roraima é o
Estado mais próximo do Pacífico e, portanto, da Ásia, da China. Enfim, temos que pensar
nisso.
Sr. Ministro, quero me inserir nesse seu grupo, quero me oferecer para participar, para
contribuir no horário, no momento em que for acertado. Quero que pensemos sobre isso.
Temos também que ouvir sobre a questão fundiária. Veja quanto Roraima é diferente. O
regime de chuvas em Roraima é diferente do restante do País. Lá está chovendo agora. A
chuva começa em abril, maio, e vai até agosto, setembro. Ou seja, a safra de Roraima coincide
com a entressafra do restante do País. Os empresários do Centro-Oeste, do Sul e do Sudeste
podem investir em Roraima, produzir naquele Estado, com vistas à exportação. Além de tudo, o
Estado está no Hemisfério Norte. Está a 3 dias do Canal do Panamá, do Pacífico. Enfim, são
pontos absolutamente importantes, quando se planeja isso.
Qual é o entrave a tudo isso? A questão fundiária, a falta do título definitivo registrado no
cartório de registro de imóveis. E isso é coisa tão simples, uma coisa que não dói. Não são
recursos do Governo Federal que vão ser transferidos para Roraima. Na verdade, Roraima era
do Estado do Amazonas. Foi federalizado com a criação do Território Federal do Rio Branco,
onde nasci. E, depois, quando veio a Constituição de 1988, foi estadualizado. Ou seja,
queremos que as terras do Amazonas que foram federalizadas sejam agora estadualizadas
para Roraima. Isso é lógico. É um direito; é algo que nos atravanca a vida inteira.
Como Governador, uma holding conhecidíssima chamada Mitsubishi queria investir lá
para, sem derrubar uma única árvore, produzir soja para exportação para o Japão. O Japão
consome soja de uma forma diferente. Não é soja para ração; é uma soja mais rica em

proteínas para consumo humano. E lá produzimos adequadamente muito bem isso. Estamos
perto do Canal do Panamá, estamos a 1 mil quilômetros de Porto La Cruz, na Venezuela — ou
seja, um dia, um dia e meio de viagem —, que está a menos de um dia do Canal do Panamá,
de navio. Então, há toda uma estratégia, toda uma logística que facilita. E nada disso
aconteceu. Estamos numa pobreza; estamos vivendo numa dependência danada porque o
Governo Federal, de longe, só diz uma coisa para nós: não, não e não! E isso não é deste
Governo; isso vem de antes.
Quer coisa mais irracional, Ministro, do que essa questão indígena, em que os
produtores de arroz e os índios estão brigando? É uma briga irracional. Os índios poderiam
participar dessa riqueza, mas não participam. O que vai acontecer é que se vai separar, não se
vai mais produzir arroz, e os índios continuarão vivendo na miséria. Um não produz e o outro
não se beneficia.
Temos de ser racionais. Pela primeira vez, estou vendo projetos racionais, que têm sido
apresentados por V.Exa.
A extração de minerais em terras indígenas é um ponto que tem de ser abordado pelo
bem dos índios, pelo bem do nosso País. Se o Governo Federal não procurar resolver essa
questão, vai continuar existindo exploração clandestina — não são pagos impostos e se
beneficiam meia dúzia de aventureiros que se propõem a fazer isso.
Ministro, mais uma vez, parabenizo V.Exa. pela sua abordagem, pelo seu projeto. Quero
que se pense nessa questão estratégica da Venezuela, nessa estrada de Georgetown, para
servir de porto de mar para Roraima e, talvez, para a Zona Franca. É mais perto.
Enfatizo que todo entrave ao nosso desenvolvimento provém de uma única coisa, que é
a questão fundiária. As terras existem, e a União não está lá para reclamá-las, não está lá para
habitá-las, mas não deixa ninguém ter o título definitivo delas. Elas não servem de garantia
para os projetos junto aos bancos. Por conseguinte, as coisas não avançam.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Obrigada, Deputado Neudo
Campos.
Deputados Giovanni Queiroz e Homero Pereira, para que encerremos este bloco, solicito
a compreensão de V.Exas. quanto às suas reflexões e questionamentos ao Ministro.
Tem a palavra o Deputado Giovanni Queiroz, do PDT do Pará.
O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Minha compreensão V.Exa. vai ter, com
certeza. Quem falou menos falou 8 minutos, quem falou mais falou 16 minutos. Logicamente,
vou ficar no meio-termo.
Sr. Ministro, mais uma vez, cumprimento V.Exa. Tentarei ser bem sintético. V.Exa. traz
para nossa reflexão propostas para uma Amazônia diferente. Com o aprendizado que obteve
pelas andanças que fez, por ouvir tantos segmentos da Amazônia, pôde sintetizá-las num
documento e na sua fala. V.Exa. insiste em dizer que quer aprender todo dia. É nesse sentido
mesmo que temos de caminhar.
Minha preocupação é como V.Exa. vai poder, sistematizando as idéias, concretizar
ações na Amazônia.

