Texto retirado do Livro “Discursos Presidenciais” de Ruy Barbosa.

Ruy Barbosa- 1907 – Vice Presidente do Senado

“AS VÍTIMAS”

– Vós povo, vós, operariado, vós, lavoura, vós, comércio, vós indústria, vós, os condenados ao imposto de sangue, exército e armada, marinheiros e soldados, vós sois o que haveis de sentir reduzidos ou atrasados no soldo e etapa, embaraçados ou diminuídos na produção ou na renda, cortados no salário, agravados no trabalho, mortificados no custo de vida.  A sorte de cada um de vós é a do holandês: pagar o mal que não fez. 

– Quem paga os desequilíbrios financeiros, os deficits do orçamento, as verbas arrebentadas, os créditos extraordinários, os empréstimos onerosos, os maus negócios do tesouro, as biscas da advocacia administrativa?

– Quem paga o atraso, a precipitação, o tumulto, as enxertias dos orçamentos atropelados à última hora e à última hora conchavados, ora nos corredores, com corretores parlamentares, ora no desordenado trabalho das comissões exaustas, desatentas, mal informadas?

– Quem paga as estradas, não de ferro, mas de ouro para os concessionários bem apadrinhados?

– Quem, os portos, onde se exigem taxas por serviços, que não prestam, e onde a passagem das mercadorias pelas docas e seus estabelecimentos sai às vezes tão caro ao lavrador, ou ao negociante, em contribuições para as empresas favorecidas, quanto seu transporte, através do oceano, a mercados remotos?

– Quem, a esterilidade madraçaria e ganância dos burocratas, os vexames do regímen das propinas entre os funcionários, o esbanjamento das ninhadas políticas nas secretarias de luxo, turba de secretários, adidos, encostados e vadios de todo o gênero, que esfervelham na côrte dos ministros como moscas?- Quem, essas ações de perdas e danos contra a fazenda, originárias de atentados constantes de governos arbitrários contra os direitos individuais e a fé dos contratos?

– Quem, a papelorréia, em que nos mergulham os santarrões do ódio às emissões bancárias lastreadas, inundando agora o Brasil com essas trombas de emissões desgarantidas, como recursos ordinários para as despesas do tesouro? Quem, todos esses desperdícios, todas essas rapinagens, todas essas loucuras, em que se desmandam as facções governantes, os presidentes, os sobrepresidentes, os sota-presidentes da República, os altos e baixos poderes do estado?

Não seriam, decerto, eles os que pagassem, os que por qualquer dessas coisas respondessem?

– Qual responder!?

– Qual pagar!?

Neste regímen são os bons os que pagam pelos maus, são os inocentes os que respondem pelos culpados, são as vítimas as que expiam os crimes dos verdugos. O ladrão rouba: o roubado indeniza. O poder extorsionário esbulha: extermina-se o esbulhado.

As malversações, os atentados, os opróbrios não inabilitam ninguém.

Os grandes homens do regímen são, às vezes, os a que todo mundo está vendo na cara os gilvazes de mil vergonhas. Quanto mais cadimo na imoralidade, mais graduado nas posições. (As Vítimas – Ruy Barbosa)

Deixe um comentário