O ex-Governador Neudo Campos comentou sobre a dificuldade que teve quanto à
regularização fundiária, que poderia viabilizar o Estado, tirá-lo da miséria. Mas isso depende da
União — da transferência das terras da União para o Estado ou da regularização, pela União,
das terras daquela região para propiciar o desenvolvimento efetivo.
Então, minha preocupação é como V.Exa. vai conseguir mexer com o INCRA, com o
IBAMA, com a FUNAI, com os Governos dos Estados. Muitos deles são morosos,
incompetentes, negligentes, preguiçosos e não pensam grande como V.Exa. está tentando
pensar, como nós queremos pensar, para o desenvolvimento efetivo da Amazônia, integrando-a
ao processo de desenvolvimento nacional. Minha preocupação, Ministro, é como V.Exa. pode
fazer isso.
E aí vem uma idéia, que trago comigo há muito tempo. Sou mineiro de nascimento. Fiz
Medicina no Rio de Janeiro e fui para o interior do Pará. Fui o primeiro médico de uma corrutela
de lá, de um povoado. Hoje sou fazendeiro e também reflorestador. Já carrego comigo há
muitos anos — os colegas aqui sabem disso — a idéia de se criar o Estado de Carajás no sul
do Pará, de desmembrá-lo do Pará. Em 1.248 mil quilômetros quadrados, proponho a criação
de um novo território, com novo gerenciamento. Há também a idéia de criação do Estado do
Tapajós, mais a oeste do Pará, na região de Santarém. O Estado de Carajás, na região de
Marabá, no polígono mineral de Carajás.
Minha sugestão, Ministro, é a seguinte: V.Exa., para implementar ações objetivas em
uma determinada região, para ser um modelo piloto em toda a Amazônia — enquanto isso,
logicamente, tendo ações em todos os Estados, em todas as direções —, poderia criar um
território federal. V.Exa. indicaria o Governador, que teria uma ação direta sobre aquela região,
comprometido com o projeto de V.Exa.
Por que eu sugiro a região de Carajás? Poderia ter o nome de território do sul do Pará,
de território de Carajás, o nome que quisessem colocar. Porque lá V.Exa. vai encontrar tudo
isto que menciona: a área desmatada e grande; a área de mata em pé; a questão indígena; o
cerrado; o Rio Araguaia, que precisa tornar-se navegável durante os 12 meses do ano — ele o
é durante 8 meses; a questão das hidrelétricas a serem construídas ali, seja a de Santa Isabel,
seja a de Marabá, que já têm projetos; uma questão forte e enorme a se concretizar.
O Governo Federal precisará ser parceiro na política industrial, ou seja, na política de
exportação do minério, na política minerária. Estamos vendo que o buraco está sendo aberto,
com as riquezas naturais não-renováveis, que são os nossos minérios, esvaindo-se. Haverá
miséria em torno do buraco, e vamos ter o apito do trem e o apito do navio, como ocorreu em
Serra do Navio, no Amapá, se não tivermos uma política industrial diferenciada, uma política
minerária de exploração.
Nós não deixamos de ser uma coloniazinha sem-vergonha. Desculpem-me a expressão.
Somos uma mera colônia, que está sendo explorada por outros países, pelas empresas que se
dizem nacionais e que fazem o jogo internacional. Não são eles que estão nos explorando. Nós
é que estamos nos permitindo ser explorados por negligência, por tolerância excessiva. Por
tolerância excessiva, repito. Cabe ao Governo Federal disciplinar isso.
Sr. Ministro, lanço-lhe um desafio: proponha ao Presidente a criação do território na
região sul e sudeste do Estado do Pará, na região de Marabá. V.Exa. vai encontrar a questão

minerária, a questão do transporte, a questão da logística do transporte, bem colocada por
V.Exa. Vamos sair do estreito caminho rodoviário para alargar essa condição de transporte com
as ferrovias e as hidrovias.
Estamos próximos dos portos de exportação, como o de Vila do Conde. Poderia ser
levada uma ferrovia até lá, ou a Hidrovia Araguaia-Tocantins. Já temos a energia de Tucuruí
para garantir o desenvolvimento industrial, mas precisamos de mais hidrelétricas, como a de
Marabá e a de Santa Isabel, não só para tornar mais navegável o Rio Araguaia, mas também
para gerar energia para estimular esse desenvolvimento.
Sr. Ministro, V.Exa. traz outra questão. Gostaria de ter sugestões para relação de
trabalho, Deputado Neudo Campos. Fico pensando em como poderia ser. O Deputado Moreira
Mendes nos provocou. S.Exa. quer uma relação de trabalho. Fico pensando… Se pegassem
um Deputado de cada Estado, como seria isso? Quem estaria interessado em se inscrever
para participar de um debate uma vez por semana ou uma vez por mês, numa sexta-feira pela
manhã? Nós bateríamos papo, almoçaríamos juntos e discutiríamos tema por tema.
V.Exa. fala em regularização fundiária. Depende do INCRA, depende do Estado. V.Exa.
fala em zoneamento econômico-ecológico. Rondônia já tem o dela, mas o Pará não tem.
Colocamos dinheiro lá, mas o nosso Secretário do Meio Ambiente não se mexeu. Não se
mexeu, repito. O dinheiro colocado no Orçamento da União foi disponibilizado. V.Exa. fala na
indústria. Vamos precisar da política do Estado. O Estado precisa ser parceiro da União nessa
política industrial capaz de alavancar o desenvolvimento, gerando emprego. V.Exa. fala de
transporte multimodal. Temos de buscar o interesse dos outros Ministérios para que possamos
vê-lo implantado. E V.Exa. fala na capacitação de recursos humanos. Precisa-se do Estado e
da União.
Eu não vejo outra alternativa a não ser a criação de um território, para que haja ali um
modelo de desenvolvimento efetivo, que sirva de exemplo para toda a Amazônia. Eu ouvi isso

de V.Exa. Não estou criando nada. Foi V.Exa. que, numa conversa rápida que tivemos, disse-
me para trazer algumas propostas de ações para criarmos ali uma microrregião, onde

possamos implementar ações que sirvam de modelo para toda a Amazônia.
Eram essas as minhas ponderações. Isso deve ser feito imediatamente. Vamos à
prática.
V.Exa. vai encontrar muitas dificuldades, porque, como já disseram aqui, e eu apenas
vou repetir… O INCRA, na minha região, também é “incravado”. O nome do INCRA, na minha
região, é “incravado”.
E mais: a Superintendência do INCRA, em Marabá, é a maior do Brasil. Estão exigindo
zoneamento econômico-ecológico para tirar licença ambiental, sob pena de, a partir do dia 1o,
não haver mais crédito para o produtor rural. No INCRA de Marabá só tem um técnico para
analisar o georreferenciamento que estão exigindo de todo produtor. Ele é de Palmas. Briguei
para que fosse para lá. Ele passa uma semana lá e 20 dias em Palmas. Não existe ninguém.
Até hoje foram certificadas apenas 24 propriedades. Duas delas são minhas. O interessante é
que há 2 anos estou brigando para certificá-las. Há 2 anos! Agora certificaram a segunda.
É este o Estado brasileiro: da incompetência, da negligência e da irresponsabilidade,
porque querem limitar o crédito do povo da Amazônia, a partir do dia 1o, para quem não tiver

licença ambiental.
Na Amazônia — no Pará, em particular —, para se tirar uma licença ambiental… Eu
demorei 14 meses para tirar licença ambiental, a fim de explorar madeira que eu plantei. Cito
esse exemplo para V.Exa. ter noção do que vai encontrar pela frente, Ministro.
Mas nós seremos parceiros de V.Exa. Coloco-me à disposição de V.Exa. para
discutirmos todos os termos que V.Exa. quiser e para ajudá-lo no Congresso Nacional. Vamos
tentar agilizar a tramitação de leis. Acho que todos nós ficamos entusiasmados de ver uma luz
no fim do túnel, com as propostas de V.Exa.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Moreira Mendes) – Muito obrigado, Deputado Giovanni
Queiroz.
Passo a palavra ao último inscrito, Deputado Homero Pereira. Em seguida, o Ministro vai
responder todos os questionamentos. Depois nós encerraremos esta audiência pública.
Com a palavra o Deputado Homero Pereira.
O SR. DEPUTADO HOMERO PEREIRA – Sr. Presidente, serei breve. Resta pouca
coisa a dizer, para não ser redundante, para não repetir o que nossos companheiros já
disseram.
O Ministro brindou-nos novamente, nesta oportunidade, com um volume de informações
importantes. Acertou o Presidente da República, quando colocou o Programa Amazônia
Sustentável sob a coordenação de S.Exa., que é uma pessoa ponderada.
Eu não tenho mais observações a fazer. Apresento apenas 2 sugestões.
Primeiro, sugiro a V.Exa. que internalize suas idéias no âmbito do Governo. Vejo que
V.Exa. está indo conversar com os Governadores. Há Ministérios — não quero nominá-los —
envolvidos com o tema “Amazônia Sustentável” que fazem discursos totalmente diferentes,
principalmente no tocante a instrumentos de comando e controle, que o Deputado Moreira
Mendes mencionou. Eles são necessários, obviamente, mas não no sentido de serem
incluídos.
Se quiserem que as coisas não aconteçam na Amazônia, excluam os amazônidas da
discussão. Percebemos claramente, inclusive em algumas propostas, a tentativa de blindar
aquilo tudo, de transformar-nos numa sociedade de segunda classe, de subsidiar o Sul do
País… Só temos de combinar o seguinte: vamos trazer as 25 milhões de pessoas de volta que
dá tudo certo. Tudo ficará zerado. Vamos fazer um grande refrigerador e trazer de lá para cá as
25 milhões de pessoas. Será feito um grande acerto nacional nesse sentido.
A sugestão de V.Exa. pode ser feita a partir do próprio Ministério. Nós tivemos algumas
experiências quanto ao endividamento rural e outras coisas mais. No âmbito dos Ministérios da
Agricultura e da Fazenda, criaram-se grupos de trabalhos multidisciplinares, com o
envolvimento tanto de Parlamentares como da sociedade civil organizada, o que tem resultado
em algumas medidas importantes. Algumas delas deram origem a medidas provisórias.
Se houver o envolvimento da sociedade local, as coisas vão acontecer. De nada adianta
criarmos leis, normas de cima para baixo, sem o envolvimento da comunidade local, sem o
conhecimento da realidade, já devidamente identificada, conforme V.Exa. disse, por meio de
instrumentos modernos, como o zoneamento e a regularização fundiária. Mas o envolvimento

das pessoas que estão naquele território é fundamental, sob pena de aquelas idéias não terem
eficácia.
Quando V.Exa. assumiu a coordenação do Plano Amazônia Sustentável, mostrou ser um
grande pensador. A Nação já reconhece isso. Mas V.Exa. não pode ser lembrado só como um
grande pensador. Tem de ser lembrado também como um grande coordenador, um grande
executor desse projeto, porque ele é a solução não apenas para a Amazônia, mas para o
Brasil.
Muito obrigado.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Dando continuidade aos
trabalhos, passo a palavra ao Ministro Mangabeira para responder os questionamentos dos
Srs. Parlamentares e também para as suas considerações finais.
Muito obrigada.
O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Muito obrigado.
Eu vou mencionar 4 temas recorrentes nessas intervenções. O primeiro deles tem a ver
com as alternativas na Amazônia sem floresta.
Começo respondendo o Deputado Tripoli. S.Exa. disse que ia na contramão das outras
intervenções. Eu não entendi dessa forma. S.Exa. disse exatamente o que todos nós
estávamos dizendo.
Fiz uma distinção clara, na minha apresentação inicial, entre a estratégia para a
Amazônia com floresta e a estratégia para a Amazônia sem floresta.
A Amazônia Legal inclui vastas áreas de cerrado ou savana tropical. Não só áreas que
foram desmatadas, mas áreas que nunca tiveram florestas, que são savana tropical. Nós
precisamos ter uma estratégia para essa Amazônia dos cerrados e estabelecer nela a
vanguarda da agricultura brasileira.
Agora, deve ser feita uma distinção conceitual muito importante, que eu não identifiquei
na intervenção de S.Exa. Na grande Amazônia dos cerrados, a tarefa é a construção da
agricultura brasileira. O Brasil, pela sua combinação de recursos — água, sol e solo —, tem
todas as condições para ser a maior potência agrícola do mundo e para promover o resgate da
humanidade nesta fase histórica.
Para aproveitar esse potencial, como eu disse nas minhas observações iniciais, é
necessário que haja uma construção econômica e física. Há problemas práticos a resolver. Um
deles, por exemplo, que estamos enfrentando nesses dias, é o dos fertilizantes. É um absurdo
que o Brasil, que tem potencial para produzir praticamente tudo o que precisa, em matéria de
fertilizantes, e até para exportar, seja radicalmente dependente. E são 40% do custo dos
produtos agrícolas.
Esse problema dos fertilizantes está ligado a uma revolução que temos de fazer na
estrutura da mineração, no Brasil. Há toda uma problemática econômica e física. Mas essa
tarefa econômica e física passa por uma construção institucional. Nós temos, no Brasil, o ônus
de um contraste nocivo e desnecessário entre agricultura familiar e agricultura empresarial.
Não tem sentido, embora se compreenda historicamente a genealogia desse contraste entre
nós.

Nós precisamos construir o desenho institucional de uma agricultura moderna, e
democratizar é um só; e o lugar para começar essa construção é a Amazônia dos cerrados.
Entre os problemas todos que eu citei, lembro um que me parece crucial, que é a
reorganização dos mercados agrícolas. Nós queremos reorganizar os mercados agrícolas em
favor dos produtores para limitar o poder dos cartéis de fornecedores e compradores; uma
grande tarefa, uma tarefa revolucionária para o País, para o mundo, na Amazônia dos
cerrados.
Agora há um outro problema, e aí é que vem a minha distinção conceitual, que tem a ver
com a situação específica das populações de pequenos produtores extrativistas e agrícolas
que operam nessa zona de transição entre a floresta e o cerrado. Involuntariamente, eles
costumam ser a linha de frente de desmatamento. Não é culpa deles, não é caso de polícia; é
um caso de agenda econômica construtiva. Eles operam involuntariamente como linha de
frente de grandes pecuaristas e agricultores, que vêm atrás deles.
Então, o que queremos fazer é convertê-los para que, em vez de ser essa linha de frente
de desmatamento, seja um cinturão de proteção da Floresta Amazônica e, para isso,
precisamos definir um elenco de formas legítimas de produção, apoiadas técnica e
financeiramente, e construir um mecanismo de remuneração especial que sacramente o
vínculo dessas populações com esses programas.
É isso que temos de fazer. É uma tarefa prática. O que adianta o País ficar acalentando
essas polêmicas abstratas sobre esses contrastes absurdos entre desenvolvimento e
preservação? Não é isso. O problema é que ficamos falando e não fazemos.
Disseram que eu sou um pensador, mas tenho que executar e tal. Eu é que estou
ansioso em traduzir essas abstrações em iniciativas concretas, e o que costumo encontrar no
País é mais discurso. Mas o País não quer palavras agora sobre a Amazônia; quer ações, e
são as ações que vão definir o sentido das palavras.
Agora, o segundo tema que surgiu em várias das intervenções, sobretudo a do
Deputado Campos. Nós compartilhamos a Amazônia com os nossos vizinhos sul-americanos, e
em algum momento o projeto Amazônia, além de ser um projeto brasileiro, tem de ser um
projeto sul-americano, que exprima e reforce o impulso de construção da união sul-americana.
O que nos tem inibido é a falta de concretude no nosso próprio projeto. Como podemos discutir
com os nossos vizinhos, que são muito menores e mais fracos que nós, se não temos clareza
sobre o que queremos para nós? Então, a prioridade é o desdobramento dessa proposta
Amazônia nessas iniciativas concretas todas que eu descrevi para, logo em seguida, começar
a engajar os nossos vizinhos.
Agora, ocorre que, na prática, não vamos poder obedecer a essa separação rígida de
etapas, porque surgem circunstâncias que vão antecipar esse engajamento dos nossos
vizinhos. Dou um exemplo: o Presidente Lula vai se encontrar com o Presidente Chávez no dia
27, em Santa Elena, na Venezuela, na fronteira com Roraima, e eu então propus, e obtive o
consentimento dos dois Governos, de organizarmos na véspera, no dia 26, uma reunião dos
Governadores de Roraima e de Bolivar, o estado venezuelano vizinho de Roraima, com o
engajamento de Ministros brasileiros e venezuelanos, para começarmos a discutir iniciativas

conjuntas e paralelas em Bolivar e Roraima e, com isso, antecipar essa dinâmica sul-
americana que me parece tão importante.

Isso é uma grande coisa para nós, para a Venezuela, que não tem projeto definido sobre
a Amazônia venezuelana. A Venezuela está preocupada agora com o Faixa do Orinoco, mas o
que fica para baixo na Amazônia venezuelana, pouco figura na discussão pública daquele país,
quer por parte do Governo, quer por parte da Oposição.
Então, vamos antecipar essa dinâmica, e eu gostaria também de engajar a Nação nesse
debate porque aí, mais uma vez, saímos dos discursos e passamos para os atos, e vamos dar
uma dimensão surpreendente, inesperada a esse projeto de união sul-americana.
Sobre o terceiro ponto em que eu quero insistir, eu falei em 7 grupos de iniciativas, mas
não estão todos nos mesmo plano, porque em um deles há um tema que tem primazia sobre
todos os outros, e é transversal no debate entre ambientalistas extremados e pessoas que
descuidam do meio ambiente. Esse tema é a terra, a regularização fundiária. Eu insisto, vou
dizer mil vezes em todo o lugar: enquanto não resolvermos o problema da titularidade da terra
na Amazônia, enquanto a Amazônia continuar a ser um purgatório de insegurança jurídica,
nada vai funcionar. Nenhuma dessas outras iniciativas vai para frente.
Então, o tema que tem prioridade causal sobre todos os outros é o da regularização
fundiária na Amazônia, e nós não vamos resolver esse problema apenas por medidas
administrativas. Nós vamos ter que mudar as leis.
Nós não podemos resolver o problema fundiário numa região que tem o tamanho da
Europa dentro de um direito civil que é mesmo de Portugal do século XVIII. Não funciona isso.
Nunca funcionou em nenhum outro país grande. Todos os outros tiveram que mudar as suas
leis para resolver esse problema. Nós também vamos ter que mudar, e o eixo dessa mudança
é a organização dessa trajetória acelerada da posse para a propriedade.
O quarto tema recorrente nessas intervenções é a dimensão nacional do projeto
Amazônia. Que coisa fantástica vemos quando comparamos esse episódio nacional que
estamos vivendo agora, de debates sobre a Amazônia, com debates sobre o Nordeste na
época de João Goulart e Celso Furtado! Naquela época, o Nordeste era visto como um
problema regional. Era um problema de desigualdades regionais e de iniciativas destinadas a
sanar as desigualdades regionais. Agora, não. Há uma consciência nascente no Brasil de que a
Amazônia é uma causa nacional. O que estamos discutindo não é o conserto da Amazônia, é o
conserto do Brasil, e todas essas iniciativas que passam por inovações institucionais têm
aplicação para todo o País.
A Amazônia é a vanguarda da Nação brasileira hoje, e é ali que vamos definir inovações
que ajudarão a soerguer e a transformar todo o País. É por causa disso, Deputados, que eu
preciso construir com V.Exas. uma relação de trabalho que ultrapasse os limites desse ritual.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRA. PRESIDENTA (Deputado Janete Capiberibe) – Muito obrigada, Ministro.
Com a palavra, pela ordem, o Deputado Sergio Petecão.
O SR. DEPUTADO SERGIO PETECÃO – Sr. Ministro, a respeito da minha pergunta
sobre a cana-de-açúcar na Amazônia…

O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Há uma resistência muito
grande a permitir a entrada da cana-de-açúcar na Amazônia que tem a ver com o seguinte
problema: não basta dizer que o cultivo da cana seja em áreas devastadas. Se ela se
aproximar da floresta, teme-se que haja um risco de invasão e não queremos isso.
Não encaramos a Floresta Amazônica como fronteira agrícola. Agora, não é um dogma,
precisamos discutir esse tema, mas desde que haja uma zona considerável que imunize a
Floresta Amazônica contra o risco dessa invasão. É um tema aberto a discussão.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Estamos estendo um pouco mais
a audiência pública. Concedo a palavra por um minuto ao Deputado Giovanni Queiroz.
O SR. DEPUTADO GIOVANNI QUEIROZ – Sr. Ministro, essa questão do açúcar, de
etanol, de biodiesel, como V.Exa. disse, temos que aproveitar toda aquela região já antropizada
e desmatada.
Para V.Exa. ter uma noção, a sacarose, segundo experimentos feitos lá na região sul do
Pará, é superior à sacarose produzida aqui em Goiás. A tonelagem por hectare produzida
chega a 140 toneladas com cana de 14 meses, e a média é de 80, 100 toneladas.
O desmatamento é questão pontual. Quem está desmatando sem autorização que seja
penalizado, e o Governo tem como fazer isso. Hoje, com os instrumentos que temos, com
GPS, localiza-se pontualmente; desce-se de helicóptero em cima do trator que estiver
desmatando. O que não se pode é generalizar a punição para quem está lá desbravando,
produzindo.
Então, é como V.Exa. disse: está em aberto a discussão, e que a cana-de-açúcar, o
álcool, o biodiesel — do sebo do boi, do dendê, do pinhão manso ou da mamona — sejam
instalados. O que não pode é o seguinte: se há o zoneamento e aqui não vai desmatar, não se
desmate, mas é preciso que o Estado esteja presente para inibir esse tipo de coisa, e não inibir
a produção na região.
O SR. MINISTRO ROBERTO MANGABEIRA UNGER – Agora, há uma distinção fazer
entre o etanol e a cana de um lado e a produção para o biodiesel de outro. Com relação ao
biodiesel, as preocupações são muito menores, porque a base pode ser a pequena produção e
é possível imaginar, em muitas áreas, que essa produção para o biodiesel componha aquele
elenco de atividades legítimas que descrevi para as populações de pequenos produtores.
A cana suscita maiores preocupações, mas a discussão está aberta. Não deve haver,
nessa discussão sobre a Amazônia, nenhum tabu. Nenhum assunto é proibido, todos os
assuntos são permitidos.
A SRA. PRESIDENTA (Deputada Janete Capiberibe) – Muito obrigada, Sr. Ministro
Mangabeira.
Na conclusão desta audiência pública, a partir das informações trazidas pelo Ministro, já
temos encaminhamentos concretos, e um deles será exposto hoje à tarde à apreciação da
Comissão da Amazônia, que é a criação de um grupo de trabalho para que discutamos 7
conjuntos de iniciativas para a implantação do Plano Amazônia Sustentável.
Estaremos em contato com o Governo Federal para, no encontro do Presidente Lula
com o Presidente Chávez, a Comissão da Amazônia estar presente, nesse conjunto de países

amazônicos, que são 8, numa articulação do Governo brasileiro, Executivo, Legislativo e outros
Poderes que se façam presentes.
Tendo em vista que os trabalhos dessa reunião conjunta foram gravados e seus registros
constarão dos Anais da Comissão, consulto o Plenário da possibilidade de dispensa da leitura
da ata. (Pausa.)
Fica dispensada a leitura.
Em votação a ata da reunião conjunta da Comissão da Amazônia, Integração Nacional e
Minas e Energia e da Comissão de Meio Ambiente. (Pausa.)
Aprovada.
Agradeço a valiosa contribuição e os esclarecimentos prestados pelo Sr. Ministro e
também a cada Parlamentar que participou desse debate de implantação do PAS.
Nada mais havendo a tratar, convoco os membros desse Colegiado para reunião
deliberativa extraordinária hoje, quarta-feira, no Plenário 15, às 14 horas, e também para o
seminário Segurança do Transporte Fluvial na Amazônia, a ser realizado sexta-feira, dia 13 de
junho, na Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas.
Está encerrada a presente reunião.

1 Sessão:0884/08 Quarto:1 Taq.:Maria Cristina Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:2 Taq.:Sherlei Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:3 Taq.:Sherlei Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:4 Taq.:Helena Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:5 Taq.:Helena Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:6 Taq.:Margarida Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:7 Taq.:Margarida Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:8 Taq.:Nelci Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:10 Taq.:Renata Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:11 Taq.:Renata Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:12 Taq.:Denise Honda Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:13 Taq.:Denise Honda Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:15 Taq.:Andréa Nogueira Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:17 Taq.:Christiane Monteiro Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:18 Taq.:Christiane Monteiro Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:19 Taq.:Lelaine Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:20 Taq.:Lelaine Rev.:
1 Sessão:0884/08 Quarto:21 Taq.:Lelaine Rev.:

https://www.ipea.gov.br/desafios/index.php?option=com_content&view=article&id=1350:entrevistas-materias&Itemid=41

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